Star Trek: Sem Fronteiras e a celebração do poder da família

Terça-feira, 8 de setembro de 1966. Essa data marca a estreia da série clássica de Star Trek, um evento aparentemente simples mas que entraria para a história da cultura pop. Se alguém perguntasse para Gene Roddenberry – 50 anos atrás – o que ele esperava alcançar com sua criação, talvez recebesse uma resposta repleta de empolgação. Mas que não chegaria nem próxima de adivinhar o patamar que a produção alcançaria com o passar do tempo. Além de flertar com o sci-fi, com política, filosofia e o mais diversos aspectos da sociedade, Star Trek mostrou que uma família pode nascer nos mais variados ambientes. E ser composta por qualquer pessoa (e alien).

Apesar de todas as outras encarnações na TV e no cinema, esse conceito de família esteve intacto desde os anos 60. Não apenas nas tripulações, mas também nos fãs. Mesmo longe dos holofotes, os trekkers mantiveram a chama da criação de Gene acesa. J.J. Abrams entendeu essa mensagem essencial quando assumiu a cadeira de capitão dos novos filmes. Mesmo com algumas mudanças na abordagem, o que os novos e velhos fãs presenciaram foi o renascimento da família da Enterprise. E Star Trek: Sem Fronteiras celebra não apenas as 5 décadas da franquia, mas também o ápice desse conceito.

Na trama, a Enterprise está na metade da missão de 5 anos explorando o espaço. Os eventos dos filmes anteriores, somados as aventuras vividas durante esse tempo, transformaram a tripulação numa grande família. Não apenas os personagens principais, mas todos os presentes na nave. As cenas iniciais mostram isso de uma maneira natural. Mas a narração do Capitão Kirk evidencia um problema. Tanto tempo no espaço, fazendo basicamente as mesmas coisas, acabou se transformando em uma rotina. De uma forma ou de outra, a motivação não é a mesma do início da viagem. Com o agravante da saudade dos que ficaram para trás. Kirk encontra-se nesse dilema existencial. Se o espaço é infinito, o que eles esperam alcançar?

Spock também tem seu próprio dilema. O sentimento de que precisa fazer mais pelo seu povo, sua relação cada vez mais intensa com Uhura e sua amizade com Kirk. Tudo isso forma um turbilhão de emoções. Emoção essa que está presente no reencontro de Sulu com sua família. Uma cena rápida e simples, mas cercada de beleza e significado. Vamos compreendendo mais da dinâmica daquela família, de forma natural. E isso é o que faz de Star Trek: Sem Fronteiras um grande filme.

Claro que a pegada mais moderna que a franquia assumiu exige doses de ação. J.J. Abrams não retornou para o cargo de diretor, ficando apenas como produtor. Justin Lin foi chamado para a função, o que fez o público torcer o nariz. Mas ele mostrou que era o cara certo para a missão. Esqueça aquele papo de “Velozes e Furiosos no espaço”, apesar de Lin trazer algo característico da franquia de Vin Diesel e seus amigos para esse filme: o conceito de família. Isso casou perfeitamente com o roteiro escrito por Simon Pegg (ou Scotty se preferir). A ideia de separar a tripulação em duplas acrescenta uma dinâmica excelente para a trama. E mostra mais de relações que não possuem tanto destaque normalmente, como Kirk/Chekov, Sulu/Uhura e a hilária parceria entre Spock e o Dr. McCoy.

Também existe espaço para novos membros nessa família, como Jaylah (Sofia Boutella). O ponto negativo acaba sendo o vilão Krall, vivido por Idris Elba. Não que ele seja o pior antagonista da franquia, mas o foco nas relações dos personagens principais acabou tirando o brilho de seu plano. Uma pena, já que ele também possui motivações fortes. Mas ainda assim é possível entender que tudo gira em torno de sentimentos. Amor, ódio, raiva, tristeza, solidão e etc. Seja no espaço, em uma nave gigante ou aqui no nosso planeta azul, os sentimentos guiam nossas ações.

Star Trek: Sem Fronteiras é a celebração definitiva do que Gene Roddenberry criou lá em 1966. É como aquele jantar de domingo com a família, que sempre rende grandes momentos. Além disso, é também uma carta de amor à vida. A bela homenagem para Leonard Nimoy mostra que, por mais que nossos corpos não estejam mais aqui, nosso legado estará sempre vivo naqueles que amamos. Esse legado que foi carregado com orgulho por Chris Pine, Zachary Quinto, Zoe Saldana, Karl Urban, Anton Yelchin e por todos aqueles que passaram pelos novos filmes. Que venham mais 50 anos de Star Trek.

Vida longa e próspera.