Irmandade, série da Netflix Irmandade, série da Netflix

Irmandade – 1ª Temporada (Netflix) | Crítica

A Netflix segue investindo em produções brasileiras, e um novo fruto desse movimento é a série Irmandade, que acaba de chegar na plataforma de streaming. A proposta é criar, de modo ficcional, um cenário de surgimento do crime organizado numa cadeia paulista nos anos 90.

A trama aborda uma funcionária do Ministério Público que sente remorso por ter traído seu irmão no passado, ocasionando em sua prisão por tráfico de drogas. Sem saber muito como se reaproximar dele, ela acompanha os casos onde ele é julgado e acaba se vendo obrigada a ajudá-lo. Para complicar a situação, ele agora é líder de uma perigosa facção criminosa intitulada Irmandade.

 

No elenco, quem se destaca mais é Seu Jorge como o líder da facção Edison, algo esperado e trabalhado pelo roteiro. No entanto, a aplicação do ator se junta ao seu carisma e consegue entregar um personagem com muita presença, daqueles que esperamos (e ganhamos) algo a mais em cada diálogo. Figuras assim podem ajudar bastante um projeto, ofuscando inclusive alguns defeitos da produção – e isso acontece bastante em Irmandade.

Até um certo ponto, a narrativa consegue se desenrolar bem, tornando a série um produto de melhor qualidade, lançando mão de diversos aspectos televisivos que, se bem utilizados, mantém o público interessado o tempo todo na história.

Porém, há outras figuras que valem destaque na série como Darlene (Hermila Guedes), que vive a esposa do personagem de Seu Jorge. Não é um papel que exija muito, mas é daqueles casos onde a atriz combina muito com a personagem. A própria protagonista, Christina (Naruna Costa), demora um pouco mais para criar esse vínculo de identificação, mas a partir da metade da história tudo acaba se encaixando.

 

Há aqueles muito caricatos, como Carniça (Pedro Wagner), onde a construção do personagem parece ter passado por um liquidificador de estereótipos resultando num cara de sotaque estranho e personalidade asquerosa. Essa decisão pode ser justificada pela intenção do roteiro em diferenciá-lo como um prisioneiro ainda mais perigoso na série, chegando ao ponto de fundar uma nova facção para rivalizar com Edison. De quebra, é um personagem mais fácil para o espectador odiar.

O melhor do roteiro é que as decisões tomadas sempre possuem algum tipo de repercussão ou justificativa, eliminando aquele costume de algumas séries de mostrar conteúdo arrastado que não chega a lugar algum. em Irmandade, as coisas não demoram para acontecer. Também merece elogio outros fatores como a boa ambientação, que se passa em uma São Paulo de 1994. Fatores como a morte de Ayrton Senna e a Copa do Mundo de futebol (vencida pela seleção brasileira) tem um peso estratégico no texto, indo além de mera ferramenta para situar o tempo dos acontecimentos.

A trilha sonora dos Racionais MC’s são inseridas nesse contexto como uma cereja do bolo, pois é um fato afirmar que ninguém interpretou melhor a situação na época do que Mano Brown e sua turma. Até porque eles não apenas interpretaram: eles sentiram na pele o que era ser marginalizados e ter que sobreviver naquele contexto de pobreza, racismo e tráfico.

Tudo isso acontece sob o comando de profissionais competentes e já experimentados do audiovisual brasileiro, como os diretores Aly Muritiba (do sensacional Para Minha Amada Morta) e Gustavo Bonafé (do filme e seriado O Doutrinador), que contribuem com o criador da série Pedro Morelli.

Irmandade é uma obra que consegue cumprir a missão primordial de um seriado, que é envolver o espectador na história imprimindo uma certa identidade própria, mesmo que isso não a livre de alguns pequenos erros. Ao mesmo tempo, agrega positivamente ao catálogo de originais da Netflix.