Se você não viveu numa bolha nos últimos 9 anos, certamente ouviu falar da grande crise financeira dos EUA em 2008. Até já viu algum filme, documentário ou leu sobre o assunto. Talvez não entenda por completo tudo que rolou, mas sabe que as coisas ficaram bem feias e ainda continuam assim. A Qualquer Custo (Hell or High Water no original) é um retrato cruel e preciso do cenário americano pós-crise. Esqueça as falsas aparências, aqui somos jogados no centro do furacão.
Acompanhamos os irmãos Tobye (Chris Pine) e Tanner (Ben Foster), que na tentativa de salvar o rancho de sua mãe, assaltam bancos para juntar dinheiro e quitar uma dívida considerável. Aqui eles são os opostos que se completam. Tanner já viveu o inferno da cadeia, é incontrolável, impulsivo e perigoso. Já Tobye é o ponto de equilíbrio, bem mais calmo que o irmão. E o por isso formam a dupla perfeita para executar o plano.
Acontece que logo eles entram no radar do Patrulheiro Marcus (Jeff Bridges), que escolheu os irmãos como última missão antes da aposentadoria. Ao lado do parceiro Alberto (Gil Birmingham), ele pretende acabar com a festa. Utilizando de pontos de vista distintos, A Qualquer Custo constrói seu clima tenso, com um ritmo bem cadenciado, aproveitando todas as oportunidades para explorar seus personagens.
Os cenários áridos do Texas fornecem a perspectiva de um faroeste moderno, lembrando em certos pontos o clássico Onde Os Fracos Não Têm Vez. Desse modo, A Qualquer Custo não tem vergonha de assimilar elementos do passado e moldá-los de acordo com a nova realidade. Isso é essencial para construir os aspectos motivacionais de Tobye e Tanner, preenchendo a obra com tons de cinza. Nem sempre o verdadeiro bandido é quem está armado.
Marcus e Alberto são tão opostos quanto Tobye e Tanner. Com uma relação repleta de insultos raciais, todos partindo de Marcus, a dupla também serve como um exemplo da mensagem que o filme pretende passar. Em determinada cena, Alberto (que é metade mexicano, metade nativo-americano) comenta que aquelas terras, agora assaltadas por homens brancos, haviam sido roubadas de seus ancestrais. Justamente por homens brancos. É o ciclo da vida.
O incrível roteiro de Taylor Sheridan (que havia mostrado seu talento em Sicario) trabalha com maestria os dois lados dessa moeda. É possível entender as motivações de todos os envolvidos na história, entrando nos tons de cinza já mencionados. A direção do escocês David Mackenzie é crucial para o sucesso de A Qualquer Custo, conduzindo de forma natural todos os elementos do filme.
As atuações não ficam atrás. Chris Pine e Ben Foster estão impressionantes, com momentos intimistas e viscerais. Jeff Bridges, apesar de ter participado de algumas bombas ultimamente, esbanja talento. Você vai conseguir identificar as cenas que lhe renderam a indicação ao Oscar desse ano. Aliás, impossível não ficar tenso no último diálogo entre Chris e Jeff.
A Qualquer Custo não esconde sua mensagem política, entregando ao espectador a verdadeira face do tal sonho americano. Mas não é apenas por isso que se torna um grande filme. Essa é só mais uma das camadas que podemos extrair. É assim que o bom cinema funciona.