Fig 09 Elfo Bestiário Criátivo de Enéias Tavares Jessica Lang Fig 09 Elfo Bestiário Criátivo de Enéias Tavares Jessica Lang

Tomo XII – Elfo: Energizando sua Carreira Literária | Bestiário Criativo

Finalmente é a noite do lançamento de seu livro, com amigos, familiares e outras criaturas de sua predileção, todos na expectativa de sua grande realização literária. Sem dúvida será uma noite de fotos, sorrisos, conversas e festa, especialmente se você planejou um festejo em algum bar ou pub. O sonho foi realizado, o dragão foi vencido e o coração continua palpitante. Mas no dia seguinte… o que diabos você faz?! Na última coluna do nosso Bestiário Criativo, Enéias Tavares e seus convidados discutem elfos, divulgações e carreira literária. Pronto para colocar o pé na estrada?

Elfos são criaturas místicas que comunicam uma aura de delicadeza, completude e harmonia. Na mitologia nórdica, eles são associados à luz, ao sol e a energias benéficas, todas conectadas à natureza e ao bem-estar de seres vivos. Na idade média, Elfos foram associados à cura de doenças e à purificação de corpos adoentados, esgotados por uma batalha ou prejudicados por algum feitiço. Vem daí a sua comum representação como seres belos, jovens e luminosos. Na mitologia escandinava, suas habilidades positivas também envolvem os quatro elementos naturais (ar, terra, fogo e água).

Escritores e suas carreiras encontram nessas criaturas uma poderosa analogia para o papel e o poder da arte. Pessoas vivem por suas histórias e tendem a adorar seus criadores, afinal são eles os responsáveis por momentos inesquecíveis de alegria, paixão, emoção e também sofrimento, mesmo que por razões ficcionais. Além disso, alguns autores projetam uma imagem de delicadeza, bem-estar e eterna gentileza… mesmo depois de horas e horas de autógrafos e fotos. Desde Aristóteles, arte é sinônimo de cura (catarse) e daí o poder curativo de elfos autores e elfas escritoras.

Mas não apenas de boas energias vivem os elfos. Para a tradição medieval inglesa, por exemplo, eles são fundamentalmente masculinos e dados a crimes inomináveis e agressões de várias sortes. Já para os primeiros modernos – Shakespeare entre eles, em seu Sonho de uma Noite de Verão – eles eram pequeninos e travessos, mais bagunçando do que auxiliando nas rotinas humanas. Do mesmo modo, alguns escritores e escritoras mais irritam do que atraem, mais atrapalham do que ajudam, projetando uma falsa aura de celebridade ou então de prepotência ou indisponibilidade. Isso sem falar nas “tretas”. Ah… as tretas! Se você trabalha com literatura ou frequenta círculos literários, certamente sabe do que estou falando.

Príncipe Elfo, por Trung Tin Shinji

O objetivo da coluna deste mês, obviamente, não é abrir o baú de histórias feias e relatos desastrosos de escritores ou de “falsos elfos”, afinal, a internet já está cheia delas. Ao contrário, é concentrar nossas discussões em elfos benéficos, que projetam luz e energia num mundo cheio de sombras e horrores. Se você acabou de lançar seu primeiro ou segundo livro e está naquele momento desafiador de lidar com sua carreira, esta é a coluna pra você. Mas antes de começarmos, vamos entender uma importante diferença que envolve a produção da literatura na atualidade.

Um dos passos definidores da minha carreira como escritor foi a Oficina de Escrita criativa que fiz em 2009 na PUC-RS, a oficina mais antiga do Brasil, com mais de três décadas de existência. Seu criador – e até hoje mestre dos trabalhos – é o premiado escritor e acadêmico Luiz Antonio de Assis Brasil, um homem reconhecido por seu talento, gentileza e generosidade. Na sua oficina, Assis Brasil tinha uma frase célebre: “Uma coisa, caros autores, é a literatura. Outra bem diferente é a vida literária”.

Por “vida literária”, o mentor de muitos escritores sulistas aludia ao conjunto de ações e atividades que tinham menos a ver com a escrita e mais com a divulgação da escrita. Ou ainda, menos a ver com processo e trabalho e mais com os resultados do trabalho, resultados que envolvem entrevistas, eventos e ações comerciais. Depois dessa frase, ele alertava os jovens autores presentes a reverem se o que importava mais a eles era a literatura ou vida literária e desaconselhava os que buscavam mais os pretensos louros da segunda e menos o trabalho árduo e incansável da primeira.

