Quando assisti ao premiado Homem-Aranha no Aranhaverso, eu fiquei impactado com a mistura de técnicas e efeitos de iluminação em uma animação 3D que conseguia se diferenciar de todos os “concorrentes” do gênero. As cores e as texturas lembravam revistas em quadrinhos e me encantaram tanto que quase esqueço da imensa qualidade do roteiro. Três anos depois, a Sony Pictures Animation lança A Família Mitchell e a Revolta das Máquinas e faz mais um feito espetacular, mesmo sem Homem-Aranha. O mais seguro para grandes players como a Sony é apostar nas franquias de sucesso, mas existe sucesso além dos heróis.
Mike Rianda e Jeff Rowe assinam a direção e o roteiro deste longa, lançado em abril de 2021 na Netflix. A dupla mostra que é possível fazer algo tão divertido e visualmente genuíno. A Família Mitchell e a Revolta das Máquinas conta a história de uma família que está longe de ser perfeita. A filha Katie (Abbie Jacobson) quer deixar a casa para estudar Cinema. O pai (Danny McBride) não compreende as escolhas da filha. A mãe (Maya Rudolph) é uma professora com uma rotina supercorrida e o filho caçula (com a voz do diretor Mike Rianda) ama dinossauros. Longe dos estereótipos da perfeição, os Mitchells são desengonçados e afastados da opressão da beleza “instagramável” do nosso mundo.
Com todos os seus problemas, a família estaria fadada a ser só mais uma família comum. Enquanto eles viajam de carro atravessando o país levando a filha para seu primeiro dia na faculdade, um ataque de robôs é comandado por uma inteligência artificial. PAL (Olivia Colman) tenta mandar todos os seres humanos para o espaço, literalmente. Quem foram os únicos da terra que não foram capturados pelos robôs? Resposta certa: os Mitchells.
O filme parece ser a soma de A Pequena Miss Sunshine com Eu, Robô transformada em animação. O roteiro mistura de maneira equilibrada uma pegada de “Road Movie” com um humor muitas vezes irônico. A dissincronia da família, compilada nos olhos do cachorro Monchi, é a base de boa parte das piadas. As alusões aos filmes de ficção científica e de ação também proporcionam gargalhadas. Quem pensa que a história não é capaz de produzir reflexão, está enganado. Fica nítido, e até óbvio, que a família vai aprender com isso. Talvez esse desenlace simplório seja o único ponto previsível demais da história o que não prejudica em nada a sua divertida jornada.
Analisando a árvore genealógica dos Mitchell, veremos outras tantas histórias “ancestrais” no cinema como Família Addams, Família Buscapé e, para citar uma animação “pixariana”, Os Incríveis. É perceptível suas conexões que forjam a produção da Sony. Com uma diferença: as equipes que produziram Aranhaverso e Mitchell estão conseguindo traçar um visual marcante, com personalidade e, ao mesmo tempo, um distanciamento necessário das animações em 3D que estamos acostumados a ver com Pixar e Disney. Buscar a perfeição do 3D está longe de ser o principal objetivo de uma boa animação. A Família Mitchell e a Revolta das Máquinas é um excelente exemplo de que existem boas histórias para serem contadas que não estão nas faunas de Marvel, DC ou Star Wars.