Storyteller | Crítica

“Era uma vez” é como toda boa história começa… ou pelo menos, foi o que aprendemos desde criança. Eu imagino que os contos de fadas e as fábulas devem ter sido o pináculo do entretenimento há uns séculos, mas hoje em dia elas só estão encravadas no imaginário popular. Já conhecemos de cor os clichês sobre princesas, dragões, castelos, bruxas e cavaleiros ao ponto de não ser mais novidade nem pra gente, nem pra quem produz entretenimento. Se revisitar e subverter esses conceitos pode criar filmes excelentes de animação, Storyteller chega pra provar que interessantes e curiosos jogos de quebra-cabeça também podem surgir do clássico “felizes para sempre”.

A missão de um Storyteller

Sem muita enrolação, Storyteller apresenta a missão dos jogadores logo ao iniciar a primeira partida: você tem nas mãos um livro de contos de fadas que está incompleto. Para provar que você é um contador de histórias digno, você precisa atravessar cada capítulo, completando as histórias usando apenas o título delas como referência. Cada conto do livro é apresentado como um puzzle em formato de uma tirinha em quadrinhos vazia — você tem alguns personagens, algumas cenas (como “morte” ou “casamento”) e o desafio está em encontrar como esses pequenos elementos devem ser posicionados e em qual ordem.

Storyteller

Conforme os personagens vão passando por certas situações, eles vão adquirindo novas características, que são essenciais pra resolver o enigma do conto: um personagem que morreu agora é um fantasma e se tinha outro personagem apaixonado por ele, o seu coração está agora partido. Muitas vezes, o grande desafio é saber como acionar essas emoções nos personagens usando os cenários de cada fase. Saber bem dos clichês do gênero (como o mordomo ser sempre culpado) também é a resposta de alguns enigmas.

Enquanto as primeiras fases começam de forma bem simples, os últimos capítulos tem histórias com 8 quadros, com vários personagens e possibilidades de cenário. E, mesmo assim, o jogo está longe de ser um quebra-cabeça difícil. Muito da graça de Storyteller é experimentar com as diferentes combinações e formar histórias malucas e diferentes até encontrar aquela que resolve o título indicado (mesmo que não seja da forma mais tradicional possível) e isso ele faz muito bem. Se você, entretanto, esperava um puzzle que iria fritar seu cérebro por horas, não é bem isso que você vai encontrar. Conforme os capítulos passavam, ficava bem claro que o foco dos enigmas era dar aquele gostinho de “Eureka” em entender as interações dos personagens e seguir logo em frente.

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O potencial preso na torre da bruxa

Mesmo assim, se você achar o jogo base muito fácil, existe um pouquinho de desafio escondido em alguns lugares. Algumas histórias tem um “subtítulo”, que mostra uma regra extra que também deve ser contemplada além do título da trama. Não chega a aumentar muito a complexidade, mas é um convite a pensar um pouco mais fora da caixa e tentar chegar no mesmo resultado, mas de maneira diferente. E se você quiser ir bem mais além e testar os limites do sistema de Storyteller, os achievements do jogo são bem secretos e vão necessitar que você não só explore eles bastante, mas também descubra em quais fases cada um é possível de ser realizado. É mais desafio, mas provavelmente vai trazer mais frustração também.

E eu acho que essa falta de desafios mais complexos — junto com a duração curta do título — mostram só o quanto potencial esse formato de jogo tem e ainda não foi aproveitado. Mais personagens, mais contextos, mais histórias, mais níveis de dificuldade: Storyteller não é só um jogo muito interessante, mas um sistema de puzzles que pode ser infinitamente expandido. Acho que eu nunca terminei um jogo querendo tanto que tivesse mais e eu espero que um novo livro apareça em breve com mais histórias e quadrinhos para serem completados.

No fim das contas, Storyteller é como se fosse mesmo um conto de fadas moderno: aconchegante, nostálgico e subversivo com as expectativas que já temos do era-uma-vez. A duração curta e a baixa dificuldade dos puzzles pode tornar o pacote menos atraente fora de promoções, é verdade. Mas ele não deixa de ser um livro cheio de bonitas e experimentais fábulas, que tiraram um sorriso do meu rosto a cada nova interação que eu descobri entre os personagens. Mais um título de qualidade publicado pela Annapurna, que entra no hall de seus “puzzles para todos os públicos”, como Florence e Donut County (também muito interessantes).

Storyteller está disponível para PC na Steam e no Nintendo Switch.

*Uma cópia do jogo foi gentilmente cedida ao CosmoNerd pelos desenvolvedores para a produção deste texto.