Em nosso caso, se as primeiras onze entradas da coluna trataram de literatura, este último texto será dedicado à administração da nossa vida literária. Exemplificando isso de forma mais clara: Para autores não publicados, o lançamento de um livro por uma editora ou de forma independente é a concretização de uma série de desejos e expectativas, a culminância de um sonho, a execução de uma meta existencial. Passado esse momento, o autor ou autora percebe que seu percurso não se encerrou ali. Ao contrário, pois há ainda outra jornada a se realizar e esta tem a ver com formação de uma audiência, divulgação e comercialização da obra e presença constante em eventos. Vamos a cada um desses itens?

Onde está meu público?

É muito comum ouvirmos autores perguntando privada e muitas vezes publicamente a questão acima, quase sempre num discurso que não raro cai no lugar comum da afirmativa de que de os brasileiros não leem, de que o jovem não gosta de livros, etc. O fato é que estamos em um país no qual a formação de leitores é deficitária e os debates sobre letramento literário ainda são bem insipientes. Diante disso, o que se precisa fazer é sim arregaçar as mangas e trabalhar para formar leitores. Como? A discussão abaixo, aponta para algumas saídas, apesar da questão não ser nem um pouco fácil de resolver.

Indiretamente, na coluna do mês passado, já tratamos da formação de uma audiência, especialmente ao vermos os casos de AJ Oliveira – e seu podcast Os 12 Trabalhos do Escritor – e Ian Fraser – e sua campanha no Catarse para publicar a série Araruama. Esses dois autores recorreram a duas diferentes plataformas para pouco a pouco formar um primeiro conjunto de leitores. No caso de AJ, seu podcast é uma referência no quesito criatividade e produção literária. Já Fraser, está se tornando – campanha após campanha – um dos nomes mais instigantes da fantasia nacional, especialmente se pensarmos num caso que está correndo ao lado da produção literária tradicional.  

Para autores que estão em início de carreira, a dúvida sobre o que vale mais – investir na formação de um público ou na escrita – é um dilema comum. Muitos editores, inclusive, cobram isso de muitos autores: Que além de livros, o autor forme seu público. Daí o grande investimento em youtubers e celebridades televisivas, que já teriam um público formado. Os caminhos para isso são múltiplos – Youtube, Medium, Facebook, Instagram ou Soundcloud, entre várias outras plataformas ou redes que nos deixam tontos sem saber por onde começar. Há algumas décadas, o problema era a falta de meios para concretizar o que idealizamos enquanto criativos. Hoje, o desafio é outro: Como produzir algo e ser notado entre as centenas de milhares de outros criativos que estão na rede? Se você for um elfo, use magia. Se você for um simples humano, use sua imaginação!

Bruxa Elfa por Nikolai Ostertag

Nesses casos, jovens autores precisam avaliar duas coisas: a) Qual é o público que você deseja atingir e b) Qual é a plataforma ou mídia que você mais gostaria de investir. A primeira questão é mais complexa, uma vez que é muito difícil de mapear qual é o seu público num momento inicial. Ao invés de pensar em faixas etárias ou gêneros – algo que as oficinas de Escrita Criativa por aí sempre indicam – eu prefiro sugerir faixas de leitores. Eu, particularmente, não gosto de pensar que escrevo para jovens ou adultos ou para homens ou mulheres. Antes, escrevo algo para quem aprecia Anne Rice, Thomas Harris, Alan Moore e Lovecraft, além, é claro, de Shakespeare, Goethe, Blake, Wilde, Machado, Aluísio…

Brincadeiras à parte, mapear sua futura audiência a partir da literatura que ela consome pode ajudá-lo(a) planejar qual audiência se pretende atingir. Obviamente, você não divulgará um livro que você está escrevendo ou pretende publicar. Falaremos de divulgação daqui a pouco. Ao invés disso, o que você precisa fazer nesses contextos é papear, conhecer as pessoas, opinar e dialogar, sendo pouco a pouco conhecido e apreciado por seus novos amigos literários. Quando finalmente você tiver algo pronto e publicado, daí sim você pode anunciar nesse contexto a novidade. Se uma relação honesta, respeitosa e carinhosa foi construída, eles ficarão felizes por você e alguns, comprarão seu livro.

