As polêmicas envolvendo a primeira parte de Mestres do Universo: Salvando Eternia acabaram ofuscando a enorme qualidade da produção. Fãs saudosistas da pouco inspirada animação dos anos 1980 não suportaram ver que He-Man não era o grande protagonista dessa nova versão. E por mais que a figura bombada do príncipe Adam (Chris Wood) ganhe um pouco mais de espaço, a segunda parte da animação que estreou na Netflix segue firme e forte os conceitos de seu criador. O que é uma excelente notícia.
Se nos primeiros cinco episódios Kevin Smith usou uma grande batalha como ponto de ruptura para o status quo desse universo, agora ele desenvolve essas ramificações visando um combate emblemático entre o bem e o mal. Dessa forma, a segunda parte de Mestres do Universo possui muito mais cenas de ação. E todas elas são de extrema qualidade. No entanto, aquele que chegar aqui esperando uma mudança de protagonismo, deve quebrar a cara novamente. E, de maneira surpreendente, até o clássico antagonismo é alterado. Sim, Teela (Sarah Michelle Gellar) segue como o foco das atenções. Dessa vez, abraçando o legado de sua mãe como a Feiticeira de Greyskull. Do outro lado, Maligna (Lena Headey) subverte expectativas e rouba o espaço que outrora foi do Esqueleto (Mark Hamill).
Curiosamente, ao sumir dos holofotes, He-Man ganha muito mais desenvolvimento do que teve durante todos esses anos. De certa forma, tudo gira em torno de sua figura heroica. Isso fica evidente desde o momento em que os poderes de Greyskull passam de mão em mão, principalmente dos vilões. Adam é especial não por ser o grande campeão do universo, mas pela maneira como lida com o poder. O roteiro ainda aproveita para resolver algumas questões familiares do personagem. Note como é o príncipe que tem mais tempo de tela, lidando com as consequências de anos de segredos guardados e buscando um tipo de redenção. A transformação ocorre apenas em momentos cruciais. O que só faz aumentar a expectativa do público.
No entanto, a segunda parte de Mestres do Universo ainda possui alguns problemas. Em especial, a velocidade com que precisa resolver as questões pendentes. Ao contar com a mesma quantidade de episódios, os minutos não são suficientes para entregar de maneira satisfatória as mudanças de alguns personagens, principalmente aquelas mais drásticas. Alguns conceitos também surgem no meio da trama, sem espaço para uma abordagem mais estruturada. Vale ressaltar que não estamos diante de algo bagunçado, apenas com algumas peças que carecem de ajuste. Como por exemplo, a iniciação de Teela no mundo da magia e a mudança de perspectiva de Maligna sobre o universo e seu propósito.
Óbvio que nem toda a desconstrução desse mundo está imune ao fan service, já que é necessário agradar o público para sobreviver. Mestres do Universo abraça mais essa vertente na segunda parte, colocando figuras clássicas da antiga animação em tela, mesmo que só por algumas cenas. Não se enganem, essa ainda é uma série para vender brinquedos. Seu principal diferencial está na forma como acrescenta personalidade e profundidade aos personagens, criando assim uma trama muito mais interessante e coesa. E convenhamos, é divertido ver tudo isso de volta, com um visual infinitamente superior e com muito mais substância.
O final desse primeiro arco de Mestres do Universo: Salvando Eternia resolve de maneira extremamente satisfatória suas pendências, entregando momentos de empolgação genuína. Particularmente, prefiro o equilíbrio da primeira parte. Mas, no panorama geral, Kevin Smith consegue revitalizar e criar um rumo para uma franquia que sobrevivia no imaginário popular apenas pela força da nostalgia. Nunca imaginei que passaria por isso um dia, mas estou curioso pelas próximas aventuras do He-Man.