Quando Sifu foi anunciado, ele chamou a atenção por duas coisas. O mundo ficou empolgado com um jogo de kung fu complexo e visceral como era Absolver, o primeiro jogo on-line da sua produtora, Sloclap. Para os brasileiros, bem… o seu nome peculiar gerou muitas piadas de quinta série. Mas algo que não ficou claro no marketing de Sifu foi o quanto o jogo é brutalmente difícil, exigindo muito do seu jogador. Felizmente, aqueles que se dedicarem terão uma boa recompensa. Confira a crítica sem spoilers abaixo.
Introdução
Em Sifu, você controla um rapaz ou uma moça que teve seus pai e mestre mortos por um dos seus antigos alunos. Você então parte em uma jornada de vingança bastante clichê, mas com uma reviravolta. Seu personagem possui um cordão com medalhões que fazem você voltar da morte. Mas, toda vez que morre, você fica mais velho. O jogador parte então nessa busca por vingança em uma corrida contra o tempo e contra a morte.
Sifu pode frustrar bastante àqueles que chegarem sem saber muita coisa. A primeira grande surpresa é que o jogo tem elementos bem fortes de um roguelite, principalmente por causa da sua mecânica mais inovadora. Explicando: em Sifu, seu personagem inicia com 20 anos e, toda vez que morre, um contador de mortes é adicionado à sua idade em um tipo de progressão aritmética ou sequência de fibonacci. Quanto mais você morre, mais sua idade vai aumentando e, a cada 10 anos, você ganha mais dano, perde vida e também perde a oportunidade de comprar alguns upgrades muito úteis. Ao chegar aos 70 anos, a sua próxima morte significa que deu game over. O jogador então tem a opção de iniciar novamente uma das fases a partir da idade em que chegou nelas. Se você ficou um pouco confuso, essa é a sensação que terá ao jogar. Sifu traz uma mecânica inovadora, mas falha um pouco em explicar como exatamente ela funciona, deixando o jogador no escuro para experimentar e bater a cabeça até descobrir os melhores caminhos para avançar.
Tijolo não revida: O Combate de Sifu
Falando da jogabilidade básica do jogo, ele é um beat’em up onde seu personagem vai passar por fases espancando todos os inimigos usando as mãos ou armas que encontra no caminho. Mas, diferente de outros jogos desse estilo, Sifu tem uma dificuldade brutal e cada inimigo pode ser o seu carrasco com poucos golpes. O seu personagem possui combos de ataques fortes e fracos e também uma barra de especial para realizar ataques mais poderosos, como em um jogo de luta. Tanto você como os inimigos possuem uma barra de postura como em Sekiro. Se essa barra se encher, o seu personagem fica paralisado por um tempo e, quando isso acontece com inimigos, você pode fazer um golpe finalizador. Mas a complexidade e o diferencial de Sifu vem principalmente na forma como você evita golpes.
Toda vez que é atacado, você tem algumas opções. Pode bloquear o ataque segurando o botão de defesa, mas isso vai fazer com que sua barra de postura cresça; Também pode se esquivar para trás para sair do alcance do inimigo, mas também faz com que você fique mais longe para atacá-lo. As melhores opções são dar um parry defendendo no momento certo e aumentando a barra de postura do oponente ou esquivar do ataque sem se mover. Nessa segunda opção, você precisa segurar o botão de defesa e apertar para cima ou para baixo para fugir de ataques baixos ou altos. Perdi um bom tempo na explicação do combate pois acho o sistema bastante complexo, difícil mas recompensador.
O árduo e belo caminho da vingança em Sifu
Sabendo do básico, é importante você jogar Sifu entendendo que é um jogo extremamente difícil. Ele exige que você entenda muito bem as mecânicas complexas oferecidas para poder vencer as adversidades e sair vencedor. Os inimigos muitas vezes vão te circular e te encher de porrada sem esperar a vez de atacar. Essa dificuldade excessiva serve, porém, a um propósito muito importante. Sifu trata-se de dois temas principais: vingança e kung fu. Na minha visão, a alta dificuldade serve para mostrar o processo de treinamento em artes marciais, algo que vai levar tempo e exige muita dedicação e repetição. Sifu possui poucas fases, então é um jogo que vai te pedir para que repita as mesmas várias vezes para treinar, acumular experiência no jogo e na vida real, e também para explorar novos caminhos e segredos.
A segunda justificativa para a dificuldade excessiva é a própria história que Sifu quer contar. “Eu passei 8 longos anos treinando para isso” é a frase que o/a personagem fala quando mata o primeiro chefe. Com a sua dificuldade, o jogo quer passar que esse caminho de morte e vingança não é algo fácil e que não é qualquer um que pode completar esse objetivo. Você vai quebrar muito a cabeça, se frustrar e ter vontade de jogar o controle na parede. Mas, depois de praticar e repetir muito, você vai se sentir um próprio mestre do kung fu preparado para acabar com qualquer um que apareça na sua frente. A dose de adrenalina que vem depois de vencer um chefe ou um grupo grande de inimigos serve para te passar o sentimento de que você é um mestre fodão de artes marciais. Tal como em Sekiro, é uma experiência frustrante até que você domine completamente aquela mecânica e crie situações cinematográficas durante o gameplay.
Infelizmente, o jogo falha um pouco em te informar tudo o que possui e o que exige de você. Vai demorar algumas horas para você entender como funciona sua estrutura de fases e também o seu confuso sistema de upgrades. Sifu traz um sistema de game over e restart inovadores, mas falha um pouco em explicar isso para o jogador, deixando-o um pouco livre demais para se frustrar em vez de focar em tipos de jogabilidade que serão mais úteis em finalizar o jogo. Apesar disso, a exploração é um dos pontos fortes dele, te obrigando a procurar bem pelo cenário por segredos , além de oferecer caminhos alternativos para melhorar a rejogabilidade ou te jogar direto para os chefes.
Enquanto a jogabilidade de Sifu é devastadora, a sua apresentação é um deleite aos olhos e ouvidos. O jogo possui uma excelente direção de arte com suas poucas, mas variadas, fases. Cada novo cenário é bem criativo e foge bastante dos clichês esperados. O estilo cartoon dos personagens traz uma leveza para a narrativa e funcionam muito bem com os movimentos perfeitos de kung fu feitos através de captura de movimentos. A trilha sonora também faz um ótimo trabalho de estabelecer o clima das fases e da porradaria, escolhendo até muito bem momentos para desaparecer e deixar só o som da peia. Sinto falta de uns efeitos mais impactantes nos golpes para sentir melhor os impactos, mas isso não chega a ser problema.
Conclusão
Sifu é um difícil e recompensador jogo, que traz para o jogador uma imersiva jornada de vingança e conhecimento. Ele vai frustrar muitos novos jogadores, mas vai oferecer muita diversão e horas de jogo para aqueles que derem mais uma chance para aprender seus complexos e confusos sistemas de combate e upgrades. Como uma rosa, Sifu é um deleite para os olhos, mas também pode machucar (eu estou nesse momento literalmente com meu dedo doendo de tanto tentar defender golpes). Seu combate poderia ser um pouco mais polido e dar mais informações para o jogador trabalhar, por isso ele exige tanta dedicação. Você vai iniciar apanhando até chorar, mas vai terminar se sentindo um verdadeiro mestre do Kung Fu.