O segundo caminho diz respeito a criar um canal de comunicação mais direto e com mais chances de se propagar com o tempo. Falamos aqui de um canal no Youtube, de um podcast, de um blog ou Medium ou mesmo uma página de autor. Mas indiferente da sua escolha, pense no quanto você a) sabe, b) gosta e c) pode produzir conteúdo para esses canais. Nem todo mundo sabe fazer vídeos ou áudios e a publicação de conteúdo tecnicamente ruim pode mais prejudicar sua carreira do que ajudar. Outra questão é a frequência com que você posta conteúdo. O grande problema de canais que não avançam é sua (falta de) periodicidade. Então, ou você está realmente comprometido com a produção do conteúdo no formato que escolheu ou então segure qualquer lançamento.  

Oscar Nestarez, Thiago Tizzot e Karen Soarele

Sobre a importância da criação de uma comunidade, Oscar Nestarez, autor de Horror Adentro (Kazuá) e Bile Negra (Empíreo), afirma: “Pelo que constato, hoje, a maioria dos editores não olha mais somente para uma proposta ficcional, mas também para a comunidade do autor, para o círculo de leitores que se forma ao redor dele (com as redes sociais e plataformas de publicação, é possível – e até desejável – que um autor conte com isso, mesmo que não tenha sido publicado).”

Segundo Thiago Tizzot, autor do romance Três Viajantes e editor da Arte & Letra, editores avaliam tudo, até a possível base de fãs de um autor: “Hoje os editores procuram por algo além do texto, avaliam o autor, o alcance que ele pode, sua interação com os leitores e quanto a sua obra pode passar dos livros para outras mídias. É difícil dizer a forma adequada, não existe uma fórmula para ser publicado, cada autor deve encontrar seu caminho. O importante é sempre estar trabalhando e estar pronto quando a oportunidade aparecer. Para minha primeira obra eu construí uma editora para publicá-la.”

Karen Soarele, autora da saga Crônicas de Myríade (Independente) e do recente A Joia da Alma (Jambô Editora), romance ambientado no universo do RPG Tormenta, afirma: “Também é importante saber se apresentar. Quando entrei em contato com a Jambô Editora, eu já tinha publicado quatro livros de forma independente. Havia ministrado palestras em diversos eventos e escolas, dado entrevistas para meios de comunicação tradicionais, como rádio, TV e jornais, conhecia um bom número de blogueiros literários, tinha trabalhado a minha presença digital por meio de blogs, podcasts e vídeos no Youtube, tinha vendido mais de mil livros cara a cara com os leitores, de pegar o dinheiro e dar o troco. Em suma, além de escrever bem, eu já havia aprendido a parte difícil da coisa, muito do que só se aprende com a experiência.”

Karen também investe em parcerias com blogs e canais, aconselhando novos autores a não se fixarem em modelos tradicionais de publicação, sobretudo em tempos tão mutáveis e incertos do  mercado: “Quem vai sobreviver? Quem souber reinventar seu modelo de negócio. Não adianta ficar parado no tempo. É aí que entra a tecnologia. Hoje, editoras e autores vendem diretamente para o leitor pela internet, o que possibilita que lançamentos cheguem com mais agilidade aos quatro cantos do país. A popularização dos e-books é ainda mais revolucionária. Além de driblar as dificuldades logísticas, o leitor ainda recebe o livro desejado instantaneamente. Enquanto isso, blogs e canais literários contribuem com a divulgação das obras. Isso é possível mesmo que o autor, a editora, o blogueiro e o leitor estejam cada um em uma cidade diferente! O meu conselho, tanto para os iniciantes quanto para os profissionais já consolidados é: não se prenda aos costumes tradicionais do mercado editorial. Não tenha medo de publicar de forma digital.”  

No caso da nossa metáfora, é importante pensar que elfos devem compartilhar energias saudáveis e construtivas, não sombras de desolação e ressentimento. Infelizmente, as redes sociais se tornaram – além de uma Terra de Ninguém sem regras ou balizas – um território tóxico no qual críticas infundadas, opiniões equivocadas e posturas nocivas correm soltas como alazões selvagens. Então, se você está construindo sua audiência, pense no tipo de energia que você deseja projetar. Pode parecer exagerado, mas cada post, imagem e tweet conta e, muitas vezes, são eles que formarão ou afastarão sua audiência.

Lancei meu livro, e agora? Como vendê-lo?

