Goste você ou não do resultado final, é inegável que “Game of Thrones” deixou um legado na cultura pop. Toda série de fantasia com um grande investimento sofrerá com as comparações ao estrondoso sucesso da HBO. Foi assim com “Anéis de Poder” e também com “Casa do Dragão” (essa por motivos óbvios). Logo é inevitável que “Xógum: A Gloriosa Saga do Japão”, minissérie que chegou recentemente ao Star+, não passe pelo mesmo filtro. Porém, encaixotar a produção nessa comparação não é muito justo e pode apagar as qualidades que encantam o espectador logo nos primeiros minutos.
Ambientada no Japão do século 17, “Xógum” é a segunda adaptação para TV do livro best-seller escrito por James Clavell. Para situar o leitor, a primeira versão, lançada nos anos 1980 ganhou três Emmys na época. O principal trunfo da minissérie consiste em respeitar a base histórica de um período marcado por fortes tensões políticas e expansão territorial de grandes potências. Esse jogo de intrigas e ambição mantém o público interessado no desdobramento dos episódios, mesmo sem a presença de elementos fantásticos como dragões e zumbis. Além disso, é claro, do visual estonteante e do trabalho impecável de reconstrução da época, com dedicação aos mínimos detalhes.
Em “Xógum”, conhecemos o piloto inglês protestante Jack Blacktorne (Cosmo Jarvis) que saiu da Europa com a missão de conquistar o país oriental e assim minar o poderio bélico e econômico de Portugal, que se utilizou do cristianismo como ferramenta para estreitar laços com os japoneses. Para azar de Jack, seus recursos acabam e ele chega ao Japão no meio de uma intensa crise política. Do outro lado da moeda está Yoshii Toranaga (Hiroyuki Sanada), um famoso líder militar que agora precisa lutar para salvar sua família e aliados dos planos de seus inimigos. Blacktorne e Toranaga ainda não sabem, mas seus destinos estão entrelaçados.
Claro que tantos detalhes históricos podem bagunçar a cabeça do espectador, principalmente por “Xógum” se situar em um período bastante específico. Mas os showrunners Rachel Kondo e Justin Marks desenvolvem a trama com paciência, sem a pressa de entregar todas as informações cruciais logo de início. Assim o público descobre junto dos personagens os próximos passos de um conflito eminente e de escalas potencialmente grandiosas.
Curiosamente, pelo escopo da produção, os episódios lançados até o momento não contam com grandes cenas de ação. Mas isso não se faz necessário justamente pela qualidade da trama. Existe espaço para discussões sobre honra, preconceito, fé e a maneira como por muito tempo a religião foi utilizada apenas como um viés de enriquecimento para as pessoas envolvidas. Nem tudo é tão sutil, com um texto expositivo em determinados momentos. Talvez o principal ponto de incômodo surja na hora em que os personagens precisam falar português e acabam conversando em inglês. Um detalhe que causa estranheza, mas que logo se perde no meio de tantas outras qualidades..
Julgando apenas pelos episódios iniciais, “Xógum: A Gloriosa Saga do Japão” desponta como a principal atração dos streamings desse início de ano e uma forte concorrente para a temporada de prêmios. O único lamento é que teremos apenas 10 episódios para acompanhar.