A informação de que o ótimo X – A Marca da Morte (X, 2022) foi concebido juntamente com um prequel que viria a ser lançado meses depois, além da ideia de mais várias sequências para dar sustentação a uma franquia de terror, foi recebida com preocupação por parte de quem acompanha esse nicho do cinema. Afinal, como você pode desenvolver um bom trabalho agora se já está pensando lá na frente? Com Pearl, o tal prelúdio, o diretor e roteirista Ti West cumpriu metade da promessa ao contar a história de origem da (ou uma das) personagem de Mia Goth. Agora, com MaXXXine (2024), o desafio é manter sua franquia de horror interessante, mas seguindo os eventos de X, lançando mão do neon dos anos 1980 e um elenco ainda mais valioso ao seu slasher.
A trama se passa na Hollywood dos anos 1980, quando a estrela de filmes adultos e aspirante a atriz Maxine Minx (Mia Goth) finalmente parece ter conquistado a chance de fazer sua estreia triunfal na telona, desta vez numa produção de terror dirigida pela cineasta Elizabeth Bender (Elizabeth Debicki). Mas quando um misterioso assassino começa a perseguir justamente as jovens estrelas de Hollywood, uma trilha de sangue ameaça revelar o passado sinistro de Maxine.
Mia Goth rainha, o resto nadinha
O sucesso de Mia Goth é enorme e seu desempenho neste filme, do qual ela também é produtora, faz parecer que foi tudo muito fácil. Com Pearl, ela já havia entregado uma performance absurda, desde a introdução até a cena dos créditos finais. Nesta produção, fica a impressão de algum desajuste pois não parece se tratar de um filme que visa principalmente a construção de um protagonista, mas no final das contas é o que acontece: o foco quase que integral em Goth torna MaXXXine, ao seu modo, mais uma produção de origem – mas que vai um pouco além, levando a personagem à sua emancipação.
Podemos dizer o mesmo da atriz? Só o tempo e a repercussão do filme podem responder isso.
Ti West consegue contar mais uma história interessante dentro do universo de X, repleto de boas referências tanto em relação aos anteriores da franquia (o pato de porcelana que a protagonista esconde seu pó; a marca do “X” em diversas cenas) quanto a produções clássicas do terror, principalmente à Psicose (1960) de Alfred Hitchcock. O clássico filme de terror, inclusive, pode ser usado como a base para a resolução do mistério construído ao longo do enredo, se você inverter um mecanismo ou outro.
Sendo assim, podemos afirmar que o principal elemento de MaXXXine é a metalinguagem. Ti West está o tempo todo falando sobre o próprio universo do terror, enquanto Maxine reflete em muitos aspectos a própria Mia Goth, que chegou a ser acusada de agressão por parte de um dos figurantes da produção. Até raízes num longa pornográfico ela consegue ter, afinal, foi em Ninfomaníaca: Volume 2 (2013), de Lars Von Trier, que seu nome passou a ser colocado na rodinha dos cinéfilos.
Ti West alcança seu ápice com MaXXXine?
A condução da narrativa segue um ritmo peculiar, e o público pode não sentir de fato um medo genuíno do vilão anunciado na sinopse. Sem a construção do medo e a pouca dedicação para dar caráter de thriller ao enredo, fica complicado dizer que MaXXXine tira nota dez em todos os quesitos. Não fica muito claro, de um modo negativo, se de fato o assassino em série é a mesma pessoa que está atormentando a protagonista com o seu passado após a carnificina ocorrida no sítio de X – A Marca da Morte, e algumas cenas parecem propositalmente (e equivocadamente) dúbias: estaria Maxine vivendo aquilo realmente ou trata-se do seu trabalho como atriz?
No que tange aos demais nomes no elenco, é interessante ver Giancarlo Esposito interpretando um papel que fuja do estereótipo latino metódico e frio conquistado com sua bela participação na série Breaking Bad. Aqui, ele interpreta o empresário Teddy Night, que acaba fazendo outros serviços “por fora” para a personagem de Goth. Kevin Bacon é outra boa adição, porém, mal aproveitada e relegada a um personagem comum, embora seja um papel diferente do usual para o ator. Ele interpreta o desprezível detetive particular John Labat.
Em X, Ti West consegue dar uma cara ao filme construindo uma boa base narrativa até a metade, para só depois deixar o terror despirocar de vez. Em Pearl, temos um bom trabalho de personagem com a psicopatia da idosa destrinchada para o público. Já em MaXXXine parece ter faltado elementos suficientes para conferir identidade própria à produção, o que é uma pena, pois trata-se claramente de um filme com muito potencial. Não deixa de ser uma divertida e sangrenta sessão, abordando esta verdadeira entidade vivida por Mia Goth, digna de um dos Deuses Americanos de Neil Gaiman: a Fama.