Foi só a conclusão da oitava temporada de Dexter em 2013 terminar de ser transmitida na televisão que o público já correu para a internet para reclamar e lamentar do que iria se tornar um dos desfechos mais rejeitados que uma série já teve. Na época, a Showtime viu o seu produto de maior sucesso ser despedaçada pela crítica e por anos o amargo assunto rendeu em entrevistas e em comentários de fãs em todo lugar possível. Para piorar, não era apenas o episódio final que desandou. A condução do serial killer repleto de regras para não ser capturado para um caminho de redenção e rejeitando seu “Passageiro Sombrio” para viver uma vida normal soou forçado, irreal e desinteressante. Mesmo com a cobrança constante, foram necessários 8 anos para tirarem a série do meio do nada e prometerem um novo rumo ao anti-herói. Em 2021, O showrunner original da série, Clyde Phillips, anunciou a estreia de Dexter: New Blood, que serviria de continuação para a série Dexter, mas com uma proposta tão diferente que nem a abertura clássica das 8 temporadas tem neste revival. Ou seja, nem será a nona temporada. É algo complementar. A expectativa gerada nos fãs foi semelhante a quando Dexter saía para caçar um criminoso que escapou da justiça.
Dexter Morgan (Michael C. Hall) agora é Jim Lindsay e vive em Iron Lake, uma pequena cidade afastada de qualquer um que possa descobrir seus segredos. Entretanto, Dexter resolve namorar simplesmente a chefe de polícia Angela Bishop (Julia Jones). Conseguindo ficar 10 anos sem cometer nenhum assassinato, Dexter acaba entrando em situações complicadas que irão acabar com o sossego. Enquanto um novo vilão começa a ser investigado por ele, Dexter também precisa lidar com traumas do passado e lidar com a chegada do seu filho, Harrisson Morgan (Jack Alcott).
A mudança radical na qualidade visual de Dexter: New Blood (disponível no Brasil pelo serviço Paramount+) é sentida logo nos primeiros minutos. Embora seja fácil sentir estranhamento nas primeiras cenas e pensar “isso não é Dexter”, aos poucos vai se aceitando a nova ideia e se desprendendo da nostalgia que os cenários da colorida e turbulenta Miami poderiam causar. Os benefícios dos avanços tecnológicos e de um bom investimento para a produção desta temporada são perceptíveis. As cenas de violência estão mais caprichadas e se distanciaram muito de qualquer recurso brega que antes existia. De repente, a nova montagem dos episódios passa a agradar bastante. O tom mais sério no roteiro, mas sem abandonar o humor ácido característico da série, atrelado a bons trabalhos de fotografia e direção, tentam fechar a história de maneira digna e com qualidade. Entretanto, algumas facilitações para a história avançar incomodam e muito. Um exemplo disso é a maneira mágica que Harrison encontra seu pai dado como morto numa cidade onde Dexter tinha escolhido como um “bom lugar para não ser achado”.
A volta de Jennifer Carpenter para o papel de Debra Morgan, que os roteiristas acharam que tinham construído uma cena memorável para sua morte na oitava temporada e foi só um tremendo equívoco, foi um bom acerto. Mesmo sem saber como a policial voltaria para a série, em forma de pensamentos ou flashbacks, já foi possível criar mais expectativas para rever a personagem de alguma maneira. Mesmo que tenha momentos bem inspirados e que permitam a atriz viver a nervosa e adorável Debra de novo, não é a mesma coisa que seria se a personagem estivesse viva e tendo um papel de verdade na história. Porém, a atriz aproveita bem as oportunidades que recebe e sua participação rende ótimas cenas.
A história dos vilões desta nova temporada agrada o suficiente para ser lembrada como um dos melhores obstáculos que Dexter já enfrentou. Seguindo um pouco a fórmula de sucesso que foi a história de Trinity/Arthur Mitchell, a trama do serial killer que pega mulheres em busca de carona é bem instigante e serve bem de entretenimento para esperar o que realmente importa nesse retorno.
O problema em transformar a psicopatia de Dexter em algo reversível e controlável ainda existe. Acredito que os produtores entendem que um personagem sem sentimentos não causaria empatia alguma no público e por isso abrem espaço para Dexter poder ser um bom namorado e um bom pai, mesmo sendo um psicopata. Incoerências a parte, a trama vai ficando sim interessante e o ritmo acelerado. Chega em um ponto na história que tudo parece estar acontecendo rápido demais, principalmente para quem esperava uma nova temporada. Afinal, é um trabalho bem feito e conseguiram uma nova maneira de apresentar o Dexter. Não parecia que iriam abrir mão de tanto planejamento em apenas uma temporada de apenas 10 episódios. Existe ainda a possibilidade em continuarem a história com o Harrison, mas ainda não houve a confirmação desta nova temporada.
A relação entre o protagonista e Harrison é bem desenvolvida em Dexter: New Blood. O conflito entre o filho abandonado e o pai misterioso torna-se uma camada tão importante para a história que vira decisivo para o ápice da trama. O problema é que a temporada desenvolve os personagens por muito tempo e não deixam o público perceber que é uma reta final para a história de Dexter. O erro do passado é repetido nessa nova chance que conseguiram para a série. O cerco se fecha para o Dexter de maneira morna e embates importantes com personagens da série principal não acontece. O tenente Angel Batista (David Zayas) merecia descobrir tudo o que aconteceu nas temporadas anteriores e ser o responsável por comandar uma investigação em cima de Dexter. Existiam muitas maneiras de tornar eletrizante o desfecho, mas continuaram deixando um gosto amargo no final. Está menos ruim do que deixar Dexter no meio de uma floresta como no outro final, porém haviam caminhos bem melhores para o personagem.
Embora seja uma temporada com pontos bem positivos, a conclusão acaba sendo apenas um “ok” e deixa a sensação de que o final do primeiro episódio lá de outubro de 2006 agrada bem mais do que o “grande” final da história. Não sei se é o suficiente para os fãs perdoarem o desleixo com o psicopata mais carismático da ficção, mas Dexter: New Blood tem seus bons momentos. Poderia ser memorável? Sim, mas somente o personagem é que será inesquecível.