Sherlock e o jogo da expectativa

O texto a seguir contém SPOILERS do retorno de Sherlock

Dizem por aí que a expectativa é a mãe da frustração. Quando falamos de cultura pop, é natural criar o famoso hype por algo, especialmente quando uma longa espera é adicionada à equação. Sherlock é uma série que sofre bastante com isso. Após um ano do lançamento do excelente especial de Natal e três anos sem uma nova temporada, os fãs esperavam ansiosos pela estreia da quarta temporada.

Mas The Six Thatchers não parece muito com o retorno triunfal que todos esperavam. Claro, existe o peso da expectativa aqui. Mesmo assim, alguns elementos do primeiro episódio da quarta temporada não agradam. Não que esse seja o pior de todos, mas certas coisas parecem fugir do cenário natural de Sherlock.

Quando todos esperavam algo mais consistente sobre o retorno (?) de Moriarty, o roteiro de Mark Gatiss prefere trabalhar apenas com pequenas insinuações e muitas dúvidas. Ao invés de dar a resposta logo de cara, The Six Thatchers joga com a evolução de seus personagens. É natural que eles tenham mudado desde a primeira temporada, mas aqui temos, talvez, as provas mais concretas dessa modificação.

A dinâmica entre John e Sherlock continua incrível, apesar da adição de novos elementos. Mary e a bebê Rosamund acrescentam mais tempero na mistura, o que garante ótimos momentos durante o início do episódio. A naturalidade com que Martin Freeman, Benedict Cumberbatch, Amanda Abbington e companhia retornam aos personagens depois de tanto tempo é digna de aplausos. Parece que a terceira temporada terminou ontem.

Além da química entre os personagens, até mesmo os secundários, a montagem do episódio segue o padrão de qualidade da série. Especialmente quando Sherlock libera sua verborragia de deduções. O humor também está no ponto certo. Mas o grande problema de tudo está em algumas partes do roteiro.

É natural, tanto nos contos originais quanto na série, que os casos ganhem aspectos mais estranhos na medida em que se desenvolvem. Uma morte acidental evolui para uma trama de espionagem internacional, com traição e agentes raivosos. Mas nada que realmente cause algum impacto, exceto pela saída fácil encontrada pela dupla Mark Gatiss/Steven Moffat.

Quando a história caminhava para um final completamente monótono e de soluções fáceis, eis que Mary é morta em uma cena pouco criativa. Matar sua melhor personagem é algo arriscado, até mesmo para Sherlock. De imediato, a amizade entre os protagonistas foi abalada. Watson se fechou e Holmes busca caminhos para consertar seu erro e ajudar o amigo.

Mas a morte de Mary precisa ir além disso para justificar seu descarte prematuro. É possível acreditar que a decisão tenha um peso no desenrolar da trama da temporada? Sim. Mas com a sombra de Moriarty crescendo, é possível que outro evento traumático apague esse, especialmente com as promessas que cercam o último episódio. Resta confiar que Gatiss e Moffat sabem o que estão fazendo.

The Six Thatchers não é o retorno perfeito de Sherlock, mas a série não é uma das melhores em exibição atualmente por acaso. Todo fã já recebeu provas suficientes para ter confiança de que as coisas vão melhorar e muito até o fim da temporada. Que venha The Lying Detective e mais uma aventura de Sherlock Holmes.