Animação made in Ceará com Mariana Medina

A coluna Animaland abre espaço para entrevistas com realizadores de animação pelo Brasil

Produzir animação de qualidade é uma tarefa que exige planejamento, estrutura, domínio de técnicas e muita referência para que funcione bem para o público. O ano de 2017 foi um marco para a animação brasileira. Completamos 100 anos de animação brasileira desde o dia 22 de janeiro de 1917, dia da exibição do filme “O Kaiser”, feito por Seth (pseudônimo do cartunista Álvaro Martins). O curta, exibido no Cinema Panthé no Rio de Janeiro, infelizmente não foi preservado. Ele é um marco do esforço e dedicação de tantos profissionais brasileiros que, assim como eu, nos dedicamos a pesquisar essa área.

Por isso, a Coluna Animaland abre espaço para falar sobre trabalhos importantes no Brasil. Vamos entrevistar pessoas que colocam seus esforços na criação de animações. Para começar, escolhi a amiga e uma das responsáveis por me motivar a trabalhar com essa área, Mariana Medina, produtora de animação que ao lado do companheiro Telmo Carvalho comandam a Tusche Produções, em Fortaleza no Ceará. Com toda simpatia e humildade de sempre, Mariana nos responde e conta um pouco da sua história.

Mariana Medina, roteirista e produtora da Tusche Produções.

ANIMALAND: Mariana, de onde veio a sua vontade de trabalhar com animação? Como começou a trabalhar com isso?

MARIANA MEDINA: Eu desde pequena gostava de assistir desenhos animados, séries e filmes. Me lembro de ter visto os filmes da Turma da Mônica em VHS, na época em que se alugava na locadora, e achei incrível ver os personagens dos quadrinhos ganharem vida. E o mais incrível: eram personagens brasileiros. Então, quando eu estava no 2º ano do ensino médio, eu comecei a pensar o que eu faria da vida. Há princípio pensei em desenho industrial, até que vi uma matéria sobre faculdade de cinema e me identifiquei muito. O curioso é que a faculdade que fiz não tinha aula de animação, mas, durante o curso fiz um estágio no Centro Técnico do Audiovisual (CTAV), no núcleo de Cinema de Animação. Lá que aprendi as técnicas e tive contato com animadores, artistas, diretores, etc. Nesta época fiz estágios em algumas produções que estavam acontecendo no Rio de Janeiro e não perdia as sessões do Anima Mundi, que ajudavam muito a conhecer os filmes produzidos no mundo todo. Em 2002, conheci o Telmo Carvalho e trabalhei no filme dele “Em Busca da Cor” e depois montamos a Tusche Produções.

“Em Busca da Cor” de Telmo Carvalho (2002)

ANIMALAND: A Tusche Produções já é uma referência em produção de animação. Na história de vocês quais os trabalhos você pode destacar?

MM: A Tusche nasceu pra gente produzir nossos curtas e para realizarmos oficinas socioeducativas. Em 2014, começamos a fazer projetos de séries para televisão e mais recentemente de longa metragem. O curta que eu destaco é o “Em Busca da Cor”, que foi o início de tudo. Ele foi todo feito na truca 35mm e finalizado em película de cinema. Estamos com um piloto de série para televisão: “Eric Acorde”. Ele participou do Chilemonos, da Mostra de Cinema Infantil de Florianópolis, do Anima Mundi e do FICI – Festival Internacional de Cinema Infantil, neste ficou entre os 3 finalistas do Prêmio Brasil de Cinema Infantil – Histórias Animadas. Destaco também a nossa série “Um Conto em Cada Ponto”, fizemos 13 episódios de 5 minutos cada, com profissionais e artistas do Ceará. Esta série será exibida nos canais públicos em todo o Brasil, através da EBC – Empresa Brasil e Comunicação. Estes dois projetos de série foram produzidos através dos investimentos da Ancine.

ANIMALAND: Hoje, as políticas públicas, relação com ANCINE e com Governo acabam sendo os maiores responsáveis pelos financiamentos de novas animações. Quais outras possíveis saídas você enxerga para o mercado?

