É um pouco difícil até de falar sobre É Assim que Acaba, filme de Justin Baldoni e baseado no livro homônimo de Colleen Hoover. A narrativa adotada aqui aborda temas sensíveis e complexos, como o ciclo de abuso e relações tóxicas, e isso torna meu comentário ainda mais desafiador, pois não quero relativizar a gravidade da situação vivida pela protagonista. No entanto, antes de começar, deixo claro que o texto é totalmente baseado no filme, pois não li o livro.
A história de Lily Bloom (Blake Lively) é sobre o ciclo do abuso; ela o vive, e não é preciso saber dois mais dois para entender que consegue sair dali. Mas não começa com ela. Começa mais cedo, dentro de sua família, vendo por anos seu pai espancar sua mãe e ela aceitar. O filme começa com o funeral do pai de Lily, que não sabe o que falar de bom sobre seu velho e, sem palavras, vai embora no meio do funeral. É quando ela conhece um neurocirurgião, Ryle (interpretado pelo diretor Justin Baldoni), que, para o bem da trama, a gente finge que é superatraente e sedutor como a narrativa quer nos convencer.
“É Assim que Acaba” costura o presente e o passado de Lily. Vemos a construção do seu namoro com seu primeiro amor, Atlas, um garoto em situação de rua que estudava com ela e que reaparece no seu presente, causando todos os problemas subsequentes na vida de Lily, pois ele ativa o botãozinho de posse escondido nos recônditos do âmago de Ryle. Essa não é só uma conveniência do roteiro, mas o personagem Atlas tem uma função narrativa bem pobre.
A direção parece tentar nos ludibriar nos momentos em que Lily sofre alguma violência, para fazer um suspense sobre se foi mesmo ou não acidental, mas a verdade é que o todo não é muito competente. O filme é recheado de conveniências e repercussões preguiçosas, como se dissesse para lermos nas entrelinhas algo que está mal estruturado. Também não teve muito tato ou sutileza para inserir detalhes importantes que poderiam ter recheado a história com uma tensão sufocante de verdade.
Por exemplo, dificilmente um abusador deixa de soltar pistas de que ele é um abusador; porém, só quem passou por isso pega essas coisas – e teria sido interessante ver isso em tela. Ryle é apresentado o tempo todo como um cara maravilhoso, ele nunca diz nada errado, está sempre sendo perfeito… até os poucos momentos em que explode, com a câmera tentando nos convencer de que não aconteceu nada demais. E não é que não possa acontecer de sermos surpreendidas de uma hora para outra por alguém que achávamos legal, mas o filme peca muito nessa construção do personagem e da relação deles. E aí fica o questionamento, será que isso se deu porque o diretor é o ator que faz o Ryle?
Por alguma razão, a paleta do filme é muito marrom, com tons pesados, alguns bege, amarelo, até mesmo cores diferentes, como azul, são pastel, sem brilho algum. Até mesmo a iluminação é sempre muito sem graça, nada salta aos olhos – exceto em poucos momentos, como quando Lily usa um belíssimo vestido cobre. Marrom, para alguns teóricos da teoria das cores no cinema, pode ser uma cor de penitência, de sofrimento, mas também tem a ver com a terra, sensação de casa, resistência, o que casa bem com a história da protagonista. Entretanto, não precisava transformar o longa inteiro nisso.
No fim, “É Assim que Acaba” é um filme morno, com uma temática importantíssima, mas muito mal elaborada. Provavelmente vai agradar quem assistir, apesar de ser muito qualquer coisa. Espero que o intento de inspirar mulheres a saírem de relações doentias dê certo, pois seria o maior acerto dessa história.