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O Poço (Netflix) | Crítica

Dirigido por Galder Gaztelu-Urrutia e roteirizado por David Desola e Pedro Rivero, ‘O Poço’ (El Hoyo) é o primeiro longa-metragem do diretor, um suspense espanhol claustrofóbico que chegou a plataforma de streaming, Netflix, após ter seus direitos de redistribuição comprados pela empresa. A obra foi muito bem recebida pela crítica quando exibida pela primeira vez no festival de Toronto, e também pelo público por ser uma metáfora inteligente e criativa sobre desigualdade social.

A premissa da história se passa em uma prisão vertical misteriosa, que possui um sistema desigual de divisão de comida para os confinados. Há poucas informações sobre o sistema prisional e seus criadores, mas isso não chega a ser uma questão pendente, pois apenas não é o foco escolhido para ser abordado.

Todas as informações dadas provém do confinamento constante dos prisioneiros. Todos os dias há uma grande plataforma recheada de comida desce entre os níveis da prisão, para alimentar de forma crescente as pessoas que ali habitam, mas à medida que a plataforma desce, a comida vai se tornando cada vez mais escassa, até chegar a um ponto em que não sobre mais nada além de bandejas de prata e cacos de vidro para quem se encontra nos níveis inferiores.

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A partir desse ponto, o filme nos propõe, de forma visceral e bruta, diversas reflexões, tais como: ‘até onde o ser humano iria quando posto em condições extremas e não convencionais’, ‘qual seria o real limite de uma pessoa’, ‘o que pode ser considerado certo ou errado em um momento de crise, quando sua vida depende de suas escolhas e não há regras além da sua sobrevivência’, ‘individualismo dentro de um conjunto social’, ‘hierarquia e privilégios’ entre diversas outros tópicos.

Sabemos tanto quanto o protagonista, então partilhamos o sentimento de descoberta a cada nova informação com o personagem, o que é efetivo, pois ajuda na criação de um elo empático com Goreng (Iván Massagué) e com o ambiente, fortificando a experiência emocional ao assistir o longa-metragem.

A busca constante por respostas equilibra a tensão e o suspense, criando e fortalecendo uma atmosfera de desconforto, deixando o telespectador cada vez mais angustiado com o desconhecido que o aguarda, sentimento esse que se instaura desde o primeiro momento em que o filme tem início, graças a boa escolha da trilha sonora que vai nos acompanhar até seu desfecho.

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Por se passar em apenas um único cenário é interessante analisar como a narrativa não se torna enfadonha, mas sim, o completo oposto, sendo intrigante e interessante. E é nesse momento que é possível perceber o bom trabalho de direção e roteiro que deram origem ao filme. O ‘Expresso do Amanhã’, obra do diretor Bong Joon-ho, é uma das veias referenciais que constituem ‘El Hoyo’, especialmente por criticar os sistemas socioeconômico.

Os diálogos são moderados e fortes, cada frase dita tem um propósito e um objetivo oculto, que faz referência a diversos subtópicos escolhidos para serem abordados no decorrer da trama, tal como religião e religiosidade. O filme é inteligente e atrevido quando toca nesse ponto de forma sutil, sendo usado especialmente na construção de uma metáforas translúcidas que deseja passar. A crítica está presente ao longo do filme, seja de forma verbal ou simbólica, e ganha mais visibilidade quando usado como forma de validação das atitudes do indivíduo, como justificativa para determinadas atitudes que em outro contexto não existiriam.

No mais, ‘O Poço’ se trata de um filme irrevogavelmente forte, destemido, inteligente, visceral e de muitas facetas. Toda sua construção é boa, desde os aspectos técnicos como fotografia e paleta de cores escolhidas até a mensagem central, que não é apenas uma, mas várias possibilidades reunidas dentro de uma só. Certamente é o tipo de produção que vai te deixar em silêncio por boas horas e com a cabeça em um verdadeiro turbilhão de pensamentos. Por se tratar de uma obra constituída por metáforas, para chegar a uma conclusão sobre ele, é preciso escolher um ponto de vista para analisá-lo.