Em quase 30 anos de carreira, M. Night Shyamalan já experimentou o sucesso absoluto e caiu de cara no fundo do poço. Chamado de “novo Hitchcock” nos primórdios de sua carreira, o indiano conheceu o lado mais sombrio do público e da crítica especializada até conseguir mostrar novamente que é, sem dúvidas, um diretor talentoso e capaz de tratar dos mais diversos temas em seus filmes. E é justamente pela expectativa da estreia de Glass (Vidro em PT-BR) que montei esse ranking dos piores ao melhores momentos de M. Night Shyamalan. Lembrando que a lista está organizada pelos meus gostos e experiências, então fique a vontade para discordar ou concordar.
Depois da Terra (2013)
Como disse na introdução dessa matéria, esse é o fundo do poço da carreira de Shy. Tanto, que nem mesmo seu nome aparece em destaque nos materiais de divulgação. Na verdade, o outrora genial diretor acabou servindo de muleta para que Will Smith e Jada-Pinkett Smith tentassem alavancar a carreira do filho Jaden. No fim das contas, o diretor e a família Smith deram com os burros n’água. A trama pouca inspirada, o visual genérico das criaturas e o talento nulo do jovem protagonista fazem dessa aventura grandiosa uma experiência massacrante. Ninguém imaginava na época, mas essa seria a prova definitiva de que Shyamalan não nasceu para dirigir blockbusters.
O Último Mestre do Ar (2010)
Após uma onda de massacres da crítica e do público, M. Night Shyamalan decidiu abandonar seu aspecto autoral para investir nos grandes filmes de estúdio. O escolhido para a empreitada foi o popular desenho animado Avatar, o que se mostrou um erro sem precedentes. É fato que aqui o diretor se mostra mais disposto do que no primeiro item da lista. Com um respeito palpável pelo material base, Shy abraça os simbolismos da relação entre o homem e a natureza e até aplica firulas técnicas como planos-sequência e planos abertos. Mas o roteiro e a qualidade do elenco acabam influenciando negativamente no rumo do longa. Sem contar na mão pesada do estúdio, sufocando qualquer fagulha de criatividade por parte do diretor.
A Dama na Água (2006)
Aqui, M. Night Shyamalan resolveu abraçar a famosa frase “ame-o ou odeie-o”. Com o ego ferido após constantes ataques da crítica, o diretor decidiu fazer seu “filme-resposta” para tudo o que estava acontecendo em sua vida. O resultado, no primeiro momento, parece ser um longa repleto de facilitações narrativas e escolhas esquisitas. Mas num segundo olhar, se mostra um exemplar sincero e corajoso de sua forma de enxergar o cinema. Porém, para que a beleza e os significados de A Dama na Água funcionem, é necessário que o espectador dê um salto de fé no encantamento e no fantástico. Um preço alto demais para um filme por vezes mais preocupado em cutucar a indústria do que contar uma boa história. É perfeitamente normal sair do longa com um gosto azedo na boca. No mais, Paul Giamatti está afinadíssimo e Bryce Dallas Howard ainda mais encantadora.
Fim dos Tempos (2008)
Para muitos, o filme que empurrou a carreira de M. Night Shyamalan da beira do precipício. Para este que vos escreve, uma obra bastante incompreendida. Aqui, o diretor destrincha vários temas recorrentes em sua carreira como fé, ciência, família e a impotência diante do desconhecido. Tudo carregado de uma pitada de humor bizarro, que acaba não funcionando em boa parte do tempo. O que é compensando pela imensa habilidade de Shy em construir cenas angustiantes, vide toda a sequência na casa da tenebrosa Sra. Jones (Betty Buckley). Se a Dama na Água foi uma resposta incompleta, aqui ele decide ignorar todas as críticas e brincar com o bizarro, o absurdo e com o desespero dos seres humanos para se manterem vivos. Uma pena que ele tenha decidido ignorar também o desenvolvimento de seus personagens. Seria Fim dos Tempos um filme B que se leva a sério ou filme sério que resultou em algo escrachado? Um dia teremos essa resposta.
A Vila (2004)
Em termos cronológicos, é aqui que público e crítica rompem a relação de amor com o diretor. Apesar de também acreditar que estamos diante de outra obra bastante incompreendida. Não é culpa de Shyamalan que, no calor do momento, tenham decidido batizá-lo com a alcunha de “novo Hitchcock”. Sempre esperando um plot twist de arregalar os olhos. Nesse projeto, ele deixa claro que não é um diretor de gênero, mas sim de temáticas. E um artista na hora de mesclar o sobrenatural com a razão, o suspense com o romance. Conduzindo com maestria a narrativa, Shy consegue criar uma atmosfera claustrofóbica e ao mesmo tempo charmosa. Nunca explorando demais o roteiro, trabalhando junto com a inteligência do espectador e instigando sua curiosidade. Tudo com o auxílio da hipnotizante trilha sonora de James Newton Howard. Infelizmente, ele peca justamente quando decide se render a necessidade de causar o tão esperado impacto. Destaques para Bryce Dallas Howard (em seu primeiro grande papel) e Joaquin Phoenix, novamente ao lado do diretor.
