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Parasita: a ironia cruel da luta de classes | Crítica

A cultura coreana tem se tornado cada vez mais presente no Ocidente, seja através da música, com inúmeras boy e girl bands de destaque, ou do cinema, que vem conquistando amplo reconhecimento internacional. Um exemplo marcante para o cinema é Train to Busan (Invasão Zumbi, 2016), dirigido por Yeon Sang-ho, um dos sucessos recentes do cinema sul-coreano. No entanto, poucos filmes capturaram tão bem as tensões sociais contemporâneas quanto Parasita (2019), novo filme dirigido e roteirizado por Bong Joon-ho (Okja, O Expresso do Amanhã).

A obra traz uma análise contundente sobre as disparidades socioeconômicas, abordando como diferentes classes se sustentam — ou, mais precisamente, se parasitam — dentro do sistema capitalista. Como o próprio diretor já declarou em entrevistas, o filme é uma crítica direta a essa estrutura desigual.

A família Kim.

A trama gira em torno de dois núcleos familiares contrastantes. De um lado, temos os Kim, uma família de classe baixa que sobrevive de subempregos e mora em um porão apertado e insalubre. Do outro, os Park, que vivem confortavelmente em uma luxuosa mansão, desfrutando de todos os privilégios da riqueza.

O ponto de virada acontece quando Kim Ki-woo, o filho mais velho da família pobre, consegue um emprego como tutor particular da filha dos Park. Ao entrar nesse universo tão diferente do seu, ele vê a oportunidade de ascensão social — um plano que logo envolve toda a sua família.

O filme desmonta a ilusão do “sonho da mobilidade social”, mostrando como a pobreza e a riqueza se interligam em uma relação de dependência brutal. Os Kim precisam dos Park para sobreviver, mas os Park também precisam dos Kim para manter seu estilo de vida. Essa relação simbiótica, que oscila entre o necessário e o exploratório, é a grande ironia do título do filme.

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Os irmãos Kim Ki-jung e Kim Ki-woo.

A mistura de gêneros é um dos pontos fortes de Parasita. O filme transita com fluidez entre o humor ácido, o suspense e o drama, conduzindo o espectador de momentos cômicos para situações cada vez mais tensas. O contraste entre as ambições da família Kim e a ingenuidade dos Park gera cenas de humor afiado, mas que escondem uma crítica cruel. Aos poucos, a narrativa se encaminha para um desfecho trágico e inevitável.

De forma descomplicada, o filme tem uma ótima narrativa, o que me deixou à vontade para querer saber mais sobre o futuro daquelas famílias. Os diálogos são ótimos, e mostram as emoções dos personagens, deixando-os mais críveis com o que desejam. Eu me importei com o destino daquelas pessoas.

A direção de Bong Joon-ho é impecável ao destacar os personagens dentro dos espaços que ocupam. A casa dos Park é iluminada, espaçosa e ordenada, enquanto o porão dos Kim é claustrofóbico, escuro e caótico. A composição visual não apenas separa essas realidades, mas também sugere suas interações, como a forma sutil com que a câmera explora os deslocamentos sociais.

A fotografia e o design de produção são elementos essenciais para a narrativa, ajudando a construir a atmosfera e reforçar as diferenças entre as classes sociais. Cada detalhe no cenário contribui para contar a história, transformando os espaços em metáforas visuais para os temas do filme.

Talvez o final seja insosso para alguns, ou este possa trazer uma sensação mista de sentimentos. É um soco atrás do outro e o que fica nas entrelinhas é algo que ficou na minha mente. É genial como esse filme chega ao fim nos lembrando sobre como a nossa sociedade é parasitária. Parasita é único, e não é apenas um dos melhores filmes da década, mas também um marco no cinema mundial. Sua crítica social é incisiva, mas nunca didática. Ele não aponta heróis ou vilões, apenas um sistema que se retroalimenta de desigualdade.

Vale ressaltar que este filme foi vencedor da premiação “Palma de Ouro” no Festival de Cannes 2019 e do “Prêmio do Público” na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, além de ter sido selecionado pela Coreia do Sul para concorrer a uma indicação na categoria de “Melhor Filme Estrangeiro” no Oscar 2020.

Com um roteiro brilhante, atuações excepcionais e uma direção precisa, Parasita se tornou um clássico moderno, um lembrete de que a luta de classes não é um conceito do passado, mas uma realidade brutal do presente.