Tradição, trauma e o renascimento do terror psicológico
Após anos de expectativa e incertezas sobre o futuro da franquia, Silent Hill f marca o primeiro jogo inédito da série desde Downpour (2012). Desenvolvido pela NeoBards Entertainment e publicado pela Konami, o título foi lançado em 25 de setembro de 2025 para PlayStation 5, Xbox Series X|S e PC, trazendo um novo cenário e uma nova protagonista, mas sem abandonar as marcas registradas que fizeram de Silent Hill um ícone do survival horror. Confira a nossa análise crítica do jogo.
Ambientado no Japão da década de 1960, o jogo mergulha em tradições culturais, pressões sociais e no peso do trauma individual e coletivo, oferecendo uma experiência que mistura horror psicológico, combate estratégico e simbolismo. O resultado é um capítulo ousado, que pode dividir os fãs, mas reforça a relevância da franquia no gênero.
Silent Hill f tem uma protagonista marcada pelo passado
A história acompanha Hinako Shimizu, adolescente do interior que vive sob a rigidez de um lar autoritário e de uma sociedade que impõe padrões de gênero inescapáveis. Após uma briga familiar, ela foge de casa apenas para encontrar sua cidade, Ebisugaoka, coberta por uma névoa sobrenatural e tomada por criaturas grotescas e flores carmesins em decomposição.
Ao contrário de protagonistas anteriores como James Sunderland ou Harry Mason, que chegaram a Silent Hill em busca de respostas específicas, Hinako vê o espaço familiar se transformar em algo hostil e irreconhecível. Esse estranhamento guia a narrativa, escrita por Ryukishi07, autor da série de visual novels When They Cry. A trama combina horror sobrenatural com temas sociais, explorando a posição da mulher no pós-guerra japonês, as pressões familiares e o desejo de romper com tradições sufocantes.
Estrutura narrativa e múltiplos finais
O enredo alterna entre a cidade enevoada de Ebisugaoka e o Santuário Sombrio, um “outro mundo” de templos e rituais distorcidos. Embora essas transições reforcem a atmosfera perturbadora, em alguns momentos o recurso se torna previsível, com desmaios de Hinako funcionando mais como gatilhos mecânicos do que como viradas narrativas.
Um dos pontos fortes do jogo está em sua rejogabilidade. Silent Hill f conta com cinco finais diferentes, acessíveis por meio de escolhas, exploração e pelo sistema New Game+. Notas, registros e fragmentos de história espalhados pelos cenários acrescentam camadas à trama, incentivando o jogador a revisitar a campanha de 9 a 12 horas para compreender plenamente o destino da protagonista.
Combate e gerenciamento de recursos em Silent Hill f
O combate é um dos elementos que mais dividiram opiniões antes do lançamento. Ao contrário da sensação de vulnerabilidade dos títulos originais, Silent Hill f aposta em ação corpo a corpo, com armas como facas, machados e tacos de beisebol, todas sujeitas à degradação. A gestão da durabilidade, somada à resistência física e à sanidade mental de Hinako, torna cada encontro estratégico.
O sistema de sanidade é particularmente interessante: quanto mais a personagem perde o controle, mais vulnerável se torna aos inimigos, refletindo a fragilidade psicológica que atravessa toda a narrativa. Além disso, os santuários Hokora oferecem escolhas cruciais: sacrificar itens de sobrevivência imediata para obter melhorias permanentes ou manter os recursos para o curto prazo. Esse equilíbrio de risco e recompensa reforça a tensão constante.
Apesar da profundidade, o combate apresenta falhas técnicas. Esquivas podem ser imprecisas e as lutas contra múltiplos inimigos em espaços reduzidos geram frustração. Ainda assim, a sensação de lutar pela sobrevivência, com ataques pesados e armas improvisadas, mantém o espírito de vulnerabilidade que caracteriza a franquia.
Atmosfera visual e sonora do jogo de terror
A ambientação é um dos maiores triunfos do jogo. Desenvolvido na Unreal Engine 5, Silent Hill f recria a atmosfera sufocante da franquia com um toque único: flores vermelhas e carne em decomposição dominam ruas, casas e templos, criando imagens belas e repulsivas ao mesmo tempo.
Os modelos de personagens são detalhados, transmitindo emoções sutis em expressões faciais e olhares perdidos. Embora o desempenho apresente quedas de taxa de quadros em cenários mais pesados, a direção artística compensa essas falhas técnicas, entregando uma experiência visual marcante.
Na trilha sonora, Akira Yamaoka retorna com composições que mesclam instrumentos tradicionais japoneses e a sonoridade industrial característica da série. O resultado é uma atmosfera sonora que ecoa tanto a novidade quanto a familiaridade, reforçada por um design de som imersivo em que até o silêncio é parte fundamental do terror.
Crítica: Silent Hill f vai além de uma continuação da franquia de jogos de terror
Silent Hill f não é apenas uma continuação da franquia, mas uma reinvenção que transporta seus temas centrais para outro tempo e espaço. O jogo combina tradição e inovação, explorando questões sociais e psicológicas com a intensidade que caracteriza os melhores momentos da série.
Embora apresente problemas de ritmo narrativo, falhas técnicas e um combate que pode não agradar a todos, sua ambição estética e temática faz dele um marco no retorno de Silent Hill. Hinako Shimizu surge como uma protagonista complexa, cuja luta contra as pressões externas e internas reflete a essência do terror psicológico.
Para fãs antigos, pode ser uma experiência diferente do esperado; para novatos, pode soar desafiadora. Mas, para quem estiver disposto a enfrentar a névoa, Silent Hill f oferece uma das experiências mais instigantes do survival horror nos últimos anos.