Neste Opinanerd, o escritor e roteirista Enéias Tavares conduz o leitor pelo galeão que a DarkSide Books acaba de lançar ao mar tormentoso do mercado editorial brasileiro: O 1º Prêmio Machado, premiação que contemplará cinco projetos com R$ 20.000,00 cada e publicação. O que esperar desse audacioso empreendimento na cultura do nosso país?
Em tempos de crise econômica e sanitária, o mercado editorial não vive seus melhores dias. Fechamentos de lojas e dificuldades financeiras de grandes redes vêm por anos minando a confiança de muitas editoras e inviabilizando investimentos em novos títulos, gêneros ou formatos. Para acadêmicos que estudam o campo cultural, para profissionais que vivem dele e para escritores e criadores que batalham em novas frentes midiáticas, esse cenário tem se mostrado cada vez mais desafiador.
Uma editora, contudo, tem navegado nessas águas turbulentas com singular habilidade, nunca deixando de checar os ventos das novas tendências e de empreender novas experiências de leitura e apreciação do objeto livro. Desde seu surgimento, em outubro de 2012, a DarkSide Books – nascida da agência Retina78, criada por Chico de Assis e Christiano Menezes – tem lançado edições inovadoras, com qualidade editorial e gráfica que não raro tem reapresentado clássicos do terror e da fantasia de uma forma lúdica e atraente a uma nova geração de leitores.
Em 2020, navegando contra a corrente – como um gótico galeão em meio a tempestades violentas e terríveis tufões –, a DarkSide surpreendeu o mercado e o público pelo anúncio do 1º Prêmio Machado, a melhor notícia que autores e leitores poderiam receber nesses meses sombrios de 2020. A amplitude almejada pela iniciativa é notável, contemplando “romances, coletâneas, quadrinhos, obras de não ficção, roteiros de projetos audiovisuais, podcasts, música, prosa, poesia, teatro, exposições virtuais, reportagens, ensaios, jogos, realidade aumentada e outras ideias inéditas.” Diante dessa variedade, o prêmio sem dúvida constitui uma ação digna de aplausos em três frentes.
Primeiro, por seu impacto emocional sobre uma cadeia inteira de profissionais fragilizada por notícias alarmantes e frequentes, em especial neste 2020 de fechamentos de livrarias, impossibilidades de eventos literários e suba crescentes dos custos de produção. Apesar disso, a ação demonstra a confiança dessa casa em um mercado que as notícias do meio tendem a relativizar, ainda mais em momentos de crise, além de motivar muitos profissionais que vivem e sobrevivem em nosso país.
Em segundo lugar, trata-se de uma notícia festiva para novos autores, além de criadores e pesquisadores que têm projetos guardados na gaveta. Um dos grandes desafios de novos escritores em qualquer época é ter seu original avaliado por uma grande editora. O prêmio Machado possibilita justamente isso, ofertando aos participantes uma oportunidade única de testar sua obra e – tão importante quanto – sua apresentação dela. Além do envio do manuscrito ou do projeto, o inscrito preenche um questionário em que terá a oportunidade de falar de si, de seu projeto, de seu processo criativo e do quanto ele dialoga com as linhas da editora.
Como a própria normativa do prêmio afirma, “novos nomes da literatura, dos quadrinhos e de todas as possibilidades artísticas que brotam das palavras surgem em um momento de transformação.” Em um mercado repleto de talentos mas por vezes carente de experiência profissional, o prêmio compreende uma chance valiosa para novos criadores investirem em seus portfólios, projetos e discursos de apresentação.
Por fim, a iniciativa da DarkSide evidencia, pelo valor do prêmio em cada uma das categorias e pelas publicações resultantes, um grande investimento nos “próprios criadores e em suas criaturas”. A aposta sugere que, mesmo em tempos de crise, investir em cultura pode ser um bom negócio, talvez não pelo lucro imediato e sim pelo impacto que uma ação como essa pode ter hoje e no futuro, quiçá inspirando outras.
