Nascida da exposição Fantástico Brasileiro “O Insólito Literário do Romantismo à Contemporaneidade”, obra da Arte & Letra escrita por Bruno Anselmi Matangrano e Enéias Tavares contempla a fantasia na literatura nacional – enquanto propõe um novo movimento literário
Poucas vezes paramos para pensar sobre a literatura brasileira com o viés proposto por Enéias Tavares e Bruno Anselmi Matangrano em Fantástico Brasileiro: O Insólito Literário do Romantismo ao Fantasismo. Nessa obra, nascida a partir de uma exposição de mesmo título no sul do país, os autores fazem um recorte de muitos estudos concentrados em aproximadamente duzentos anos da história do Brasil, a fim de resgatar nomes e obras importantes para a construção de uma identidade nacional acerca da fantasia.
Estruturalmente o livro é bem organizado, de modo que a leitura ocorre com fluidez. Enéias e Bruno não se limitam apenas à ordem cronológica dos fatos, lançando mão de uma divisão interessante a partir de temas, que, ou são ramificações do insólito ou demandam uma atenção muito especial.
Essas ramificações são nada menos que os diversos gêneros literários, como a ficção científica, alta fantasia, fantasia urbana, horror, steampunk etc. Já as outras preocupações dignas de capítulo são questões como faixa etária, folclore e diversidade. Cada um desses capítulos vêm com indicações de autores e autoras que contribuíram para a construção do fantástico brasileiro de algum modo.
Há os consagrados, que tiveram o devido reconhecimento histórico tanto em sua época quanto posteriormente, como Machado de Assis. Outros tiveram anos de glória, mas hoje são contestados por posturas que agridem a existência de indivíduos apenas por conta da sua cor de pele, que é Monteiro Lobato (algo contextualizado no livro). Ainda há aqueles que tinham boas vendas mas acabaram completamente esquecidos pela história… a lista não para!
Uma grande desvantagem em ler Fantástico Brasileiro é a sua consequência na lista de leitura das pessoas. Aos que estão de coração aberto para o insólito, ou fantasismo, há uma gama muito grande de autores e livros a serem cobiçados após o término deste. Brincadeiras à parte, é prudente avisar que a sua vontade de ler, e conhecer mais da história literária brasileira ao mesmo tempo, será potencializada.
Outra motivação para chegar até o final é conferir a proposta dos autores em tratar do fantasismo como um movimento literário. Isso pode soar óbvio a princípio, mas Bruno e Enéias relembram que elementos fantásticos eram inseridos antigamente com grande preocupação pelos autores, temendo terem as vendas afetadas por serem acusados de usar fantasia em suas histórias, pois isso era visto com maus olhos. Bruno e Enéias lembram, inclusive, que muitos justificavam essas inserções afirmando se tratar de literatura alegórica (e outras variações) a sua obra. É isso mesmo: a fantasia era vista com preconceito. E será que ainda é?
Mesmo que ainda exista alguma rejeição, seja de editoras ou de outros autores, é fato que esforços isolados de alguns grupos a fim de promover o insólito, seja em eventos, divulgações pela internet ou mesmo buscando novas formas de publicação, fizeram muita diferença para ajudar a estabelecer essa vertente literária no Brasil. Nesse sentido, ter um movimento literário como o fantasismo só beneficiaria o mercado, desde as editoras, autores e leitores.
A edição da Arte & Letra é igualmente elogiável. Nomes como Flavio García e Roberto Sousa Causo cuidam do pré e posfácio. O material de capa dura com a cor azul traz uma linda ilustração de Karl Felippe, que também criou outras vinte e quatro (homenageando um grande autor em cada capítulo, confira algumas delas na galeria acima), tornando assim o Fantástico Brasileiro uma experiência única também no visual.