A estreia de Aziz Ansari na direção de longas-metragens, Quando o Céu Se Engana (Good Fortune), chega aos cinemas como uma comédia de tons espirituais e sociais, estrelada por Keanu Reeves, Seth Rogen e o próprio Ansari. Misturando elementos de A Felicidade Não Se Compra e Asas do Desejo, o filme tenta discutir a desigualdade econômica contemporânea com humor e leveza, ainda que nem sempre encontre o equilíbrio entre crítica e fantasia. Confira a nossa crítica:
A trama de Quando o Céu Se Engana
Aziz Ansari interpreta Arj, um trabalhador de Los Angeles que sobrevive de bicos e mora em seu carro, símbolo da precarização dos empregos modernos. Entre entregas de comida e tarefas para aplicativos, ele conhece Elena (Keke Palmer), funcionária de uma loja de departamentos que tenta sindicalizar os colegas. A relação entre os dois nasce em meio à luta por dignidade, mas é atravessada pelas dificuldades financeiras de Arj.
O destino do protagonista muda quando ele cruza o caminho de Jeff (Seth Rogen), um investidor de tecnologia rico e superficial. Após um breve emprego como assistente, Arj é demitido por um motivo banal — e sua vida parece desmoronar. É então que surge Gabriel (Keanu Reeves), um anjo que protege motoristas distraídos e começa a se preocupar com o rumo do humano desesperado. Movido por empatia e curiosidade, Gabriel decide interferir, dando início a uma série de trocas de papéis e lições sobre valor, propósito e desigualdade.
Keanu Reeves e o anjo fora de lugar
O personagem de Reeves é o coração do filme. Gabriel é um anjo de baixa patente que inveja os colegas com missões mais nobres, até se envolver demais na vida de Arj e acabar punido com uma temporada como humano. A transformação do celestial em mortal rende alguns dos momentos mais engraçados da comédia — especialmente quando o ex-anjo descobre prazeres e vícios mundanos, como fast food e cigarros.
A atuação de Reeves é central para o funcionamento da narrativa: sua presença transmite inocência e carisma, fazendo do anjo um contraponto sincero às ambições humanas de Arj e Jeff. Mesmo quando o roteiro se apressa para encerrar o arco, Reeves mantém a coesão emocional do filme e se torna a principal razão para assisti-lo.
Aziz Ansari entre humor e comentário social
Como roteirista e diretor, Aziz Ansari tenta revisitar a comédia clássica com um olhar contemporâneo, tratando de temas como desigualdade, alienação e propósito. A ambientação em Los Angeles, onde ricos e pobres convivem de forma desigual e simbiótica, reforça a mensagem central: a distância entre os que têm e os que lutam para ter.
No entanto, Quando o Céu Se Engana oscila entre a sátira e o sentimentalismo. Há bons momentos de humor, especialmente nas interações entre Arj e Jeff, mas a crítica social acaba diluída em conclusões simplistas. O filme reconhece os efeitos da economia de aplicativos e da precarização do trabalho, mas evita mergulhar profundamente nas causas.

O olhar de Keanu Reeves sobre humanidade e empatia
Embora as ideias de Ansari nem sempre se sustentem, há empatia genuína no desenvolvimento de Quando o Céu Se Engana. A trajetória de Gabriel, que aprende o valor do trabalho e da experiência humana ao perder sua natureza celestial, reflete a busca de todos os personagens por significado. A metáfora é clara: compreender o outro é a única forma de aproximar mundos que se afastaram.
O resultado é uma comédia irregular, mas com alma. Ansari combina sua visão cômica — herdada de Parks and Recreation e Master of None — com uma fábula sobre propósito e desigualdade. Se o roteiro não chega às alturas que almeja, o elenco, especialmente Keanu Reeves, sustenta o filme com carisma e humanidade.
Crítica: vale à pena assistir ao filme Quando o Céu se Engana?
Quando o Céu Se Engana é uma comédia social com boas intenções, que reflete sobre privilégio e empatia por meio de um anjo curioso e um homem comum em crise. Aziz Ansari entrega um primeiro longa cheio de ideias, ainda que irregular na execução. No fim, é Keanu Reeves quem faz o céu descer à Terra — lembrando que, mesmo nas histórias mais improváveis, a bondade continua sendo um dos temas mais humanos do cinema.