A terceira temporada da antologia Monstro, criada por Ryan Murphy e Ian Brennan, chega à Netflix (assista) com Monstro: A História de Ed Gein, protagonizada por Charlie Hunnam. Depois de retratar Jeffrey Dahmer e os irmãos Menendez, a série se volta para um caso mais antigo e perturbador — o do fazendeiro de Wisconsin cujos crimes inspiraram alguns dos maiores filmes de terror da história, de Psicose a O Massacre da Serra Elétrica. A produção combina fatos históricos e elementos ficcionais para explorar a origem do “açougueiro de Plainfield” e a influência que seu legado macabro exerceu sobre a cultura popular. Confira a nossa crítica:
Monstro: A História de Ed Gein – o retrato de um assassino e o terror doméstico
A série abre em 1945, com Ed Gein (Charlie Hunnam) vivendo sob a rígida moralidade de sua mãe, Augusta (Laurie Metcalf). Devota religiosa, ela controla o filho com um discurso de culpa e pecado, associando o desejo sexual à perdição. É nesse ambiente opressivo que Ed desenvolve comportamentos cada vez mais desviantes, movido por repressão, solidão e uma relação distorcida com o corpo e a morte.
Quando Augusta adoece, Ed tenta se aproximar de outras pessoas, especialmente de Adeline Watkins (Suzanna Son), uma jovem com quem compartilha um interesse mórbido por histórias sobre os campos de concentração nazistas. O relacionamento desencadeia a espiral de violência que transforma Ed em um assassino e necrófilo, conhecido mais tarde por suas práticas de exumação e pelo uso dos corpos de suas vítimas para confeccionar objetos.
Entre o real e o imaginário
Monstro: A História de Ed Gein se destaca por misturar a realidade com o imaginário do protagonista. Ryan Murphy e Ian Brennan estruturam a narrativa de forma a alternar o que de fato ocorreu com as visões e delírios de Ed, sobretudo em relação à figura da criminosa de guerra Ilse Koch (Vicky Krieps), que aparece em sequências estilizadas e oníricas. Essas passagens ressaltam a desconexão do assassino com o mundo real e como suas fantasias se confundem com o horror da história recente.
A série também estabelece paralelos entre Ed e o cineasta Alfred Hitchcock (Tom Hollander), sugerindo uma reflexão sobre como o crime e a violência inspiram a arte. Hitchcock, retratado aqui enquanto cria Psicose, funciona como espelho da sociedade fascinada por figuras monstruosas — um dos temas centrais da franquia Monstro.

O olhar de Ryan Murphy sobre o mal americano
Assim como nas temporadas anteriores, Ryan Murphy e Ian Brennan usam a biografia de um assassino como lente para examinar o imaginário norte-americano. A história de Ed Gein, situada em uma comunidade rural e religiosa do pós-guerra, serve como retrato da repressão e da hipocrisia moral que podem gerar monstros reais.
No entanto, a temporada nem sempre mantém o equilíbrio entre análise social e exploração gráfica. Os episódios iniciais têm força dramática, centrados na dinâmica entre mãe e filho e no ambiente sufocante em que Ed vive. Com o avanço da narrativa, a produção se perde em desvios e excessos visuais, especialmente nas recriações dos crimes e nas participações de outros assassinos notórios, como Ted Bundy e Richard Speck. Esses acréscimos acabam diluindo o foco da história principal e enfraquecendo o impacto psicológico do personagem.
Charlie Hunnam e o peso das atuações na série true crime
Charlie Hunnam entrega uma interpretação contida, que evita o clichê do psicopata caricatural. Sua atuação se baseia mais no desconforto e na rigidez corporal do que em explosões de violência, o que reforça o aspecto trágico de Ed Gein. Laurie Metcalf, por sua vez, compõe uma Augusta dominadora e fanática, cuja presença continua a assombrar o filho mesmo após a morte.

Apesar de o roteiro relegar a personagem a um papel secundário nos episódios posteriores, a química entre Hunnam e Metcalf é o que dá corpo à série. É na relação entre eles que Monstro: A História de Ed Gein encontra seu verdadeiro núcleo dramático.
Crítica de Monstro: A História de Ed Gein – um espelho da cultura de horror na Netflix
A terceira temporada da antologia Monstro funciona como reflexão sobre a gênese do terror moderno e sobre a necessidade de revisitar crimes que moldaram o imaginário coletivo. Ao mesmo tempo, questiona o fascínio público por figuras como Ed Gein e como o entretenimento transforma o horror em espetáculo.
Com um visual sombrio e uma abordagem que mistura biografia, delírio e crítica cultural, Monstro: A História de Ed Gein reafirma a ambição de Ryan Murphy de criar retratos sobre a violência e o moralismo nos Estados Unidos. Mesmo irregular, a série mantém o interesse ao revelar como um homem isolado e reprimido se tornou o molde para os monstros da ficção — e como o medo que ele representa continua vivo no cinema e na sociedade.