Essa é a pergunta de 13 entre 10 – sim… a proporção está certa, pois sempre tem alguém que faz essa pergunta duas, três ou mais vezes! – autores que acabaram de publicar sua obra. Sabem o que eu falei antes sobre o problema não ser lançar conteúdo na internet e sim o ser visto? O mesmo pode ser estendido para o mercado editorial hoje. Editoras de médio e pequeno porte, gráficas por demanda e financiamentos coletivos tornaram o sonho de lançar um livro algo mais realizável. Mas isso ocasiona outra dificuldade: Como fazer seu livro ser encontrado, lido e recomendado entre milhares de outros livros?

Um primeiro movimento pode partir da reflexão sobre seu público potencial. Tendo essa informação, você pode então dialogar diretamente com essas audiências, usando grupos específicos dedicados a discussão de temas, autores e gêneros próximos da literatura que você produz. Meu primeiro esforço de divulgação de Brasiliana Steampunk  foi fazer posts constantes em grupos dedicados a Alan Moore, Literatura Brasileira e Steampunk. O primeiro, não teve grande impacto, pois seus participantes não estavam interessados em produções nacionais inspirados no mago de Northampton e sim no próprio. Já nos outros dois, a recepção foi positiva, pois como são grupos mais abertos a novidades, a ideia de uma série retrofuturista nacional inspirada na literatura brasileira parecia atraente.

Alan Moore, Steampunk e Machado: Como assim?!

Nesse quesito, avalie de forma bem objetiva qual é o seu objetivo e sempre – sempre mesmo, tá? – use de bom senso! Posts repetidos, autopromoção frequente e ofertas de venda não costumam dar bons resultados. Um dos problemas da modernidade, e da internet por consequência, está no fato de sermos bombardeados diariamente por propagandas de produtos e serviços. A própria ideia de redes sociais objetiva interação, diálogo e trocas, não marketing. Você não entra no Facebook porque deseja comprar algo e sim porque deseja interagir com seus amigos e conhecidos. Então, ser cuidadoso nos posts e não focar apenas na promoção – tanto no sentido de divulgação quanto de preço baixo mesmo – do seu livro é sempre recomendável.

Eu particularmente, como leitor, já sei que os livros do meu autor/autora favorito(a) estão à venda. Assim, o que me interessa são novidades sobre seus processos criativos, seus hábitos como escritores, suas opiniões sobre a vida, sexo e política – ???? – e sobretudo suas indicações de filmes, livros e outras obras. E muitas vezes, são essas informações que me fazem voltar a comprar suas obras ou então a comprá-las para presentear amigos, e não o “Livro com 50% de desconto e frete grátis!”. Lembrem- se que, por mais necessário que seja observar a dimensão comercial da literatura, compramos histórias pelo vínculo emocional, pela experiência imaginativa, pela conexão humana… e não porque “está baratinho”.

A atual crise do mercado editorial reflete um pouco essa distorção: A de que devemos pagar pouco por livros, assim como devemos pagar pouco por roupas, eletrodomésticos e… frutas! Mas livros não pertencem a essas categorias. E é injusto cobrarmos isso de um objeto cuja produção é tão limitada e cuja concorrência é praticamente nula. Uma coisa é você especular descontos em TVs de plasma que são produzidas aos milhares e por várias empresas, com componentes que vem do outro lado do planeta. Outra bem diferente é esperar o mesmo de um livro cuja tiragem é de um, cinco ou dez mil exemplares.

Foco no Preço Baixo ajuda ou atrapalha o mercado de livros no Brasil?

Ademais, quando aplicamos a livros os mesmos critérios que temos para os produtos acima, estamos desconsiderando quão desafiadora é essa corrente de produção para os seus criadores. Busquemos novamente o seu caso pessoal. Você quer traduzir dez documentos para o russo e então chama aquele amigo ou familiar que tem formação em russo e que trabalha com tradução. Caso o preço de mercado seja vinte reais a lauda, você teria a coragem de pedir a ele que fizesse um desconto e cobrasse de você oito reais ou dez? Eu não faria isso com uma pessoa que eu aprecio e respeito. Muito menos a um autor, editor ou livreiro que trabalha com o/a produto/experiência que eu mais amo na vida!