Ademais, a chamada do prêmio também se apresenta como um manifesto em favor das artes, das ideias e das histórias, convidando – para não dizermos “convocando” – artistas das mais variadas áreas a “gritar”, “criar”, “riscar antigos ideais” e “mudar o agora”. Investindo no “Poder das Palavras”, o 1º Prêmio Machado provoca à exploração de novas cartografias da imaginação. Para quem viveu até aqui sonhando com uma ocasião como essa, ela chegou, e contemplando cinco diferentes categorias.
As primeiras duas são mais “tradicionais” e contemplam o próprio catálogo da editora. Nelas, os participantes podem submeter “Romance e Contos” ou “Quadrinhos”. O investimento da DarkSide em autores brasileiros como Cesar Bravo e Wesley Rodrigues já demonstra o nível de valorização e respeito aos projetos de seus autores. Quanto à terceira categoria, “Obras de Não Ficção”, ela dialoga com professores e estudiosos, do meio acadêmico ou não, objetivando “livros reportagem, biografias, documentos históricos e pesquisas”.
“Outras Narrativas” abrange diferentes mídias, com destaque ao “audiovisual, podcasts, poesia, prosa, teatro, música, roteiros, exposições virtuais, reportagens, ensaios, jogos e outras ideias inéditas”. Por fim, a última categoria, “Desenvolvimento de Projeto”, premia um artista iniciante com um acompanhamento exclusivo para o desenvolvimento de uma boa ideia que ainda carece de lapidação. Além dessas cinco categorias, o prêmio oferecerá Menção Honrosa a trinta (30) influenciadores literários que usam canais como blogs e podcasts, além do YouTube, para energizar o mercado com debates, críticas e divulgações de lançamentos, projetos e ações.
Aos que quiserem mais detalhes, acessem a normativa do Prêmio ou o Regulamento Completo. Como dica de um escritor que deve sua carreira literária a um prêmio literário semelhante, aconselho aos interessados que entrem na página do prêmio com antecedência e façam uma pré-inscrição, para poderem conferir os campos do formulário que precisam preencher. Prevejo que, pelo número de concorrentes, esses campos de apresentação das propostas serão fundamentais aos avaliadores. Portanto, não deixe isso para o último dia, neste caso, dia 29 de setembro.
Por fim, deixo aqui meu profundo agradecimento a DarkSide por esta iniciativa corajosa, audaciosa e inspiradora. Para um leitor de seu catálogo e um admirador de seu cuidado com o conteúdo, design e qualidade de suas publicações, ver tal investimento em nosso mercado serve de alento e de fomento a continuarmos batalhando pela cultura, pela arte e pela literatura em nosso país.
Em meio à pandemia de Covid-19, as histórias e as palavras continuam nos motivando e nos fortalecendo. Findo esse texto citando os idealizadores do Prêmio:
“Em um momento tão delicado do nosso país, a Arte precisa ganhar o seu protagonismo e ser uma ferramenta de luta e acolhimento. O prêmio é uma forma de mostrar que, mesmo no silêncio e no distanciamento desta quarentena, estamos juntos, prontos para ouvir e sonhar com cada mente que busca o conhecimento, o novo olhar e a transformação.”
A meu ver, não haveriam palavras mais apropriadas a este setembro de 2020. Assim, aos que participarão do 1º Prêmio Machado DarkSide, boa sorte e bons sonhos, ou então – dado o contexto desta casa editorial e de suas publicações – bons pesadelos!
Enéias Tavares é professor de literatura clássica na UFSM, pesquisador dos livros iluminados de William Blake e colunista do CosmoNerd, além de escritor e roteirista. Criador de Brasiliana Steampunk e A Todo Vapor!, duas séries transmídia que envolvem livros, quadrinhos, jogos e série audiovisual, ele adorou cada categoria do Prêmio Machado e não vê a hora de aumentar sua biblioteca DarkSide com as cinco obras vencedoras e seus monstruosos criadores!