Produção de Steven Soderbergh para a Netflix traz bom elenco e elegante crítica ao capitalismo financeiro
A política internacional ganha espaço no catálogo da Netflix com A Lavanderia, drama estrelado por Maryl Streep que conta com a direção de Steven Soderbergh (Onze Homens e Um Segredo, Contágio).
Na trama, Ellen é uma viúva em dificuldades financeiras após uma tragédia. Para piorar a situação, ela não consegue receber o dinheiro que lhe é devido pelo ocorrido. Enquanto isso, Ramón Fonseca (Antonio Banderas) e Jürgen Mossack (Gary Oldman) comandam um escritório de advocacia sediado na Cidade do Panamá, de onde gerenciam dezenas de empresas. Eles participam de todo tipo de fraude, sempre dispostos a faturar mais.
Maryl Streep se beneficia da estrutura narrativa, ao mesmo tempo que empresta todo seu carisma para a tela. Na pele da viúva, ela encabeça a representação da população menos abonada e, mesmo não sendo de classe baixa, sofre com esse labirinto criado pelo capitalismo financeiro a partir de uma fraqueza do gerente de uma empresa de passeios de barco (vivido por David Schwimmer, o Ross da série Friends), que apenas tentou economizar dinheiro ao contratar uma empresa de seguros que se mostrou fraudulenta.
Os personagens de A Lavanderia, incluindo a protagonista, funcionam majoritariamente para provar o ponto de vista do diretor, portanto, não espere por nenhuma jornada inspiradora na sua sessão. Esse é o motivo de acompanharmos a trajetória deles apenas até certo ponto, onde o roteiro fornece o básico para que o espectador se interesse pelas figuras retratadas. Tenha isso em mente caso deseje saber mais sobre determinado personagem – assim como eu fiquei.
O elenco do filme está recheado de figuras conhecidas. Além dos já citados anteriormente, temos Gary Oldman e Antonio Banderas como narradores principais dos acontecimentos, que também são dois personagens inseridos na narrativa – e picaretas que representam a crítica-alvo da história. Eles são muleta para entendermos como a financeirização do mercado, potencializada com as vantagens de um paraíso fiscal, podem desvirtuar qualquer boa intenção de investimento empresarial. Isso culmina, após um incompreensível caminho financeiro, num cenário que negligencia recursos devidos por direito à população que fica na base da pirâmide social.
Tirando a interessante temática, chama atenção também a fotografia do filme comandada pelo diretor, onde o bom elenco é usado para planos mais longos com mudanças repentinas de cenários, que auxiliam no didatismo da temática, de potencial enfadonho ou complicado para quem não se interessa pelo mercado financeiro. Nesse sentido, A Lavanderia vai agradar aos fãs de cinema mais ligados na parte técnica.
Porém, não há recurso estético que salve um roteiro ruim num filme desse grau de sofisticação. O roteiro de Scott Z. Burns consegue entreter o espectador mais distraído, ao passo que também contextualiza de forma competente o maior vazamento de dados da história, conhecido como Panama Papers. Para quem não conhece o caso, recomendo atenção redobrada nas informações do filme. Há inclusive menção a uma certa empresa brasileira do ramo da construção civil.
A Lavanderia é um filme de grande esmero em sua produção, e uma diversificação interessante no conteúdo original da Netflix. No entanto, essa produção pode acabar irritando aquele que pensa ser possível parar de trabalhar ainda novo e viver de rendas bancárias até morrer.