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Meu Amigo Dahmer

Jeffrey Lionel Dahmer, nascido em 1960, e conhecido como “o canibal americano”, por ter matado 17 pessoas entre 1978 a 1991 e, obviamente, em uma vibe até mais psicótica do que Hannibal, comia pedaços de suas vítimas – todas homens e garotos (por volta dos 14 anos). Apesar de ter matérias suas facilmente encontradas, eu nunca tinha ouvido falar dele até a Darkside Books lançar Meu Amigo Dahmer, graphic novel que um “ex-amigo” fez baseando-se na época em que se conheceram durante a adolescência. Me lembrou um pouco o filme Coringa, com Joaquim Phoenix.

Sinopse: Anos antes de ficar conhecido mundialmente como um assassino em série, Jeffrey Dahmer foi um adolescente tímido e solitário. Lidando com problemas familiares, interesses no mínimo peculiares e a pressão do ensino médio e da adolescência, o jovem Dahmer gradualmente se transforma no homem que viria a aterrorizar os EUA.

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A vida de Dahmer

Derf Backderf (o autor) começa a história contando sobre como Dahmer era invisível. Não totalmente, claro, pois temos aqui o clássico clichê do rapaz esquisito sendo perturbado e constantemente humilhado pelos “populares” bonitões. Em uma narrativa sensível, o autor não foca em mostrar que ele era perverso e completamente perturbado. Na verdade, Dahmer era solitário, e começou a ter um certo interesse em cadáveres de animais em decomposição durante um tempo – mergulhando-0s em ácido diluído. E não, ele não matava as criaturas, só as encontrava mortas e resolvia descobrir o que havia por debaixo de tudo aquilo, o que pode ser lido como curiosidade natural – e provavelmente, ninguém imaginava que aquilo se tornaria algo a mais.

Por ser uma cidade pequena, Derf alega ter ouvido diversos boatos sobre a família do colega, como sua mãe ter problemas mentais e ser completamente instável, por exemplo, o que se provou verdade – tendo ela sido internada algumas vezes e tentado suicídio. As brigas entre os pais de Dahmer eram constantes, e deviam afetar tanto ele quanto seu irmão mais novo, David – que não é citado na história, pois o autor não o conhecia, então não faz parte da história que ele teve com o assassino.

É explicitado o seu comportamento estranho, em que, de uma hora para outra, o jovem busca atenção imitando, supostamente, o decorador de sua mãe – que teria paralisia cerebral, mas descobriu-se que sua mãe tinha convulsões frequentes, e parte dessa imitação vinha desse conhecimento atípico. Derf deixa claro em Meu Amigo Dahmer como deve ter sido para o rapaz, com sua personalidade introspectiva e solitária, viver em completo abandono parental, e, por estarem nos anos de 1970,  em uma época em que os professores simplesmente não se importavam o suficiente para buscarem ajuda a um aluno que, repentinamente, começou a aparecer completamente embriagado nas aulas. Isso quando aparecia.

Em determinado ponto da sua adolescência, Dahmer se descobriu gay, mas guardou para si a informação – obviamente com medo das represálias que era, e são, ruins até hoje para pessoas não heterossexuais. A bebida passou a servir de válvula de escape: ele só queria se desligar do mundo. No grupo do autor, ele encontrou por algum tempo pessoas que davam atenção às suas loucuras, mas sempre o baniam de encontros que poderiam ser realmente benéficos para ele – e isso o autor ressalta, com uma sinceridade bem pontual. Seu primeiro assassinato foi feito de forma passional, impulsiva, e pela primeira vez ele pôde descarregar todos os seus desejos insanos. Mas só voltou a fazê-lo novamente 9 anos depois, quando vieram as outras vítimas.

Para alguém que tinha uma vida negligenciada, solitária, cheia de medos, Dahmer transformou o seu desejo sexual em algo que consideramos doentio, matando suas vítimas, abusando sexualmente delas após o ato e depois comendo, para que ficassem para sempre unidas. Como diz o próprio autor, ele até sente pena, mas não podemos descartar que, após o primeiro assassinato, o criminoso não tenha merecido o que lhe aconteceu.

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Os crimes

Além do crime mais leve, que foi ser detido alcoolizado, Dahmer chegou a abusar de crianças – vivas. Depois, ele criou seu “modus operandi“, muito comum em psicopatas. Ele seduzia homens em boates ou saunas para o público LGBT, e quando a pessoa estava em sua casa, ele a drogava e estrangulava até a morte, para depois utilizá-la como uma espécie de brinquedo sexual. Seu fetiche estava no controle total que tinha sobre a vítima, que não podia reagir por estar morta. Praticava atos horrendos, e depois guardava o corpo para mais tarde, sempre voltando a cometer os mesmos atos, até que o estado daquele ser se tornasse inviável para a continuação de suas perversões. Dahmer então dissecava o corpo, o que lhe dava tanto prazer, que alegava ter relações com estes. E se você acha que foi pouco, depois disso tudo, começava a separação do que iria se tornar as suas refeições, tendo prazer tanto oral quanto sexual enquanto devorava suas partes, imaginando suas vítimas tendo uma vida prolongada dentro dele. Como é comum com serial killers, Dahmer guardava seus troféus: o crânio das vítimas, pintadas de cinza, para parecer que era um reles estudante de medicina. E fotos.

