Existe um sentimento curioso sobre os finais de séries. Alguns fãs esperam que todos os mistérios sejam resolvidos, enquanto outros desejam que os personagens tenham um desfecho digno. Porém, todos compartilham o mesmo anseio: que o tempo e o esforço dedicados ao programa tenham valido a pena no final. Podemos citar como exemplo o episódio final de Lost ou a última temporada de Game of Thrones. Mesmo que The Umbrella Academy nunca tenha sido espetacular ao longo de suas temporadas, a série conseguiu envolver o público nos dramas existenciais de seus personagens disfuncionais. Por isso, é tão frustrante que o desfecho tenha jogado todo esse desenvolvimento pela janela de um metrô que viaja entre linhas temporais.
Não me entendam mal, nenhuma obra de arte tem a obrigação de oferecer respostas fáceis ou de satisfazer os desejos do público. Parte do charme do entretenimento reside justamente em sua subjetividade. No entanto, ao abandonar o desenvolvimento dos personagens e criar novas dinâmicas sem fundamento, o último ato de “The Umbrella Academy” se torna anticlimático, evidenciando sua falta de propósito. Usando o já desgastado artifício do multiverso e de linhas temporais alternativas, a produção não ousa em seu desfecho. E, pior, acaba desfigurando a principal qualidade do show: a relação entre os irmãos Hargreeves.
Seis anos após os eventos da terceira temporada (leia a crítica), os irmãos vivem em uma nova realidade. Separados e sem poderes, cada um precisa lidar com os próprios dramas de uma vida comum. Casamento, filhos, relacionamentos fracassados e trabalhos sem glamour. Porém, quando os Guardiões, uma estranha organização liderada por Gene (Nick Offerman) e Jean (Megan Mullally), ameaçam destruir o mundo novamente, Viktor (Elliot Page), Luther (Tom Hopper), Alisson (Emmy Raver-Lampman), Klaus (Robert Sheehan), Ben (Justin H. Min), Cinco (Aidan Gallagher), Diego (David Castañeda) e Lila (Ritu Arya) precisam deixar de lado traumas e intrigas para salvar o mundo. De novo.
Esse eterno jogo de destruir e salvar o universo faz parte da piada recorrente de “The Umbrella Academy”. Principalmente porque algum dos irmãos Hargreeves era sempre responsável pela anomalia destrutiva da vez. Mas isso não combina com o tom melancólico que a temporada deseja transmitir. Com apenas 6 episódios, era de se esperar um foco maior nas questões familiares, especialmente envolvendo Reginald Hargreeves (um subaproveitado Colm Feore). Mas, em vez de unir os personagens, o roteiro os dispersa em tramas paralelas que pouco contribuem para a narrativa geral. Mesmo demonstrando sinais de desgaste, a temporada anterior ainda trouxe eventos interessantes que foram completamente ignorados aqui.
Ao abrir mão da noção de continuidade, Steve Blackman e Jeremy Slater sacrificam aquele que sempre foi o coração da série: a interação entre os irmãos Hargreeves. Existe muito mais valor emocional vê-los trancados dentro de uma velha van numa espécie de road movie estranho do que lutando e massacrando soldados ou fanáticos de um culto. As doses cavalares de violência parecem uma tentativa de mascarar os grandes defeitos da temporada – “The Boys” é craque nisso. Isso se reflete em interações que nunca foram estabelecidas de fato, como uma relação de dependência entre Alisson e Klaus. Viktor, Luther e Diego são deixados de lado por toda a temporada, com os dois últimos virando uma dupla de alívio cômico. Ainda pior é toda a questão envolvendo Cinco, Diego e Lila. Não é como se não houvesse outros rumos dramáticos a serem explorados, afinal não faltou drama familiar nos anos anteriores.
A redução orçamentária também é visível, com um design de produção extremamente simples. Os cenários são pouco criativos e o CGI para um monstro em específico é completamente grosseiro. Novamente, a série não ficou conhecida por conta dos seus efeitos práticos e visuais, mas aqui a Netflix claramente ofereceu o mínimo disponível, tornando a ideia de mais um apocalipse desconexa com a realidade.
“The Umbrella Academy” nunca foi sobre super-heróis salvando o universo. O verdadeiro charme da série estava em acompanhar uma família de desajustados que, curiosamente, possuíam superpoderes e precisavam salvar a si mesmos antes de pensar em impedir o apocalipse. Infelizmente, em seu último suspiro, a série parece ter esquecido sua principal lição. No último jantar em família dos irmãos Hargreeves, a comida tinha um gosto amargo.