Lançado em 22 de agosto de 2025 na Netflix, o filme turco Um Homem Abandonado (Metruk Adam), dirigido por Çagri Vila Lostuvali e produzido pela OGM Pictures, acompanha a trajetória de Baran (Mert Ramazan Demir), um homem que busca reconstruir sua vida após passar 15 anos na prisão por um crime que não cometeu. Com um enredo marcado por dilemas familiares, ressentimentos e tentativas de redenção, a narrativa explora como segredos do passado moldam o presente e questiona até que ponto é possível recomeçar. Leia nossa crítica.
A prisão, a culpa e o peso do passado em Um Homem Abandonado
O ponto de partida do filme é a infância de Baran, quando, aos 15 anos, ele é obrigado pelo pai a assumir a culpa por um atropelamento cometido por seu irmão mais velho, Fatih. A justificativa era que, por ser menor de idade, ele enfrentaria uma pena mais branda. No entanto, o plano falha: durante o período na prisão, Baran se envolve em conflitos violentos para se proteger e acaba tendo sua pena estendida para quase quinze anos.
Quando sai em liberdade, encontra uma realidade completamente diferente. Seus pais estão mortos, Fatih constituiu família e tem uma filha, Lidya (Ada Erma). Baran, por sua vez, retorna sem dinheiro, sem lar e sem perspectiva profissional, carregando uma sensação de traição que nunca foi resolvida.
O acidente que muda tudo
O reencontro com Fatih ocorre em meio a novas tragédias. Um acidente de carro mata a esposa de Fatih, Arzu, e o deixa em coma, deixando Lidya sob os cuidados temporários de Baran. A relação entre tio e sobrinha, inicialmente distante, passa a ocupar o centro emocional da narrativa.
Essa convivência forçada funciona como catalisador para o amadurecimento do protagonista. Ao mesmo tempo, o filme insere outros conflitos, como as dificuldades financeiras de Baran, o preconceito por ser ex-presidiário e sua luta para encontrar um emprego, com o objetivo de abrir uma oficina mecânica — um sonho que funciona como símbolo de independência e reconstrução.

Relação entre Baran e Lidya
O elo entre Baran e Lidya é um dos pontos mais trabalhados no filme. A menina representa a infância que ele perdeu e, ao mesmo tempo, funciona como um motor para que ele busque estabilidade emocional e financeira. A interação entre os dois cresce de forma gradual, e a atuação de Ada Erma traz naturalidade à personagem, evitando excessos sentimentais.
No entanto, a narrativa utiliza Lidya também como recurso para gerar impacto emocional, recorrendo a cenas que buscam provocar comoção direta no espectador. Essa escolha divide opiniões, já que parte do público pode considerar a abordagem sensível, enquanto outros veem exagero na manipulação dos sentimentos.
Fragilidades do roteiro e soluções fáceis
Apesar do tema central forte, Um Homem Abandonado adota caminhos narrativos que fragilizam o realismo da trama. O exemplo mais evidente está no personagem Musa (Ahmet Mümtaz Taylan), dono de uma oficina que, inicialmente, nega trabalho a Baran. A mudança de postura do personagem ocorre de forma abrupta, resolvendo parte dos conflitos financeiros do protagonista de maneira conveniente.
Além disso, o filme insere subtramas que não são desenvolvidas com profundidade. O suposto desejo de Baran em abrir uma oficina, por exemplo, carece de elementos que demonstrem sua real relação com os carros e seu conhecimento técnico. O enredo afirma sua paixão pela mecânica, mas não dedica tempo suficiente para mostrar esse aspecto em tela.
Temas centrais: culpa, perdão e reconstrução
O longa levanta discussões sobre traição familiar, responsabilidade coletiva e ressignificação do passado. A figura do pai, que força Baran a assumir a culpa pelo acidente, funciona como símbolo de uma tradição que privilegia o filho mais velho em detrimento do mais novo, expondo as tensões entre dever e individualidade.
Ao mesmo tempo, a relação de Baran com Fatih e Lidya traz à tona dilemas sobre perdão e aceitação. Enquanto Fatih permanece ausente por boa parte da narrativa, o vínculo com Lidya ajuda o protagonista a redefinir sua identidade e encontrar um propósito após anos de injustiça.
O final explicado de Um Homem Abandonado (2025)
Na reta final, Baran consegue abrir sua própria oficina mecânica, consolidando a independência financeira que buscava. A saúde de Fatih melhora, e ele recebe alta do hospital, retomando a guarda de Lidya.
A despedida entre tio e sobrinha marca um ponto de virada para Baran. Embora o momento seja doloroso, o filme sugere que o tempo vivido com a menina permitiu que ele desenvolvesse novas perspectivas sobre responsabilidade, afeto e resiliência. Apesar disso, a reconciliação entre os irmãos é abordada de forma superficial. Um salto temporal de seis meses apresenta os dois juntos em uma refeição familiar, sem mostrar o processo de enfrentamento dos ressentimentos acumulados ao longo dos anos.
Essa escolha narrativa cria um final ambíguo: o espectador acompanha a superação parcial de Baran, mas não encontra respostas completas sobre como ele lida com a relação com Fatih.
Crítica: Um Homem Abandonado é bom?
Um Homem Abandonado (Metruk Adam, 2025) entrega uma narrativa focada na reconstrução pessoal após uma longa sequência de perdas e injustiças. Ao mesmo tempo, apresenta limitações no desenvolvimento de personagens secundários e na condução de subtramas, além de apostar em soluções simplificadas para conflitos complexos.
O filme está disponível exclusivamente na Netflix e busca dialogar com temas universais como perdão, família e segundas chances, mesmo que nem sempre explore todo o potencial dessas reflexões.