Não entrarei no mérito do problema da cadeia de produção nem no quanto a Amazon e outras empresas de e-commerce são benéficas ou não ao mercado. Esse assunto já foi tratado anteriormente, mas acho importante que entendamos, ainda como leitores, a importância dessas questões. A sensibilidade quanto a isso nos fará, enquanto autores, perceber que para nossos futuros leitores, ser constantemente bombardeado por promoções… cansa. Ou em bom português: enche o saco! Leitores não querem de nós prioritariamente promoções e frete grátis. Antes, o que eles esperam são boas histórias e experiências imaginativas inesquecíveis.

Quando questões envolvendo “preço” e “entrega” saem da jogada, podemos voltar a falar de divulgação como uma importante e necessária ferramenta voltada à visibilidade da ficção e da literatura. Por exemplo, divulgações que compartilham bastidores de trabalho, artes inéditas, mapas do mundo, ações transmídia, presenças em eventos, cursos ministrados e podcasts, te ajudam a ficar mais próximos do seu público e a motivá-lo ao mais importante: mergulhar em seu universo ficcional. Para muitos autores, páginas nas redes sociais são fundamentais, bem como sites de projetos literários.

Hoje, sites tendem a ser portais de armazenagem mais duradouros. Nas redes sociais e nas páginas ou perfis nas redes, você pode divulgar todo e qualquer conteúdo que achar interessante. Já no seu site oficial, o aconselhável é publicar apenas o que é fundamental da sua produção e do seu universo. Pense nas redes sociais como jornais e revistas, como ferramentas de divulgação mais constantes e menos permanentes. Por outro lado, encare seu site como um livro, que exige tempo e investimento e que pode perdurar como uma vitrine mais constante da sua produção. Destaco aqui os sites das séries A Bandeira do Elefante e da Arara, de Christopher Kastensmidt, ou o Filosofia Nerd, de Eduardo Spohr, que são belos exemplos disso, e que servem de inspiração para o site de Brasiliana Steampunk.

Sites da Série A Bandeira do Elefante e da Arara e do autor Eric Novello

Há autores que estão começando a investir em páginas autorais, como são o caso de Eric Novello e Karen Soarele. A escolha é sua e você pode, num primeiro momento, optar por centrar seus esforços em seu trabalho ao invés de na sua persona. Depois que a carreira ganha mais fôlego e sua produção mais escopo, talvez faça mais sentido ter uma página de autor. Mas novamente: não há regras e cada autor ou autora trabalhará como achar mais coerente. E o mesmo vale para redes sociais. Hoje, Facebook, Instagram e Twitter dividem o mercado literário. Alguns autores deixaram de lado a primeira e investem mais nas últimas duas. Outros, continuam tentando trabalhar com as três redes.

A meu ver, o Facebook continua sendo o ambiente com o maior número de usuários envolvidos com ficção, debate e divulgação literária, vide o grande engajamento produzido por grupos como Reino dos Livros ou Skoob. Por outro lado, redes como Instagram são ideais para se conhecer a vida pessoal de autores, suas leituras e hábitos, mas tudo comunicado e resumido em imagens, menos em texto. Já o Twitter ainda é a rede mais interessante se você está interessado num diálogo imediato com seus leitores, sem as maldições dos logaritmos das primeiras duas. Isso, ao menos por enquanto.

Sobre a importância dessa presença nas redes, Rodrigo Van Campem, editor da Revista Trasgo e autor da novela Trabalho Honesto, é taxativo: “O mercado praticamente não tem mais espaço para o autor recluso. É preciso estar na internet, é preciso estar nos eventos conversando com autores, editores, com o pessoal do mercado. Não existe nada melhor para a carreira de um escritor do que um bom relacionamento, principalmente tendo em vista que o mercado literário brasileiro é minúsculo, existe aquela sensação de que todos se conhecem. Queimar-se com um editor ou grupo pode significar queimar-se com vários. No entanto, é preciso lembrar que as redes sociais são uma vitrine para o seu trabalho. Tentar divulgar-se demais, abusar dos grupos divulgando a própria obra, mandar mensagens pedindo leitores, tudo isso pode gerar problemas. É preciso equilíbrio e paciência. E claro, não ter presa para lançar. Editores existem também para proteger o autor, para que ele não publique uma obra muito imatura, o que pode prejudicar sua carreira futura.”

Diogo Andrade, um autor que muito tem a dizer sobre presença nas redes, dado seu trabalho com o romance A Canção dos Shenlongs (Amazon), afirma: “A internet e as redes sociais são fundamentais para qualquer produtor de conteúdo hoje em dia. E com a literatura não é diferente. E quando se é autor independente, como no meu caso, elas acabam sendo a forma mais efetiva, e de baixo custo, para a divulgação do seu trabalho.”

