Silêncio Bruto filme Hugo Bonemer Crédito fotográfico – Lírica Aragão Silêncio Bruto filme Hugo Bonemer Crédito fotográfico – Lírica Aragão

Silêncio Bruto traz protagonista e diretor surdos

A ideia de Silêncio Bruto surgiu em 2020, quando o diretor João Gabriel Kowalski ouviu histórias de pessoas surdas que eram vítimas de golpes. Foi então que percebeu que as produções que abordam a surdez traziam quase sempre em seus personagens apenas características que focavam nas dificuldades que passam no convívio com a sociedade. Visto isso, decidiu produzir um curta-metragem no qual a língua ficasse em segundo plano, invertendo a balança social. Silêncio Bruto” nãé sobre surdos, mas sim de pessoas, ações e consequências e que possuem tal condição.

– Estamos acostumados a assistir nos cinemas uma representação dos surdos como pessoas frágeis, que vivem em função dessa condição. Então procurei mostrar o outro lado, trazendo uma protagonista que resolve enganar uma pessoa ouvinte, mostrando que a sua condição não limita ninguém a nada, ou pelo menos não deveria – detalha Kowalski.

A história acompanha Verônica (Karolina Halona), que vai à concessionária vender seu fusca e os trabalhadores ali são extremamente grossos com ela, e tentam inclusive passa-la para trás. Então vemos que nem tudo é o que parece, e que ela nãé tão ingênua assim. O elenco ainda conta com Léo Castilho, Beto Catejon, Isadora Maria, Hugo Bonemer e Gustavo Gerard.

– A ideia sempre foi colocar os surdos numa posição de destaque, de protagonista ativo. Evitar mostrar o cotidiano e o que ela acaba sofrendo, revertendo a história, onde é possível termos esses personagens em situações que não estamos acostumados a ver. Infelizmente existe esse estereotipo de coloca-los como incapazes, e que se aproveitar deles é algo fácil. O filme serve pra quebrar esse tabu – relata.

Uma das principais inspirações para o filme está presente na vida do diretor; Beto, primo surdo de sua esposa. João conta que, quando começou a escrever o projeto, teve consciência de que era necessário aprender libras, a língua dos surdos, e foi Beto quem o ensinou.

– O conheci em 2014, ou seja, passei 24 anos da minha vida sem nunca ter falado com uma pessoa surda, e isso em um país onde aproximadamente 5% da população se comunica atravéde libras. E o Beto me ensina muito, não apenas libras, mas sobre tudo. Durante as aulas sempre abordamos temas relacionados ao cinema, para levar estes as gravações. Antes de produzirmos o curta, levei a ele uma lista de palavras que eram necessárias para me comunicar com parte da equipe, que é surda – conta.

Escolher a equipe para contribuir na produção não foi ao acaso. Para Kowalski não basta apenas abordar o tema, mas sim inclui-lo na rotina de gravações. Por isso, grande parte da equipe possuía surdez, como a protagonista Karolina Halona, e João Gabriel Ferreira, co-diretor, que comenta a importância dessa representação.

– Nos olhos da sociedade sou uma pessoa com deficiência, aos olhos da comunidade surda veem meu nome. No filme vemos cada personagem surdo com personalidades diferentes: temos o nerd, o gay, uma vingadora, todos surdos. São pessoas comuns, que expressam seus pensamentos e sentimentos através da língua de sinais. A única diferença é a forma como nos comunicamos – menciona João Gabriel Ferreira.

Representando também a comunidade surda, a produção contou com Isabela Ferreira na equipe de arte, Pedro Volpato na produção e Alan Gaitarosso como produtor executivo, ouvinte que ministra cursos de teatro em libras na cidade de Maringá. Além da protagonista, quase todo o elenco é formado por pessoas surdas, então o set foi adaptado para que a comunicação entre eles e ouvintes se dessem da melhor maneira possível, como o uso de interpretes.

– O mais empolgante foi ver a reação de todos eles no set. Eram quase 40 pessoas que traziam uma energia incrível, emocionados com tudo aquilo. A minha reação com o diretor foi única, pois tínhamos um pensamento semelhante em relação ao resultado que queríamos alcançar, que era trazer essa inclusão para além das câmeras – cita Ferreira.

Há ainda um projeto em desenvolvimento para transformar o filme em um longa-metragem. Dessa vez quem assume o roteiro ao lado de João, é Fernanda Oliveira, também surda.

Enxerguei a necessidade de transformar a história em um longa porque estes personagens possuem camadas que não foram mostradas em sua totalidade. Estamos escrevendo situações e momentos de que justamente desencadeiam uma grande história de vingança e transformação. Será a mesma premissa do curta, com uma profundidade ainda maior – finaliza o diretor.

Silêncio Bruto” é um curta-metragem dirigido por João Gabriel Kowalski e João Gabriel Ferreira, com roteiro de Gustavo Gerard e Kowalski. O projeto foi contemplado pelo Edital Aniceto Matti da Prefeitura de Maringá.