Y: O Último Homem Y: O Último Homem

Y: O Último Homem – Um futuro sombrio

Era de se imaginar que produções com temáticas de fim do mundo ganhassem ainda mais força durante a pandemia da Covid-19, mas chega a ser uma estranha coincidência que dois grandes serviços de streaming tenham lançado séries similares e inspiradas em quadrinhos em um curto período de tempo. Recentemente a Netflix liberou a primeira temporada de Sweet Tooth, baseada na HQ escrita e desenhada por Jeff Lemire. Agora é a vez do Star+ lançar Y: O Último Homem. Outra feliz coincidência entre elas: ambas foram publicadas pela Vertigo.

Criada por Brian K. Vaughan e Pia Guerra, Y: O Último Homem ganhou vida numa época em que o mundo passava por um período de incertezas, um ano após o 11 de setembro. Agora, sua versão em live action encontra o mesmo cenário. E não faltaram tentativas de adaptar o material original, seja para o cinema ou a TV. Quis o destino que isso ocorresse este ano, num momento em que começamos a alimentar algum tipo de esperança. No entanto, as páginas da história base não soam tão pessimistas quanto sua releitura para as telas. Existe um tom sombrio que permeia os três primeiros episódios, talvez como uma âncora de realidade.

A história é ambientada em um mundo onde um evento misterioso matou todos os mamíferos portadores do cromossomo Y, exceto Yorick Brown (Ben Schnetzer) e seu macaco Ampersand. Com as estruturas sociais entrando em colapso, eles precisam lutar para sobreviver. Como uma mistura de The Walking Dead e The Leftovers, a série usa da longa duração dos episódios para situar o espectador nessa nova realidade. O começo lento pode incomodar, mas é importante para desenvolver vínculos com as personagens e entender as tramas da temporada. E não se engane, existem muitas camadas nessa história.

As mudanças comandadas pela showrunner Eliza Clark parecem ampliar as discussões do material original, especialmente em questões de gênero e sexualidade. O melhor exemplo está na figura de Sam (Elliot Fletcher), um homem trans que sobreviveu ao terrível evento. O roteiro trata essa questão com uma delicadeza importante e deve entregar momentos emocionantes ao longo da temporada.

O elenco de Y: O Último Homem merece destaque. Ben Schnetzer diverte como o protagonista sem aspirações que, de repente, se torna a pessoa mais importante do mundo. Sua personalidade é irritante no começo, mas ele é um dos corações da trama. Diane Lane tem a missão de viver uma congressista democrata que, após anos lutando por respeito, precisa assumir o posto de presidente dos EUA. O início da série abre mão da ação para focar nas questões políticas e sociais desse mundo pós-apocalíptico. Mas é Ashley Romans, na pele da Agente 355, que entrega a personagem mais interessante até o momento. Carismática e enigmática, ela brilha até mais do que o personagem principal.

O design de produção é outro ponto positivo nesse início de jornada. A ação do tempo nos prédios e principalmente nos corpos espalhados pelas ruas torna tudo mais impressionante, especialmente se levarmos em conta que esse é um mundo muito próximo do nosso. Acompanhar Yorick e Ampersand pelas ruas causa uma mistura de melancolia e medo.

Após um longo tempo de expectativa, finalmente a adaptação de Y: O Último Homem está entre nós. Ainda que alguns núcleos careçam de desenvolvimento, a série começa de forma segura. Quem não aguenta mais nada que tenha alguma ligação como nosso atual momento, certamente deve investir tempo em outra coisa. Mas, quem busca uma ótima história, vai encontrar refúgio aqui.