Casos chocantes estão aos montes nos streamings para alimentar o público fascinado por crimes reais, ou categoricamente falando o true crime, e O Caso Asunta é daqueles que tende a despertar muitos sentimentos antagônicos quando nos debruçamos no modo como as coisas se desenrolaram. Se por um lado não conseguimos conceber a ideia de que os pais possam ter participação ativa por isso criminosa na morte da própria filha, como deixar de lado tantas evidências que indicam o contrário, ou, para dizer o mínimo, que eles a criavam de um modo negligente? E pior: acreditando nessas evidências, como condenar alguém sem a prova incontestável do crime? A série dramatizada e exclusiva da Netflix, criada por Ramón Campos, tenta (entre erros e acertos) adaptar para as telas o controverso caso.
Do que se trata O Caso Asunta?
Em 21 de setembro de 2013, Rosario Porto e Alfonso Basterra dão queixa do desaparecimento da filha, Asunta, cujo corpo é encontrado horas depois perto de uma estrada em Santiago de Compostela. A investigação policial logo aponta Rosario e Alfonso como possíveis autores do crime, uma notícia que abala a cidade e o país. O que levaria os pais a acabar com a vida da própria filha? O que se esconde por trás dessa família perfeita?
Além da escolha, é elogiável a atuação da atriz Candela Peña na pele de Rosario Porto, a mãe de Asunta. Se você comparar a da série com a do mundo real, chega a ser assustadora a semelhança. Para além dela, praticamente todo o elenco manda muito bem em seus respectivos papéis, como é o caso de Tristán Ulloa como Alfonso Basterra e Javier Gutiérrez como o tendencioso juiz Malvar.
Tendencioso é um definição que considero justa para muitos aspectos desta produção. Não assisti ao documentário de 2017 que dá conta do caso, mas a julgar pelo conteúdo apresentado na série, o espectador fica facilmente propício a colocar os pais da menina como autores de crime. De um modo ou de outro.
Digo isso pois a própria série se preocupa, em dado momento, em apresentar duas possibilidades dramatizadas sobre o que poderia ter acontecido no caso. Algo parecido com o que vemos na minissérie A Escada, lançada em 2022 com a presença de Colin Firth e Toni Collette no elenco (disponível na Max) e que apresenta, numa espécie de “Você Decide”, três possibilidades do que poderia ter ocorrido no caso também sem solução. Então, não temos evidências ou sequer pistas de que um outro autor possa ter cometido o crime.
Ainda que não se justifique, fica um tanto compreensível a motivação da acusação em colocar os pais como principais suspeitos devido à falta de solidez nas versões que a defesa apresenta para lidar com o caso na justiça: mudança de advogados, ocultação de evidências, mudança de depoimento e comportamento fora do comum são algumas das coisas que pesam contra o casal, que, no final das contas, são culpados por, no mínimo, serem pais negligentes, ainda que isso não implique necessariamente em detenção.
No que cabe à produção, fica um tanto arrastada a ênfase dada ao cotidiano ao juiz Malvar, algo que acaba soando como desnecessário para a trama como um todo. O mesmo podemos dizer sobre a agente Cruces (María León), que possui uma certa ligação com o caso por estar tentando engravidar, numa vertente pouco explorada pelo roteiro e que fica, portanto, como um preenchimento de espaço vazio no texto da série.
Afinal, vale à pena assistir a uma série sobre um caso sem solução?
No final das contas, O Caso Asunta acaba se valendo por boas atuações e para o espectador tomar conta de um escandaloso true crime ocorrido na Espanha, além de despertar alguma reflexão a respeito de como o fato das leis e procedimentos existirem não garantem que um caso será de fato investigado com isenção.