Poucas coisas tiram o sono de um otaku como a possibilidade de seu anime favorito ganhar uma versão em live-action. Afinal, a dificuldade de traduzir a peculiaridade das animações japonesas para as telas do cinema ou da TV parece uma barreira impossível de ser vencida. O que acaba resultando em produções como o famigerado Death Note da Netflix. Pense, então, em como os fãs de One Piece reagiram quando essa mesma empresa anunciou uma série sobre Luffy e seu bando do Chapéu de Palha. Quer você goste ou não, One Piece: A Série é uma realidade e está muito melhor do que os apreensivos adeptos poderiam imaginar. Será essa a cura para a maldição dos animes em live-action?
Como contei algumas semanas atrás, sou um iniciante nesse universo. Assisti os episódios que correspondem ao arco de East Blue, o mesmo que a série adapta, para ter uma noção melhor do que torna o anime One Piece tão amado. E mesmo com pouca vivência é possível identificar as diferenças entre as duas versões da criação máxima de Eiichiro Oda. Analisando apenas o primeiro episódio aqui, as mudanças da série são muito mais benéficas para a missão de condensar tantos episódios e tramas em apenas oito capítulos. O ritmo é mais ágil na série do que no anime. Alguns acontecimentos são alterados para facilitar o andamento do roteiro, assim como a interação entre os personagens principais é mais fluída.
Além das questões da narrativa, o que mais preocupava sobre a série era como captar o humor e estilo mais colorido tão característico do mangá e do anime. Matt Owens e Steven Maeda, certamente com supervisão ferrenha de Oda, conseguem contornar esse obstáculo com maestria. O material de divulgação já dava indícios, mas a série é cheia de vida em seus cenários e figurinos. A caracterização dos personagens contribui para uma criação de mundo convincente. Um homem que estica, outro que possui um machado no lugar da mão, caracóis que viram telefones. Tudo absurdamente possível dentro desse universo tão particular, algo que deve cativar até mesmo quem não possui contato com o material base.
Mas One Piece não funcionaria em nenhuma mídia sem o carisma de seus personagens. O queridinho das adaptações de animes Mackenyu encontra o tom certo para Roronoa Zoro, mantendo sua personalidade forte e aura misteriosa. Já Emily Rudd cativa como a sagaz e charmosa Nami. Curioso notar que boa parte do início da história gira em torno dela. Ainda não vi Taz Skylar como Sanji e Jacob Romero como Usopp, mas não é difícil imaginar que estão bem em cena. Mas é Iñaki Godoy que rouba a cena. Como disse em outro texto, Luffy é essencial para fisgar o público e isso não seria diferente aqui. Pode não parecer de início, mas esse é um protagonista complexo e Godoy encontra a maneira perfeita de traduzir seu carisma apaixonante.
A mistura de efeitos especiais e práticos é surpreendentemente boa. Claro, algumas cenas noturnas ajudam a esconder as falhas, mas esse departamento não compromete quando é exigido. As cenas de luta também são fluídas e criativas, tendo Zoro como o mais beneficiado. Porém, com tantos elementos cruciais a serem trabalhados, o texto parece lidar de maneira mais desleixada com temas essenciais da criação de Oda, como diferença de classe, opressão e racismo. Algo que pode se agravar no decorrer da temporada.
De todo modo, One Piece: A Série parece afastar completamente os receios dos fãs e entrega uma adaptação que respeita o material base ao mesmo tempo que encontra seu próprio tom. Assim como aconteceu com o anime, me sinto empolgado em viajar novamente com o Bando do Chapéu de Palha.