Desde que a humanidade colocou os pés na lua, nossa ambição nos fez querer ir mais longe. O charmoso satélite não era o suficiente, afinal de contas o espaço sideral é literalmente um mar de infinitas possibilidades. De um tempo para cá, Marte é o nosso objeto de desejo. Desde filmes como Perdido em Marte, passando por séries documentais como Mars, todos querem imaginar como é estar no planeta vermelho. Away, série original da Netflix, fornece um novo olhar sobre isso. Ainda que ele esteja embaçado por tentativas escancaradas de arrancar lágrimas do espectador.
Baseada em um artigo escrito pelo jornalista Chris Jones e publicado na revista Esquire, a trama acompanha a astronauta Emma Green (Hilary Swank) que comanda a primeira missão tripulada com destino a Marte. Ao lado dela estão a química Lu (Vivian Wu), o botânico Kwesi (Ato Essandoh), o copiloto Ram (Ray Panthaki) e o experiente cosmonauta Misha (Mark Ivanir). É através do ponto de vista de pessoas com cargas culturais e emocionais tão distintas que Away conta sua história. Mesclando os riscos da viagem com os dramas pessoais dos envolvidos, em especial de Emma e sua família que ficou na Terra.
Essa alternância entre núcleos foi a forma que o criador Andrew Hinderaker encontrou de estabelecer uma conexão entre o público e os personagens. Contudo, a aposta acaba não saindo do jeito certo. Por exemplo, Matt (Josh Charles) – o marido de Emma – sofre um derrame logo no primeiro episódio. Esse fato acaba permeando toda a narrativa terrestre e deve servir como um agravante para a condição de Emma no espaço. Porém, os episódios não conseguem trabalhar tal situação de uma forma realmente envolvente. Tudo soa extremamente repetitivo. Algo que também ocorre com Misha e sua filha.
Outra muleta narrativa para desenvolver os tripulantes da Atlas é a utilização de flashbacks. Metade da temporada tem como função mostrar um pouco de cada um deles, novamente caindo numa armadilha extremamente formulaica de conflito-apresentação do problema-explicação de motivação-resolução do problema. Nem mesmo os termos técnicos tornam a jornada interessante, já que astronautas presos numa nave poderiam ser facilmente substituídos por pessoas em outro tipo de isolamento.
No entanto, é preciso reconhecer que Away não é um completo desperdício de tempo. Na segunda metade da temporada, quando os personagens estão devidamente estabelecidos, os dramas e a ação ganham contornos mais interessantes. Muito pelo talento do elenco, que extrai o máximo do roteiro oscilante. É sempre bom ver Hilary Swank em ação, sua presença de tela é fascinante. Vivian Wu e Ato Essandoh também se destacam, criando uma dinâmica interessante em alguns momentos.
O principal agravante da série é seu problema de ritmo. Parece que a temporada não foi pensada para ter 10 episódios e que o contrato com a Netflix acabou afetando esse aspecto. É normal que produções sofram com uma “barriga” no meio da trama, mas quando esse excesso é notado logo no início, é preciso contar com uma enorme força de vontade do espectador para não desistir de cara. Principalmente se a perspectiva de melhora não é tão clara.
Away é cercada de boa vontade, não existem dúvidas quanto a isso. Mas a execução da ideia é bastante irregular. Lembra muito o resultado final de Space Force, curiosamente também da Netflix. Não foi dessa vez que Marte ganhou uma série digna de seu prestígio.