Nessa altura do campeonato, falar de multiverso é algo tão complexo quanto debater futebol e política na mesa do bar. O novo tema preferido da cultura pop já parece desgastado com as inúmeras obras lançadas num curto espaço de tempo nas mais diversas mídias. Pior para o MCU, que baseia toda sua nova saga justamente em realidades e personagens alternativos. Curiosamente, Loki foi escolhida para apresentar todo o conceito para o público em sua primeira temporada. Inúmeras séries e filmes de qualidade duvidosa depois, o Deus da Trapaça está de volta para tentar consertar o estrago nas linhas temporais. Mas ainda existe possibilidade de consertar a própria Marvel?
Ouroboros, primeiro episódio da segunda temporada, começa justamente de onde paramos dois anos atrás. Após conhecer Aquele Que Permanece (Jonathan Majors) e lutar contra Sylvie (Sophia Di Martino), Loki (Tom Hiddleston) tenta fugir de uma versão da AVT aparentemente de outro universo. Respondendo um dos mistérios do ano anterior, descobrimos que o protagonista está na verdade num passado distante da AVT, e que agora está contaminado com um “deslize temporal”. Vagando sem controle por linhas temporais, ele procura por Mobius (Owen Wilson) para alertar sobre o perigo eminente. Julgando apenas esse início, o ritmo parece bem mais ágil do que na temporada anterior. E Loki sabe aproveitar o carisma dos personagens para disfarçar a fadiga temática aos olhos do espectador.
Michael Waldron parece mais consciente de que se prender aos moldes do MCU tira todo o charme da série, aderindo a um estilo aparentemente mais episódico e deixando de lado a sensação de um filme dividido em várias partes. Das últimas produções lançadas no Disney+, Loki conta com uma rara identidade própria. O ritmo mais ágil também torna os momentos de explicações de regras e conceitos complexos menos cansativos. O espectador pode aproveitar melhor a experiência sem pensar muito em consequências para o futuro.
Porém, nada é mais divertido no episódio do que a piada com o personagem Ouroboros (Ke Huy Quan). Não uma piada intencional é claro, mas por toda coincidência envolvendo o vencedor do Oscar por Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo agora estrelar outra produção sobre o multiverso. E também pela sacada espertinha do nome do personagem e o conceito por trás dele (já que Ouroboros é a serpente que devora a própria cauda, ciclos que se repetem etc.). Fato é que a química entre Ke Huy Quan com o elenco é instantânea e pode acrescentar bastante ao restante da temporada. Por falar em interações, Loki e Mobius ainda são o coração da série. Sigo com o pensamento de que uma série da dupla como policiais temporais seria bem mais interessante.
É preciso pontuar a questão envolvendo o ator Jonathan Majors. Outrora a principal ameaça da nova fase do MCU, ele agora encara acusações de agressão contra uma mulher com quem se relacionou e aguarda o julgamento ainda esse mês. A segunda temporada de Loki foi gravada antes de tudo isso e sua participação não foi cortada. Resta saber como a Marvel pretende lidar com os desdobramentos e o papel do vilão nas próximas produções.
Loki retorna no momento em que adaptações de quadrinhos já não atraem o público como antes. E até mesmo os serviços de streaming passam por uma mudança significativa, com proibição de compartilhamento de senhas e tudo mais. Se antes o personagem vendia qualquer produção com seu carisma, agora vai precisar usar todos seus poderes divinos para não ser derrotado pela bagunça de sua própria Casa das Ideias.