A Visita (2015)
Após passarmos pelos filmes que fizeram de M. Night Shyamalan uma figura controversa na indústria, chegamos naquele que marcou o seu aguardado retorno. E mais do que isso, trazendo um ar de vitalidade para um subgênero pra lá de desgastado: o found footage. Com mais liberdade e um orçamento apertado, o diretor investe tudo na construção da atmosfera e no talento de seu elenco. Destaque total para Deanna Dunagan, responsável por algumas das cenas mais angustiantes dos últimos anos. Outro mérito de Shyamalan é a forma como subverte a utilização da câmera no já enfadonho subgênero, fazendo dela a protagonista e não uma mera ferramenta para sustos forçados. Além de melhorar bastante a forma como utiliza o humor escrachado, enquanto aproveita para dar outra aula de como mesclar o realismo com uma aparente vertente sobrenatural. Garantido um plot twist para lá de satisfatório.
Fragmentado (2016)
Com o sucesso de A Visita, Shyamalan conseguiu a confiança e o investimento da Blumhouse Pictures para financiar a maior ambição de sua carreira. Com o pontapé inicial dado pelo longínquo Corpo Fechado, aqui o diretor retorna para o mundo das HQ’s. Deixando um pouco a sobriedade do primeiro longa de lado, Shy opta pela imersão no fantástico. Mesmo que tenha a ciência como ferramenta de auxílio. Claro, essas características só ficam evidentes depois da inesperada participação de Bruce Willis. O que temos no primeiro momento é a construção de um ambiente claustrofóbico, amparado por ótimas atuações e o já conhecido talento do diretor para trabalhar cenas enervantes. Durante toda a duração do filme, Shyamalan brinca com o psicológico do espectador, graças a aura de incerteza gerada pelo trabalho de James McAvoy. Mesmo com certos exageros no terceiro ato, o diretor não perde a mão e prepara o terreno para um dos filmes mais aguardados do semestre.
Corpo Fechado (2000)
Apesar das inúmeras aventuras cinematográficas pelo mundo dos quadrinhos, esse ainda é um dos filmes que melhor compreende a alma de um super-herói. Quando ainda possuía seu toque de Midas, M. Night Shyamalan fez de Corpo Fechado uma excursão pelo desenvolvimento de personagens. Pouco preocupado em acelerar o ritmo do longa, o diretor abre mão de cenas de ação para focar em seus protagonistas e como suas peculiaridades afetam suas vidas. Não existe o glamour no momento em que Bruce Willis toma conta de suas habilidades, quase encarando como uma maldição. Enquanto no outro espectro, Samuel L. Jackson se apega a essa possibilidade como uma forma de aceitar sua condição. Consciente de seus passos, Shyamalan entrega um filme maduro e uma relação entre herói e vilão extremamente rara nos atuais exemplares do gênero.
Sinais (2002)
Apesar de receber a medalha de prata da lista, Sinais é outro filme que desperta debates até hoje. Existem o que enxergam todas as qualidades da fita e aqueles que a desprezam quase por completo. O que M. Night Shyamalan faz aqui é algo digno de reconhecimento. Utilizar uma invasão alienígena como pano de fundo para contar uma história repleta de simbolismos e metáforas religiosas não era algo que se via direto. Indo na contramão de grandes cenas de explosão, o diretor prefere focar na família em questão e como ela encara situações aterrorizantes. Não é pra menos que as principais cenas de tensão se passam em pequenos espaços. E como não lembrar da icônica cena da aparição de um extraterrestre em terras tupiniquins, arrepiando a espinha de todo mundo. Destaques também para as atuações de Mel Gibson e Joaquin Phoenix.
O Sexto Sentido (1999)
O supra sumo de toda a carreira de M. Night Shyamalan. O filme que lhe rendeu todas as glórias, mas que o atormentaria por todas as produções seguintes. Um show raro de construção de ambiente, tensão e desenvolvimento narrativo. Um mistério que é espalhado em pequenos pedaços pela tela, como um angustiante quebra-cabeça. Tudo preparado para ser despejado na cabeça do espectador, numa verdadeira explosão sensorial.
E aí, gostou da lista? Concorda com as posições ou trocaria os filmes de lugar? Deixe sua opinião nos comentários. E não esqueça, Vidro chega aos cinemas brasileiros no dia 17 desse mês.