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Porém Bruxa, de Carol Chiovatto (AVEC Editora) | Crítica

Porém Bruxa, de Carol Chiovatto, foi uma grata surpresa entre minhas leituras neste início de 2020. O romance (lançado em 2019 pela AVEC Editora) também é a estreia da autora, que já havia publicado alguns contos anteriormente.

A história acompanha Ísis Rossetti, uma bruxa que tem como trabalho monitorar eventos sobrenaturais ocorridos em São Paulo, o que não é das tarefas mais fáceis devido ao tamanho do município (estamos falando de uma das maiores cidades do mundo) e suas particularidades. Proibida de usar magia em casos estritamente civis, ela precisa se conter constantemente para não desagradar a implacável corregedoria do mundo bruxo. Mas como não ajudar as pessoas quando você possui poder para isso?

A construção da protagonista é um dos grandes pilares desta obra. Ísis é uma pessoa maculada por eventos anteriores aos da linha temporal presente apresentada, tendo junto a isso uma combinação de atributos que formam uma personagem interessante, seja pelo seu caráter moderno (sexualidade, empoderamento e outras posturas progressistas e liberais) ou mesmo por um clássico sentimento de heroísmo que ela transmite.

Esse cuidado se estende aos coadjuvantes do livro, no qual temos minorias representadas e subjetividade em cada uma dessas figuras.

A fantasia de Porém Bruxa

Carol Chiovatto conta a história de Porém Bruxa seguindo uma estrutura muito honesta e segura, sem deixar pontas soltas. A fantasia se apresenta gradualmente, com pequenos reforços aqui e acolá sobre como funciona o que. Os capítulos não se alongam muito, e os casos investigativos estão bem desenhados, sem ganhar superficialidade pelo didatismo. Parece ser um acerto para um romance de estreia, mas ao mesmo tempo a autora demonstra bastante repertório e conhecimento dentro da fantasia e ficção que está criando. Essa dinâmica faz desta uma leitura versátil, então indico tanto aos que leem mais de um livro quanto aos que só começam um novo depois de terminar o atual.

Vale mencionar que Porém Bruxa não é um puxadinho de Harry Potter, ou qualquer coisa do tipo. Não que Carol recuse inspirações de outras franquias, na verdade ela até insere piadas referentes a isso na trama. Há tipos de bruxos e fontes diferentes de magia, que seguem uma hierarquia que acompanhamos pelo ponto de vista da protagonista.

Também corrobora com essa saudável distância de sagas conhecidas a inserção de outras religiões (como as de matriz africana) no balaio sobrenatural. Indo além, a trama irá abordar uma faceta pertinente das igrejas neopentecostais, que andam em alta pelo Brasil.

carol chiovattoOutro fator que torna esse romance algo autêntico é sua ambientação. Ísis é uma protagonista que usa todos os recursos logísticos disponíveis em São Paulo, sendo muito interessante ver ela transitar entre os bairros, lidando com questões únicas de quem vive no local. Hábitos tipicamente paulistanos (como não ter dia definido para comer uma pizza) são devidamente preservados. A inserção dos elementos de magia e investigação neste contexto trouxe qualidade à narrativa.

Logicamente, esse elogio vem de alguém que mora por essas bandas e gosta muito de São Paulo (ciente de que não se trata de uma cidade fácil).

Conhecida por trazer grandes trabalhos (principalmente do segmento steampunk) ao mercado literário, a AVEC Editora acerta demais com esse lançamento, trazendo uma autora jovem e promissora que domina bem os temas que trabalha na história.