Criatividade é só um nome bonito para misturar ideias que já existem e tentar fazer algo novo — por esse e outros motivos é que eu sempre fico animado quando novas misturas aparecem em jogos. BROK the InvestiGator me intrigou desde o começo pela sua proposta de misturar jogos de aventura point-and-click, conhecidos por serem tão metódicos, com mecânicas de beat’em up, a famosa “porradinha de rua”, muito mais dinâmica e cheia de ação.
A cola desses dois mundos tão distantes aqui é a narrativa: você assume o papel de Brok, um jacaré antropomórfico que trabalha como detetive (e faz-tudo) para conseguir sobreviver a um mundo cyberpunk com animais que falam. Enquanto os mais ricos moram em um domo, protegidos das doenças ambientais, ele, seu filho postiço Graff e muitos outros vivem em situação precária tentando sobreviver. O fio que guia a trama é acompanhar o cotidiano dos dois nesse mundo aos pedaços e ir desvendando o passado de Brok, que não lembra do que aconteceu por conta de uma amnésia misteriosa.
Como dá pra imaginar é uma trama bem mais dramática do que o visual cartunesco pode parecer em um primeiro momento. Não chega a ser destoante ver um desenho animado e ouvir uma história de filme do Corujão, mas realmente foi uma surpresa ver uma trama mais séria, mesmo com uns elementos de humor aqui e ali. Pelo menos, toda a narrativa tem bastante liberdade pra decidir como você vai lidar com muitos dos problemas apresentados, inclusive com uma série de finais diferentes que você pode fazer.
Esse tom de mistura agridoce aparece também, claro, nas duas mecânicas que estão presentes no núcleo do jogo. O que eu esperava era que elas se integrassem de uma forma natural, mas não é bem o que acontece. Você literalmente tem um botão que troca entre o “modo point-and-click” e o “modo beat’em up“, com controles diferentes e formas diferentes de interagir com o cenário. Não que essa troca não funcione, mas é difícil não ter a sensação de estar jogando dois jogos distintos ao mesmo tempo. Até o esquema de controles parece que nunca está 100% bom, já que demandam ações tão diferentes — mais precisão no adventure, mais agilidade na porradinha.
Por causa disso, cada metade de BROK the InvestiGator não consegue alcançar muitos méritos. A parte point-and-click funciona bem até, sofrendo de problemas mais comuns do gênero, como puzzles obtusos e muita tentativa-e-erro, além de um sistema muito legal de interrogatório e dedução na hora de confrontar suspeitos. A outra metade beat’em up, entretanto, é extremamente simplista e repetitiva, com poucas opções de ataques e combos, além de um sistema de itens de RPG que dificulta ainda mais o entendimento. Pelo menos, o jogo permite que você resolva vários cenários usando a cabeça ou o punho, inclusive gerando continuações diferentes na história, o que é bem interessante e combina com a proposta da mistura.
Mesmo com todos esses problemas, a quantidade ABSURDA de opções de acessibilidade — possibilitando até que o jogo seja aproveitado 100% apenas usando o som — compensa vários problemas, mesmo que seja apenas para personalizar sua experiência para pular algumas lutas ou pedir dicas para os puzzles. Ele ainda tem um sistema robusto de dicas (parecido com o da série Professor Layton), em que você pode procurar itens pelos mapas para desbloquear dicas quando preciso. Se os controles não te atrapalharem muito na hora de encontrá-los é outra mãozinha que você tem para passar por puzzles mais frustrantes.
Sabe quando falam que o pato sabe fazer de tudo, mas não faz nada muito bem? O grande jacaré detetive de BROK the InvestiGator provavelmente está na mesma categoria. É louvável a proposta de misturar dois gêneros de jogos tão diferentes dentro de uma única narrativa, mas é fácil perceber logo no começo os problemas da execução dessa diferente fusão. Se você gosta de tramas mais dramáticas em cenários cyberpunk e já está acostumado com jogos de aventura, a aventura em direção aos domos vai ser bem legal pra você! Mas se está procurando algo mais leve, boas porradinhas, ou um gênero novo surgindo, esse jacaré não é pra você…
BROK the InvestiGator está disponível para PC e Mac na Steam, para PS4 e PS5 na PlayStation Store, para Xbox One e Xbox Series na Xbox Store e no Nintendo Switch.
*Uma cópia do jogo foi gentilmente cedida ao CosmoNerd pelos desenvolvedores para a produção deste texto.