MM: Produzir um filme é caro. Principalmente quando falamos do longa metragem e série para televisão em que precisamos manter uma equipe por vários meses. Existem os artistas resistentes que produzem com pouco dinheiro seu curta metragem. Temos uma tradição de produzir curta metragem aqui no Ceará, inclusive filmes premiados. Mas isso não é suficiente para conseguirmos patrocinadores para nossos filmes e investidores para nossas séries. Já escutei: “Ok, gostei do projeto. Mas, tem gente em Fortaleza para produzir? Se você se associar com o estúdio tal do Rio ou São Paulo, fica mais fácil…”. Por isso a importância de termos conquistado a inclusão da animação no edital da SecultCE (Secretaria de Cultura do Estado do Ceará), e nos editais da TV O Povo e TVC. Eu acho que os investidores sabem que temos qualidade, só querem ter certeza que entregamos no prazo. Mas, eu sou totalmente a favor de parcerias com estúdios fora do Ceará. O mundo está cada vez mais conectado, podemos ter trocas de experiências incríveis. Eu não acredito muito na perda de talentos e de boas histórias. Acho que as pessoas circulam, hoje estão numa produção aqui, depois no Canadá, depois no Rio, depois voltam e se não voltarem, talvez tenha alguém vindo pra cá.

“Um Conto em Cada Ponto” que foi financiado pelo PRODAV 9 da ANCINE.

ANIMALAND: Qual é o panorama do cenário da animação no Ceará? Quais trabalhos você destacaria?

MM: Neste ano de 2018 vamos sentir uma mudança significativa na animação do Ceará. E, acredito que o Fórum Cearense de Animação foi o principal responsável para que isso acontecesse. Neste ano teremos 2 longas, 4 curtas e 1 série para produzir via Edital da SecultCE; mais duas séries para a TV O Povo e mais duas séries para a TV Ceará. São mais de 500 horas de animação. Nunca se produziu tanto no Estado. Acho que duas produções contribuíram para esta mudança: “Astrobaldo” da Lunart e “Um Conto em Cada Ponto” da Tusche. Ambas foram contempladas no Prodav 9 da Ancine/EBC e elas iniciaram no estado a produção com este pensamento de mercado, prazo, televisão… Mas, eu gostaria de destacar os curtas metragens que foram produzidos na garra: V”ida Maria”, “Campo Branco”, “Peleja no Sertão”, “Uma Odisséia no Sertão”, “Guerra dos Bárbaros”, “Esaú – O Catador de Histórias” e “Fluxus”. E os projetos para web feitos também na garra: “Uributrix” e “Blwarh”.

ANIMALAND: Ainda falta formação especializada na área? Quais são as áreas onde você sente uma maior carência no mercado?

MM: Temos uma carência muito grande na formação de novos profissionais, não só no Ceará. Mesmos tendo muitos cursos em todo o Brasil, ainda não são suficientes. Estamos produzindo muita animação em todos os Estados e os cursos ainda estão sendo criados para suprir esta carência. Acredito que vai acontecer a mesma coisa aqui no Ceará. Por aqui, eu acho que precisamos ter mais roteirista e produtores que entandam do processo de se fazer uma animação e a peculiaridade de cada técnica. Eu tenho 3 projetos que roteirizei e vou produzir. Os três são co-produção Corte Seco Filmes e Tusche Produções, e ainda estão em fase de captação. E, fui convidada para produzir outros projetos também.

ANIMALAND: E para quem quer iniciar nessa área? O que fazer?

MM: É estudar. Descobrir seu estilo e a técnica que queira trabalhar. Ver filmes, muitos, não só animação, principalmente para quem quer ser roteirista, assistir documentários, ficção, etc.

Para quem quiser conhecer mais, visite o site www.tusche.com.br. Vida longa aos trabalhos da Tusche e de Mariana e Telmo. Viva a animação no Ceará!