Entre tudo que pode ser aterrorizante para o ser humano, o escuro sempre surge como um dos cabeças da lista. Demônios, fantasmas, palhaços e monstros em geral habitam as histórias e o imaginário da humanidade. Mas sempre o escuro aparece como um abrigo e até mesmo a fonte desses males. Dormir com as luzes apagadas logo após assistir um filme de terror era um prato cheio para pesadelos e colchões molhados. Perdemos as contas de quantas vezes já nos pegamos pensando que tipo de criaturas residiam embaixo de nossas camas.
E claro que o cinema de terror iria se aproveitar ao máximo disso, aumentando cada vez mais as horas de sono perdidas por pobres pais ao redor do mundo. A nova tentativa do momento é Quando as Luzes se Apagam (Lights Out), que desde os primeiros trailers já mostrava que iria usar o quanto fosse possível desse medo ancestral. Infelizmente, colocar um monstro que se move pela escuridão e alguns jumpscares não garantem um filme de terror de qualidade. Por mais que a ideia principal seja ótima.
Quando em 2014 David F. Sandberg apresentou ao mundo seu curta Lights Out, os entusiastas do terror sentiram a chama da animação queimar. Em pouco mais de 2 minutos ele conseguiu criar uma situação aterrorizante e uma atmosfera claustrofóbica. Depois de prêmios de melhor diretor e melhor curta, a ideia era levar o trabalho ao próximo nível. Foi então que James Wan, o novo Messias do terror, entrou na jogada. Trazendo consigo o mar de dólares da franquia Invocação do Mal, ele assumiu o papel de produtor e garantiu o financiamento e distribuição da Warner Bros. e da New Line Cinema. David manteve o cargo de diretor.
O principal problema que surge na hora de transformar um curta de terror em longa metragem é esticar a história ou ter que criar uma. Em 2 minutos, ninguém vai se preocupar com perguntas como: o que é isso? de onde veio? quem é essa pessoa? O cenário muda quando você tem que preencher 80 minutos numa sala de cinema. Quando as Luzes se Apagam acaba caindo nessa armadilha. Por mais que tenha seus momentos, é difícil não taxar como algo descartável.
No início do filme vemos um pai (Billy Burke) conversando com seu filho (Martin, vivido por Gabriel Bateman) que diz está preocupado com a mãe (Sophie, interpretada por Maria Bello), alegando que ela não sai do quarto e que está falando sozinha. Claramente preocupado com a saúde mental de sua esposa, ele sai do trabalho para verificar a situação. Nos corredores mal iluminados da fábrica, acaba sendo atacado pela criatura que permeia todo o filme. Esse é ponto de partida para o desenrolar do que vamos ver na tela.
Esse é um dos clichês que compõem a fórmula básica do terror pipoca: a família destruída. O garoto com medo do escuro que está sobre os cuidados da mãe abalada e com claros problemas mentais. Ainda tem a pitada da filha rebelde (Rebecca, vivida por Teresa Palmer). Que também passou pelo mesmo trauma do irmão e decide ajudá-lo, mesmo não sendo um belo exemplo fraternal. Está servido o ensopado de terror genérico. Depois começam as investigações para descobrir porque aquela família foi sorteada no bolão do inferno.
Entre diálogos rasos e cenas descartáveis, a tal criatura aparece para animar o ambiente. E ela acaba sendo a melhor coisa do filme durante um bom tempo. A ideia de não dar um rosto logo no início para a entidade nos faz lembrar dos vultos que jurávamos ter visto passeando pela casa quando éramos crianças. Somado a um interessante jogo de luzes que causa uma certa agonia (será que esse celular vai conseguir protegê-lo?), temos os melhores momentos do longa. Pena que a maioria está presente nos materiais de divulgação, o que acaba tirando boa parte do impacto desejado.
Mas esses problemas não são exclusivos de Quando as Luzes se Apagam. Mama, filme também baseado em um curta e produzido por Guillermo Del Toro, foi uma bomba inacreditável. Parece ser uma clara mensagem que, talvez, o terror deva procurar outra fonte para explorar. Em tempo, é preciso salientar que existem muitos curtas de terror de qualidade por aí. Uma pesquisa rápida e você vai ter uma melhor experiência em alguns minutos do que as várias horas de filmes de terror desse ano não proporcionaram.
Ainda assim, a sequência de Quando as Luzes se Apagam é quase certa. Saímos do terror genérico e vamos entrar na sequência desnecessária. David F. Sandberg, agora protegido de James Wan, ganhou de presente a direção de Annabelle 2. Quer algo mais descartável do que isso? ¯\_(ツ)_/¯
Quando as Luzes se Apagam não dá medo. Mas parar pra pensar no que o futuro reserva para o gênero do terror é de arrepiar todos os pelos do corpo.