Rodrigo Van Campem, Diogo Andrade e Ana Cristina Rodrigues

Uma das frustrações de muitos aspirantes à escrita é quão demorado o retorno financeiro pode vir. Não raro, muitos autores precisam levar uma vida dupla durante muitos anos – trabalhando para pagar as contas durante o dia comum e investindo em sua carreira em outros momentos. Andrade adiciona: “Ser escritor no Brasil é um desafio. A grande maioria de nós tem que se dividir entre o ofício da escrita e outra profissão; comigo não é diferente. Faz quase dois anos que decidi reorganizar minha vida para ter mais tempo para escrever. Atualmente, um dos maiores desafios de qualquer escritor enfrenta, especialmente iniciantes, é ser lido. Há uma enorme oferta de títulos e ainda se compete com outras mídias como filmes, séries e videogames. Mesmo com tudo isso, temos no país um público leitor crescente e em formação, ávido por histórias e cada vez mais disposto a buscar histórias de autores nacionais.”

Saber contrabalançar os desafios da carreira com uma visão positiva sobre o mercado literário é também importante para se manter a calma, a energia e a sanidade. E isso também tem a ver com o papel que ações de marketing e divulgação têm em nossa vida, nunca suplantando o que realmente importa. Sobre isso, Ana Cristina Rodrigues, autora de Anacrônicas (Aquário Editorial) e Fábulas Ferais (Arte & Letra), afirma: “Atualmente, acho que o desafio principal é ter tempo pra literatura, não se afogando no entorno de redes sociais, eventos, comentários, opiniões etc. É preciso usar essas ferramentas sim, mas com moderação para não se tornar autor de rede social e deixar suas obras, sua literatura para trás. Ter foco no que realmente importa, no que é o núcleo de nossa ação, é o mais difícil hoje, principalmente por ser cada vez mais raro que consigamos sobreviver somente da nossa arte. Redes sociais são importantes, mas não são nem podem ser o foco. O foco é a escrita. As redes são o entorno, o caminho para alcançar leitores e colegas de ofício, de descobrir novas leituras, novas editoras, e mesmo novos caminhos.”

Quando falamos em redes sociais, é difícil mapear quanto tempo elas durarão ou quais novidades irão surgir nas próximas décadas. O importante é se estar atento a elas e usar as redes que mais atraem você. A carreira literária é também um exercício de autenticidade. Quanto mais você for você, melhor. E nisso, o conselho é simples: Você curte mais selfies engraçadas ou charmosas, frases rápidas e ácidas ou posts mais elaborados sobre grandes e ousados assuntos? Responda a essa pergunta e siga seu feeling. Nesse aspecto, Ana deixa seu principal conselho a novos autores: “Não finjam ser quem não são. Não criem personas virtuais que não sejam espelhos do que vocês verdadeiramente são. Não finjam gostar de A, B ou C (seja música, arte, literatura, ou mesmo pessoas) porque isso não se sustenta. Sejam vocês mesmo. Sim, isso pode ter um preço, mas o inverso custa bem mais.”

E agora, vamos pegar a estrada junto com o nosso Elfo aventureiro?

Presença em Eventos

Nossa última coluna do Bestiário Criativo termina com um conselho simples: “Na dúvida, Pé Na Estrada!” Acima foi mencionado a figura do “autor recluso”, aquele autor que se orgulha de não estar nas redes e de não sair de casa. Obviamente, cada um sabe de si e quanto mais conhecido for um autor ou autora, menos necessidade de correr atrás da sorte ele ou ela terá. Mas no caso de autores iniciantes e especialmente autores num país que ainda carece de um sistema literário forte e durável, essa postura tende a ser prejudicial.

São vários os benefícios de se fazer a mala e partir para eventos em capitais e cidades do interior. Primeiro, porque você sai de sua zona de conforto e vê, ouve e contata pessoas diferentes. Eventos literários, tendo ou não grande público, sempre contam com outros escritores que escrevem fantasia ou qualquer outro gênero. Conversar com esses autores e aprender com suas histórias e com suas carreiras é sempre uma aula daquelas. Em segundo lugar, porque você estará perto dos seus leitores ou então… de futuros leitores. Nenhum de nós esquece quando conhece um autor publicado, não é mesmo?

