Todo mundo sabe quem é Napoleão Bonaparte. E se não sabe, já ouviu esse nome em algum lugar. O conhecido imperador da França agora foi “prestigiado” pelo diretor Ridley Scott, que mais uma vez chutou na trave, passando longe de ser uma boa cinebiografia, sendo mais como uma aula de história de professor preguiçoso e formado em outra área. Com a sua estreia, já foram apontadas diversas incoerências em comparação com os fatos históricos, o que indicaria mais um ficção fantasiosa sobre o homem do que sua trajetória de vida real.
O filme percorre as seis batalhas mais importantes de Napoleão Bonaparte (Joaquin Phoenix), iniciando com o Cerco de Toulon. Apesar do personagem ser retratado como ambicioso e estrategista, a realidade é que ambas questões ficam mais na beirada da caricatura, com uma narrativa que, involuntariamente, nos faz rir em diversas cenas. Com o fim da monarquia, Bonaparte tem um prato cheio para crescer do jeito que sempre sonhou, porém, a trama não embarca nesses detalhes, ficando apenas na superfície, sem gerar uma costura entre uma cena e outra, cortando abruptamente um momento de destaque para já iniciar outro, sem nos entregar contextos. Um exemplo disso é o seu período como cônsul, que foi repartido entre ele e mais dois homens – que são apenas mencionados antes da história partir para a decisão de tornar Napoleão imperador. Não há uma aclamação da população, dos seus pares governamentais, apenas a fala de um personagem que faz um papel essencial de diplomata, e que evoca a ideia de que Napoleão Bonaparte já deveria ter subido ao patamar de rei (e ele se torna imperador).
Segundo alguns historiadores, ele o teria feito convencendo a todos (população + aliados) que não estaria trazendo novamente a monarquia, seria um papel diferente o que prestaria, e assim conseguido dominar o país – além de prosseguir com a sua expansão. Algo que é ignorado ao longo do filme, excluindo a parte que deveria mostrar o seu carisma e os seus trejeitos políticos para fazer com que, por exemplo, tivesse o apoio de tanta gente, além de ter a fidelidade cega do exército, que conseguia inspirar mesmo sem pisar no campo de batalha. Não o vemos como líder político, não há uma exploração sobre as importantes mudanças socioeconômicas ocorridas – passando muito ligeiramente pelo assunto -, concentrando-se muito mais em passear por tópicos da história dele relacionados às batalhas que trouxeram o seu destaque como líder em ascensão.
Claro, sou totalmente a favor de empregarem uma visão menos romantizada de Napoleão Bonaparte, em que ele é mostrado constantemente como um homem pequeno (sentidos figurado e literal), inseguro, cuja paixão arrebatadora por Josefina (Vanessa Kirby) guia muito dos seus pensamentos. Do meu lado, achei o relacionamento particularmente insosso, sem química entre eles, e com uma trajetória confusa, que começa de forma extremamente abusiva e tóxica dos dois lados e finaliza como um amor eterno, uma devoção inquebrável e inabalável um pelo outro, mas sem um emprego satisfatório da elaboração dessa relação, que assim como o resto, é feita de recortes não completos da vida dos dois. Ah, e a trama é narrada, em boa parte, pelas cartas trocadas entre os dois. De certa forma, o filme poderia ter mudado seu título para “Cartas à Josefina”.
Infelizmente, apesar das batalhas bem construídas, feitas com o brilhantismo conhecido do seu diretor, que brinca com as câmeras e procura nos envolver na crueldade das guerras, o feito torna-se repetitivo, e até mesmo Bonaparte parece estar entediado depois de um tempo. E, ao invés de parecer parte da sua arrogância, só parece algo que ficou jogado de forma aquém nas telas. Claro que a aposta em Joaquin Phoenix como Napoleão foi acertada, mesmo com um roteiro que não parece favorecer em nada, o homem tira o melhor que pode, nos entregando uma figura histórica que nos entretém durante um tempo, e o carisma vem totalmente do ator, mas não do personagem que ele tenta retratar. Vanessa Kirby está excelente no papel de Josefina, e gostaria de ter visto mais dela em tela do que somente uma figura que me pareceu mais subjugada do que poderosa.
E ao que tudo indica, as 2h38m de filme são apenas uma amostra do que realmente está por vir no Apple TV+, que vai contar com uma versão estendida – o que poderia explicar porque a versão cinematográfica parece ser uma colagem de recortes meio desencontrados e sem contexto, embora não justifique. Depois de um tempo assistindo, entrei numa espécie de tédio, sem encontrar algo que me empolgasse ao longo da narrativa, então dificilmente terei interesse em retomá-la quando chegar ao streaming.
Napoleão não é ruim, apesar de todos os defeitos apontados, ele é bem okay. Existem cenas bem inspiradas, principalmente durante uma invasão específica à Rússia, que enche os olhos e empolga, assim como uma boa fotografia – apesar das cores esquisitas -, com planos longos, abertos, sem poupar detalhes quando necessário, ainda mais se tratando da violência gráfica que vem com a guerra. Mas não sei se vale a pena uma ida ao cinema só para isso. Cabe a você, queride leitore, decidir.