Já faz muito tempo que ouvi falar de Dandara e várias coisas me animaram à primeira vista: A inspiração para a personagem principal, a linda arte, o resgate ao gênero Metroidvania, mas foi muito melhor ter o jogo em mãos e finalmente jogar essa ótima obra da produção brasileira de jogos.
Dandara é um metroidvania 2D produzido pelo estúdio brasileiro Long Hat House e publicado pela Raw Fury. Nele você controla uma moça em um mundo decadente com um regime opressivo enquanto tenta libertar seu povo e aprender mais sobre aquele universo.
O aspecto mais inovador e que já salta aos olhos de primeira é o sistema de movimentação diferente do jogo. Você não se movimenta caminhando e saltando como é normal em um jogo de plataforma 2D, aqui você tem uma certa liberdade de saltar e “pregar” nas paredes, sempre brincando com o sentido de gravidade como nós conhecemos. A movimentação lembra jogos como Savant – Ascent ou Spider, só que de uma forma mais travada.
Esse aspecto mais inovador do jogo acaba sendo um grande problema principalmente nas primeiras horas. O sistema é um pouco frustrante e difícil de masterizar, então isso pode afastar alguns jogadores logo de cara. Você precisa mirar para onde saltar e depois se movimentar, podendo inclusive levar dano no processo. Além disso, o seu ataque também se baseia em mira e tiros, deixando o ritmo meio travado. Essa última parte não é necessariamente um problema, o combate em Dandara é bem mais tático do que frenético, cada salto e cada ataque tem que ser bem pensado, você está sempre lutando contra o cenário bem como os inimigos.
Essa movimentação diferente acaba gerando umas decisões bem interessantes no level design do jogo, o que é minha parte favorita. Existem alguns “jumping puzzles” e alguns chefes bem criativos que utilizam e expandem o conceito de movimentação do jogo. Os designers tiveram que praticamente jogar muita coisa de manuais de level design de jogos de plataforma no lixo e bolar novas interações e desafios do zero, isso requer muita coragem.
Outro aspecto interessante do jogo, como um bom metroidvania, é a exploração. O cenário e o clima lembram muito o clássico Super Metroid. Você tem um mapa todo aberto e vai explorando e descobrindo onde você pode ou não ir, e ao habilitar novos itens e interações, você acaba lembrando que aquela parede lá atrás agora pode ser transpassada. O jogo, apesar de ter uma movimentação diferente, remete muito a esse sentimento dos jogos clássicos do gênero, gerando um sentimento bom de nostalgia.
A apresentação do visual do jogo é linda, a qualidade do pixel art e das animações está acima da média e é muito bonito de se ver. Além disso, os cenários desconexos tridimensionais são bem criativos e diferentes, você vê placas no teto e nas paredes, caixas nos tetos e outros elementos brincando com a gravidade, como naquela cena de Inception. Outra coisa muito legal são as referências à cultura brasileira com nomes e personagens históricos, um trabalho bem sutil que homenageia sem forçar a barra. O próprio nome da personagem é uma referência a uma guerreira esquecida que lutou pela liberdade dos escravos. A linda arte visual também é reforçada por uma trilha linda que remete muito o sentimento de solidão presente nos jogos da série Metroid, sendo que aqui os toques são mais tribais. A história é outro aspecto que remete à série da Nintendo, o enredo é minimalista e você descobre muito pouco sobre aquilo ali, com certeza é um jogo que prima mais pela mecânica do que pela narrativa.
Apesar de ser uma experiência diferente e nostálgica, algumas coisas irritam em Dandara. Como já falado, a movimentação é um entrave muito grande nas primeiras horas e parece que você nunca evolui, está sempre lutando contra essa decisão. O mapa é outro problema sério para mim que tenho um senso de direção terrível, ele não passa muitas informações e a forma como é construído atrapalha no entendimento. Outra coisa que acabava com minha orientação é a escolha de girar a tela em alguns momento quando você entra em uma sala, algo que estava virado de lado do nada fica para cima e aí eu ficava completamente perdido.
São escolhas simples que poderiam ter sido melhor pensadas para melhorar a experiência do jogador. Como o fato de não ter uma viagem rápida para se teletransportar para o local onde você evolui e se recupera e ter que encontrar seu corpo no meio do mapa para recuperar a experiência depois de morrer, são algumas dificuldades para o jogador que não vejo muito motivo para existirem. Por falar em evolução de personagem, existe um sistema de experiência para ganhar melhorar seu personagem mas é uma evolução meio lenta e que não muda muito o gameplay.
Dandara é um jogo ousado e inovador, ele procurou trazer uma diferença na sua movimentação o que acaba sendo sua maior vantagem e desvantagem ao mesmo tempo. O sentimento de exploração lembra muitos jogos clássicos do gênero sendo reforçado por uma linda direção de arte e música, é muito divertido resolver os puzzles de cenário e se movimentar, mas o combate não chega a ser tão interessante assim. Apesar da história ser deixada de lado, o jogo possui diversas referências à cultura brasileira de forma sutil e bem colocadas. Parabéns para a empresa por experimentar algo novo em um gênero já tão antigo mas espero que nos seus jogos futuros eles consigam misturar mais escolhas inovadoras com escolhas de design que tornam a experiência mais divertida e menos frustrante.
Dandara está disponível para PC, Mac OS, Nintendo Switch, iOS e Android. Futuramente serão lançadas versões para PS4 e XBoxOne.