Tudo o que ele sabia sobre preservar partes, havia aprendido com seu pai, que era químico e, como uma maneira de se aproximar do filho, resolveu ensiná-lo algumas técnicas, que foram importantes durante os seus crimes. Falando em seu pai, ao descobrir sobre o alcoolismo do filho, este o fez se alistar nas forças armadas (se hoje em dia existe um tabu enorme relacionado a profissionais de saúde mental, imagina naquela época), onde Dahmer teria estudado para ser especialista médico e foi acusado de drogar e estuprar colegas, sendo expulso do Exército.

Ele foi descoberto e denunciado após ter ocorrido uma segunda fuga de vítima, que foi encontrada por policiais e estes suspeitaram que algo estava errado. Algum tempo antes, uma das pessoas capturadas por Dahmer havia conseguido escapar, mas acabou dando tudo errado, pois o serial killer afirmou que este era seu namorado e os policiais, extremamente homofóbicos, não queriam se envolver em uma briga homossexual. Porém, na segunda vez, ao encontrarem um outro rapaz algemado repetindo a mesma história daquele primeiro homem, resolveram investigar.

Infelizmente para Dahmer, seus atos vis o entregaram. O corredor de sua casa estava repleta de fotos de suas vítimas mortas mostrando as tripas espalhadas, e na cozinha havia o torso de algum pobre coitado que não conseguira a sorte de fugir. Quanto mais os policiais adentravam na casa de Dahmer, mais o horror se instaurava. Cabeças sendo preservadas no congelador, e vários tonéis com restos mortais. Curiosamente, a maioria das vítimas era negra. Se conseguir traçar um paralelo disso com uma realidade cruel que acontece até os dias atuais, você está no caminho certo.

Ele não só afirmou ter cometido os crimes, como deu detalhes à polícia, à imprensa e a quem mais perguntasse, alegando sentir alívio ao poder compartilhar essas informações. Seu advogado tentou fazer com que ele fosse declarado insano, mas Dahmer, demonstrando sua frieza e calculismo, até mesmo na hora de revelar seus crimes, foi condenado a 957 anos de prisão.

A Graphic Novel

Aqui a Darkside fez um trabalho excelente na impressão de Meu Amigo Dahmer, e o autor faz questão de mostrar um lado desconhecido do frio e sanguinário serial killer: a do rapaz solitário, desesperado por atenção, que pretendia apenas se desligar do mundo e ignorar seus impulsos “errados homossexuais”. Teoricamente, seria alguém que não aguenta mais e cometeria atos passionais de assassinato, certo? Já que seu passado é triste e há uma ideia distorcida na sociedade de que tá tudo bem a pessoa cometer crimes se o seu passado por trágico.

Mas não Dahmer. Derf mostra esse lado humano, e prefere reforçar que ele não é um monstro. Talvez, se alguém tivesse interferido, ele não tivesse virado um serial killer e essa é uma questão na Graphic que é levantada e não possui uma resposta. É a mesma que é levantada em Coringa, por exemplo. SE a sociedade não tivesse sido tão cruel com eles, será que não teriam se tornado o que são? O que leva uma pessoa a se tornar boa ou má? O que levou Dahmer a tornar-se um frio serial killer? A negligência paterna e materna ou ambos? O bullying escolar? Sua falta de bons exemplos? Ou simplesmente o caráter dele, a sua personalidade, já era doentia a esse ponto e só necessitava ser polida?

Respostas que nunca teremos. Dahmer foi assassinado na prisão, por outro detento. Morreu com a cabeça esmagada, o que, considerando seus crimes hediondos, por muita gente foi considerado quase uma reparação histórica.

A história traz detalhes ricos, que o autor não só lembrava de sua vida, como pegou o depoimento de diversas pessoas que também tiveram contato com o serial killer, inserindo pedaços que jamais nos seriam concedidos pelo próprio Dahmer, que preferia repetir e confessar a sua vitoriosa história sanguinolenta.

Sabemos que os anos de 1970 fora bizarros, e a sociedade não possuia muitas amarradas, os jovens pareciam perdidos e Dahmer era apenas um deles. E em Meu Amigo Dahmer, vemos não somente a história do psicopata, mas de uma sociedade negligente e que, de fato, não dá a mínima.