Oito anos após Detroit, Kathryn Bigelow retorna à direção com Casa de Dinamite (A House of Dynamite), lançado hoje (24) pela Netflix. O novo longa reúne o rigor técnico característico da cineasta e um elenco de peso, liderado por Idris Elba, Rebecca Ferguson, Tracy Letts e Jared Harris, para construir um thriller político sobre o colapso moral e estrutural dos Estados Unidos diante da ameaça de um ataque nuclear. Confira a nossa crítica:
Um retorno de impacto para Kathryn Bigelow
Conhecida por obras intensas como Guerra ao Terror e A Hora Mais Escura, Bigelow deixa de lado o realismo histórico e mergulha em uma ficção especulativa que, ainda assim, reflete o presente. Casa de Dinamite acompanha o caos instalado quando uma ogiva nuclear é detectada em rota para os EUA, disparada de um ponto desconhecido do Pacífico. Em poucos minutos, a estrutura militar e política americana entra em colapso, expondo suas falhas humanas, burocráticas e éticas.
Dividido em três partes, o filme adota uma estrutura narrativa não linear: ao final de cada segmento, a história retorna ao início da contagem regressiva — um artifício que permite observar os mesmos acontecimentos sob diferentes perspectivas. Essa repetição, embora engenhosa, também reforça a ideia de que o sistema político e militar dos EUA está preso em ciclos de erro e hesitação, incapaz de romper com seus próprios mecanismos de destruição.
Casa de Dinamite: entre a tensão entre o humano e o institucional
Rebecca Ferguson interpreta Olivia Walker, a comandante da Sala de Situação, enquanto Tracy Letts vive o general Baker, responsável por decisões que podem redefinir a geopolítica mundial. Idris Elba surge como o presidente americano, um líder que aparece apenas após uma hora de filme, mas cuja voz e presença pairam sobre toda a narrativa. O roteiro de Noah Oppenheim (ex-produtor da NBC) constrói diálogos tensos e verossímeis, mostrando que, mesmo diante do iminente colapso, as figuras de poder permanecem presas a protocolos e rivalidades internas.
Bigelow também dá espaço para figuras anônimas: engenheiros, médicos e soldados que enfrentam o peso de ordens incompreensíveis. Anthony Ramos e Aminah Nieves encarnam esses personagens de base, que traduzem o impacto emocional do desastre e humanizam a engrenagem fria da defesa nacional.
Um espetáculo técnico e moral
Visualmente, o longa reafirma o domínio de Bigelow sobre o suspense documental. A fotografia de Barry Ackroyd (Zona Verde, Captain Phillips) recorre a zooms abruptos e planos claustrofóbicos, recriando o pânico e a urgência de uma crise em tempo real. Telefones tocam, telas piscam, e o espectador é colocado dentro de uma tempestade de informações e incertezas.

Mas Casa de Dinamite não é apenas um exercício de tensão. É também um comentário sobre o idealismo americano em ruínas. O filme sugere que a confiança cega em hierarquias e símbolos de poder — de presidentes a bandeiras — já não sustenta o império. Há ecos de Não Olhe para Cima e Vantage Point em sua abordagem satírica, mas o tom de Bigelow oscila entre o desespero e o absurdo, transformando a tragédia em reflexão sobre o niilismo político contemporâneo.
Crítica: vale á pena assistir Casa de Dinamite na Netflix?
Um final aberto e inquietante
O desfecho de Casa de Dinamite mantém o público em suspensão. Assim como nas reviravoltas de sua estrutura, Bigelow evita oferecer respostas claras: a ameaça nuclear pode ou não ter sido neutralizada, mas o dano já está feito. O verdadeiro colapso não vem da explosão iminente, e sim da incapacidade de decisão de quem detém o poder.
Em seu retorno, Kathryn Bigelow entrega um thriller de alta voltagem emocional e política, onde o espetáculo do caos se torna espelho da fragilidade das instituições. Casa de Dinamite é menos sobre a guerra iminente e mais sobre o momento em que o centro, finalmente, deixa de segurar.