Está cada dia mais difícil lembrar da época em que os filmes de super-heróis não dominavam as salas de cinema. Afinal, são quase duas décadas de adaptações de quadrinhos dos mais variados tipos tomando de assalto o entretenimento ao redor do mundo. E se não bastassem os longas, agora existem as séries de TV. Esse longo período de dominação, que atingiu seu auge faz tempo, torna difícil criar algo realmente novo, mesmo que seja para ridicularizar esse universo. A Franquia, nova série de comédia da HBO, foca nos bastidores do gênero para desenvolver sua trama satírica. Porém, a sensação é que a ideia saiu do papel com alguns anos de atraso.
Quer dizer, adaptações de quadrinhos nunca deixaram de possuir bastidores caóticos. Trocas de diretores, saída de atores, mudanças bruscas no roteiro, refilmagens. Os mais variados problemas surgem nesse meio e “A Franquia” se baseia nesses fatos na hora de destrinchar seu filme de mentirinha. No entanto, sabemos que algumas coisas são mais engraçadas na vida real do que na ficção. E o próprio público já está acostumado com essas situações. De toda forma, o principal trunfo da série reside em seu elenco estrelado.
A trama acompanha Daniel (Himesh Patel), o primeiro assistente de direção do filme fictício Tecto, um spin-off de uma popular franquia de super-heróis sobre um personagem que tem o poder de gerar terremotos. Seu trabalho é evitar que tudo desmorone nos bastidores, enquanto lida com estrelas problemáticas como Adam (Billy Magnussen) e Peter (Richard E. Grant), o ego inflado do diretor Eric (Daniel Brühl) e as demandas do implacável produtor executivo Pat (Darren Goldstein). Para piorar, a chegada de Anita (Aya Cash) ao set ameaça complicar ainda mais as coisas. O caos nos bastidores, algo comum em produções desse tipo, é o foco da série.
Como deu para perceber, “A Franquia” foca justamente nos profissionais que a audiência não se importa, aqueles que trabalham numa rotina cansativa para tirar os sonhos milionários dos estúdios do papel. O que garante um ar de novidade no meio de tantas outras sátiras mais famosas sobre o universo do super-heróis. O primeiro episódio cumpre bem a proposta, mostrando mais um dia de trabalho caótico no set de Tecto. O roteiro não perde tempo com explicações, acreditando que o espectador já esteja familiarizado com essa dinâmica. O humor, que é ponto principal, funciona em momentos isolados. Por exemplo, a piada dos atores ficando cegos porque o produtor do estúdio queria mais luzes no set é boa. Já o figurante com ataque de pânico é recorrente e perde a graça rápido demais.
Para olhos mais atentos, a série parece direcionar a maioria de suas piadas para o Marvel Studios (parodiado aqui como Maximum Studios), o que faz sentido, já que a HBO está ligada à DC Comics, rival da Marvel Comics. Mesmo com o caos recente no universo cinematográfico da DC e o fracasso de “Coringa: Delírio a Dois” (leia a crítica), a série julga mais fácil fazer piada com a “grama do vizinho”. É interessante que, apesar da equipe talentosa por trás da série – o primeiro episódio é dirigido por Sam Mendes (007: Operação Skyfall) e conta com Jon Brown, de “Veep” e “Succession”, como showrunner –, “A Franquia” ainda começa de forma inconstante.
Claro que as referências podem fisgar o público mais atento e gerar comentários nas redes sociais, mas o começo de “A Franquia” não é muito animador. No fim das contas, a melhor piada da série que brinca com os bastidores dos filmes de super-heróis é ser exibida aos domingos após o novo episódio de “Pinguim“.