 Bestiário Criátivo
O Dilema dos Eventos Literários: Ir ou não ir?!

Além disso, viagens para eventos resultam sempre em conteúdo para redes sociais, em histórias divertidas e na recarga de energia que todos nós precisamos para continuar batalhando pela nossa arte. No melhor dos mundos, você tem um auxílio para viagem e cachê. No mundo real de quem já tem alguma projeção, apenas auxílio para viagem. Agora, em início de carreira, não raro são os casos de escritores que pagam por estas viagens. E isso é normal, em qualquer profissão. Converse com um arquiteto, um advogado ou um médico e pergunte a ele se há qualquer ajuda financeira para eventos de suas áreas e a resposta comum será uma negativa.

Portanto, pense nisso como um investimento em sua carreira. Por outro lado, também calcule bem seus movimentos para a) não se endividar; b) não se desgastar; e c) não investir tempo e dinheiro (literalmente!) em eventos mal organizados ou de público muito limitado. Por mais que seu ânimo seja enérgico e sua disposição apaixonada, até o mais disposto autor… cansa! Há eventos e eventos, e fazer uma rápida pesquisa pode te ajudar a decidir a quais eventos você pode ou deve estar presente e quais você pode deixar passar.

E falando em cair na estrada…

Nosso elfo está sorridente. Como uma criatura das matas, ele adora partir para novos territórios, cruzando novas fronteiras e contatando novos povos, culturas e saberes. O capô está levantado, pois ele adora o vento e os seus manuscritos, livros e posts estão voando, em busca de leitores, em busca de conexões. Onde eles irão parar? Onde nosso elfo irá chegar? Onde você estará amanhã ou depois, com suas histórias, livros e carreira? Sinceramente, eu não faço a mínima ideia. E isso é bom!

Nossa cultura investiu muito na certeza e no conhecimento como uma forma de nos tranquilizar diante do desconhecido. Ora, empregos fixos, títulos acadêmicos, relações pessoais não muito intensas… tudo isso nos dá segurança e estabilidade e não há nada de errado com essas coisas. Mas a carreira literária, assim como a arte, é uma jornada incerta e surpreendente. Você não sabe onde chegará, não tem mapa para esse percurso nem bússola, sobretudo numa época em que tudo muda tão rápido. Por isso, faça como o Elfo de Jessica Lang, e simplesmente… aproveite o percurso, a vista e o vento. Mais do que isso, é perder uma valiosa oportunidade de se divertir no processo de criar histórias, publicá-las e lançá-las ao mundo!

Elfo Bestiário Criátivo de Enéias Tavares Jessica Lang
Elfo Viajante, por Jessica Lang

Com isso e com ele, chegamos ao final do nosso percurso. Nesses doze textos, e com a ajuda de dezenas de autores e autoras que exemplificam muito da literatura fantástica em nosso país, discutimos ideias para histórias, estruturas inovadoras, personagens complexos e interessantes, tramas instigantes, universos fantásticos, publicação e carreira literária. Eu espero que tenham aproveitado essa jornada e que possam, a partir do que discutimos, continuar na sua grande aventura como autores.

A primeira fase do projeto Bestiário Criativo no CosmoNerd termina aqui. Agora, é espalhar a palavra sobre o “Primeiro Curso Gratuito de Escrita Criativa Fantástica do Brasil”. Para isso, contamos com vocês. Se você gostou do nosso conteúdo, compartilhe a coluna como um todo no seguinte link. Ou então, indique qualquer um dos textos para amigos, conhecidos, professores ou alunos, que tenham interesse em criatividade, literatura e mundos fantásticos.

Nosso desejo – meu, da ilustradora Jessica Lang, dos autores que participaram da coluna e dos magos do portal CosmoNerd – é que você agora escolha sua criatura e produza, com a ajuda dela, Boas Histórias & Boas Memórias, para si e para nós, leitores!

Com carinho,

Enéias Tavares

Santa Maria da Bocarra do Monte, Agosto de 2018

  1. Se isso fosse um filme, esta seria a cena pós-crédito: Bestiário Criativo, agora terminada sua primeira fase, terá novidades em breve… com novos textos e o projeto de um livro bem especial e diferente. Enquanto isso, volte ao primeiro Post e, na companhia das nossas Hidras, comece a escrever o próximo grande romance da literatura fantástica nacional!