Discrepância de qualidade entre filmes de um mesmo diretor é mais natural do que parece
Michel Gondry declarou recentemente em entrevista ao THR ter atingido “o pior momento da carreira” em 2011 com O Besouro Verde. Para os bem aventurados que não se recordam – e peço desculpas adiantadas por resgatar essa memória – o referido filme é aquele péssimo remake do clássico de 1940 protagonizado por Seth Rogen, tendo como vilão Christoph Waltz sem lembrar em nada seu excelente papel em Bastardos Inglórios. Cameron Diaz completa a trinca notória do elenco.
Esse cara se desculpando é o mesmo diretor do excelente Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças (2004), sim, aquele filme que citamos contra o argumento de que “Jim Carrey só serve para comédias” (posso citar mais uns quatro caso ainda pense assim). A respeito de relacionamentos, esse pode entrar facilmente no seu top 5 (Junto com Alta Fidelidade e a trilogia do “Antes”). Kate Winslet (Titanic) também possui papel elogiável no filme.
Logicamente, esse é um “mal” sofrido por praticamente todos os bem-sucedidos em qualquer ramificação artística. Ainda no celebrado mundinho dos diretores, exemplos não faltam: o regular Woody Allen (que aos 80 anos consegue lançar um filme por ano) vez ou outra tem uma obra questionada, como em Scoop – O Grande Furo (Scarlett Johansson interagindo com um Ian McShane fantasma). E quem aguenta assistir À Prova de Morte, do aclamado Quentin Tarantino? Precisa ser fã de carteirinha. E tente não dormir assistindo A Invenção de Hugo Cabret (Martin Scorsese).
Mas não são exemplos justos. O mais correto seria comparar a situação de Gondry com casos onde um bom diretor realmente enfiou o pé na jaca, mas foi forçado a isso. David Lynch (Veludo Azul) também já foi atrapalhado pelos produtores em Duna, e o resultado foi aquém. Recentemente, o promissor Josh Trank (Poder Sem Limites) sofreu da mesma interferência e entregou um dos piores filmes de super-heróis com Quarteto Fantástico. Há também o caso de diretores de animações tentando se aventurar com atores reais, mas acabaram fracassando, como é o caso de Brad Bird (Os Incríveis) com Tomorrowland e Andrew Stanton (Procurando Nemo, Dory, Wall-E) com John Carter.
É algo que não pensamos a respeito, mas relevante. Dirigir um filme envolve – e muito – gestão de pessoas, incluindo as que irão fornecer o dinheiro do orçamento. Não significa, porém, que o diretor deva sucumbir às canetadas de quem visa majoritariamente o lado financeiro (ao mesmo tempo que ninguém possui a fórmula exata de como proceder nessas situações). Se para cada Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças o preço for uns dois filmes como O Besouro Verde, parece um preço justo a se pagar.