Quando um filme passa por vários percalços até o seu lançamento, podemos esperar que o resultado final não seja dos melhores. A Mulher na Janela é um desses tristes exemplos. Programado para chegar aos cinemas em 2019, o longa passou por refilmagens, até que saiu das mãos da Fox e foi comprado pela Netflix. O que temos aqui é algo que mira no clássico atemporal Janela Indiscreta de Alfred Hitchcock, mas acerta em obras como Paranoia e A Garota no Trem. Um desperdício de história e, principalmente, de elenco.
Baseado no livro escrito pelo polêmico A.J. Finn, o longa acompanha Anna Fox (Amy Adams), uma mulher que sofre de agorafobia. Para preencher seus dias, ela assiste filmes, bebe vinho, toma remédios, faz consultas com seu psicólogo e espiona a vida dos vizinhos. Quando uma nova família se muda para o prédio da frente, ela nem pode imaginar que sua vida irá virar de cabeça para baixo. A Mulher na Janela promete, durante toda sua duração, entregar um suspense aflitivo. No entanto, se mostra como uma enorme colcha de retalhos narrativos sem nenhum propósito. Nem mesmo o nada inédito artifício da narradora não-confiável é bem utilizado.
O roteiro escrito pelo talentoso Tracy Letts e pelo próprio A.J. Finn não dá abertura para que o espectador possa criar suas teorias. Constantemente somos lembrados de seus problemas com álcool e remédios, geralmente repetindo passagens em que a protagonista acorda atordoada e deslocada da realidade. Já que todos os personagens em cena questionam a sanidade de Anna, e o texto não faz questão de ser sutil, o mistério acaba perdendo impacto. Sem uma conexão emocional com a protagonista, nos resta apenas assistir o desfecho da história.
O diretor Joe Wright (Orgulho e Preconceito) até consegue entregar alguns bons momentos de tensão. Seu jogo de câmeras sempre acompanha Anna, investindo geralmente em close-up para aproveitar as expressões confusas e assustadas dela. Junto da fotografia de Bruno Delbonnel, que trabalha principalmente com tons de azul para salientar a depressão da protagonista, Joe consegue transformar o enorme apartamento em uma prisão claustrofóbica. Infelizmente, A Mulher na Janela vive apenas desses pequenos lapsos de qualidade.
O elenco é recheado de nomes de qualidade, mas que não possuem material suficiente para entregar um trabalho decente. Gary Oldman, Julianne Moore, Jennifer Jason Leigh e Wyatt Russell são alguns dos que transitam pela trama sem um propósito definido. Seus arcos narrativos são rasos e servem apenas para estabelecer um tipo de conexão absurda com a protagonista. Amy Adams é quem mais se esforça. Vinda de outro fracasso recente, a talentosa atriz constrói com eficiência a fragilidade mental e emocional da personagem. É angustiante ver seu esforço para parecer sã em momentos chave. Mas isso não é o suficiente para salvar o roteiro fraco.
As revelações óbvias e reviravoltas sem nenhum impacto fazem de A Mulher na Janela um projeto falho de suspense psicológico. Os últimos 20 minutos parecem completamente deslocados de todo o resto, talvez como uma tentativa de entregar algum tipo de emoção ao espectador. Não posso julgar o valor de adaptação, já que nunca li o livro original. Mas a decepção é a única recompensa no final, especialmente por todo o potencial desperdiçado.