É cada vez mais comum: você vai ao cinema e enche os olhos de admiração. Mas quando o filme acaba, acaba surgindo umas dúvidas incômodas (e se você gosta muito do longa, até pode entrar em negação do tipo “poxa, o filme é tão bom, eu é que não devo ter entendido essa parte”) começam a pipocar. Quando você percebe, não é preciso ser um crítico de cinema para notar que aquela narrativa não era lá essas coisas todas.
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O exemplo mais recente é Baby Driver – Em Ritmo de Fuga. O filme tira o fôlego na primeira metade, encanta pela montagem sensacional com planos-sequência ágeis e ritmados a uma trilha sonora explosiva, o que já se diferencia da maior parte dos filmes do gênero lançados ultimamente.
Mas o ato final é confuso. Afinal, como não se incomodar com diálogos como “eu fui apaixonado uma vez” na boca de um personagem teoricamente calculista e com o que ele faz depois disso, indo na contramão (com o perdão do trocadilho ) de tudo o que havia sido construído até aquele momento? O fator surpresa deve existir, mas precisa ser verossímil dentro da narrativa. Se você está construindo personagens, não há problemas em provocar uma reação deles que o público não espera (muito pelo contrário!), mas aquilo precisa ser condizente com o universo daquela pessoa. Um belíssimo exemplo disso é Garota Exemplar, de David Fincher.
Esse tipo de falha em Baby Driver não termina aí. O que dizer de personagens estilosas que escondem a falta de profundidade com frases de efeito? Falar de Darling é óbvio, mas a própria Deborah é alarmantemente rasa dentro do roteiro (o seu desprendimento para seguir Baby até as últimas consequências sem o mínimo de questionamento é uma prova disso). O personagem mais interessante ali – além do próprio Baby, na primeira parte do filme – é Bats, de Jamie Foxx.
Isso só mostra o quanto bons filmes (porque Baby Driver é muito bom!) deixam de ser espetaculares por falhas na narrativa. Não sei se é porque diretores como Edgar Wright imaginam que o roteiro deve apenas sustentar o visual e criar frases bonitinhas, mas as produções mais recentes parecem se contentar só com isso. E olha que para que a história de Baby terminasse sem pontas soltas só precisava de um pouco de mais esforço na hora de criar os atos do filme, porque já tinha começado muito bem.
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Outro exemplo disso é o lindo La la land. Amei a fotografia, as músicas e a coreografia, mas os problemas que o casal enfrentava eram construídos de uma forma tão sem sal (chegando até a lembrar os conflitos de Malhação) que o final me encantou, mas não me emocionou. É como um cupcake lindo com gosto de bolo que passou muito tempo no forno.
Claro que muitas vezes o roteiro é alterado – quase completamente até – para que o filme alcance a visão do que se pretende atingir. Mas o que fica de lição é que não se deve começar um projeto sem decidir que história você realmente quer contar. E isso do começo ao fim, não apenas em um começo maravilhoso!
Porque o cinema, afinal de contas, é contação de histórias. Para que um filme se torne um clássico, é preciso que a história encante mais do que os olhos.