Que O Exorcista (1973) foi (e é) um sucesso cinematográfico não é mistério. Apesar de hoje em dia não dar tanto medo em muita gente – principalmente se você vive no Brasil -, não deixa de ser um dos marcos do cinema de terror e nenhum outro filme conseguiu fazer o que ele fez – a maioria nem tenta. Mas alguém decidiu levar para a frente o projeto de uma continuação direta do clássico, nascendo, assim, uma das maiores bombas cinematográficas já feitas: O Exorcista – O Devoto.
A ideia para esse novo longa é interessante, em que ao invés de termos somente uma garota possuída, aqui são duas, as jovens Katherine (Olivia O’Neill) e Angela (Lidya Jewett). Logo no início, vemos o pai de Angela, Victor (Leslie Odom Jr.), perder a esposa, que estava grávida da filha deles. A narrativa pula treze anos, com as duas garotas fazendo um ritual para que Angela pudesse conhecer a mãe.
Três dias depois, elas são encontradas em um celeiro, assustadas, com os pés em carne viva e sem entenderem que tinham se passado dias e não horas desde os seus sumiços. O roteiro, aqui, tinha tudo para enveredar por caminhos bem perturbadores de forma criativa, criando uma identidade própria. Porém, contudo, todavia, entretanto, O Exorcista – O Devoto não só se pendura horrores na nostalgia, como parece que pegaram o original e jogaram no liquidificador junto com um monte de ideias patéticas e retrógadas e fizeram nascer o roteiro deste, que tenta superar O Exorcista original.
O diretor (também roteirista), David Gordon Green, soa indeciso em muitos pontos sobre para onde levar a história de O Exorcista – O Devoto, querendo pôr coisas demais de forma afoita e esquecendo de desenvolvê-las de forma harmônica. A narrativa não para de tomar decisões burras, colocando personagens para agirem das maneiras menos coerentes possíveis, tentando forçar uma direção na trama que não ficou natural e nem orgânico, soando completamente artificial, tudo para enfiar falas genéricas em personagens unidimensionais e sem graça – e olha que o elenco se esforçou para que desse certo, mas nem boa atuação aqui salvou.
Há um esvaziamento de significados aqui, que tenta explorar demais explorando menos, sem o aprofundamento necessários para assuntos sérios que teriam sido interessantíssimos de acrescentar à história de O Exorcista – O Devoto, e com um viés de beirava diversas intolerâncias – porém, fingindo pagar de “desconstruidão”. Por exemplo, ele traz religião de matriz africana para a mesa, mas ao longo da narrativa, fica parecendo mais picaretagem que os pais concordam em usar por conta do desespero do que qualquer outra coisa.
Aliás, a cena do exorcismo das garotas é uma bagunça de religiões, sendo a católica bem reverenciada como a peça central para se expulsar um demônio, mesmo que a própria história tenha, em determinado momento, um discurso longo sobre como existe exorcismo em todas as religiões inimagináveis. Além de tudo, O Exorcista – O Devoto, ainda se contradiz.
Papo de coach é uma coisa que não falta na trama, com várias ocasiões servindo de palco para discursos longos e explicativos, em que, cometendo um erro de principiante, passamos a não enxergar mais o personagem falando, e sim quem escreveu tais falas artificiais e genéricas, tentando passar diversas mensagens que são encaixadas em vários espaços no decorrer da narrativa de formas desnecessárias e enfadonhas, quem em nada acrescentam à trama, mas que tentam soar como o pináculo da sabedoria.
A maquiagem não tá lá muito boa. Os atores se esforçam, mas são tão artificiais os diálogos e as suas falas que não adianta muito o quanto tentem, simplesmente não dá. Nem lembro se a fotografia tá boa ou não, porque muitas cenas são envoltas de uma cacofonia sobreposta de flashes e sons, a câmera às vezes parece estar sendo usada por uma barata tonta. E para não dizer que a trilha sonora é extremamente esquecível, temos uns cinco segundos do medley da música que é o carro-chefe do filme original. E só.
No fim das contas, O Exorcista – O Devoto não passa de um filme genérico, perdido, indeciso, que se apoia na nostalgia para segurar o expectador ao enfiar coisas como a personagem Chris MacNeil (Ellen Burstyn) – conhecida como a mãe de Regan – no meio da história para… absolutamente nada além de ser a ponte entre a continuação e o seu predecessor, e também ser a desculpa perfeita para Linda Blair fazer uma pontinha (Eu espero que a Ellen Burstyn tenha ganhado uma boa grana para aparecer neste filme).
Em absoluto, não vale uma ida ao cinema, nem mesmo para assistir em casa no conforto do seu sofá. Não é um filme ruim que se torna bom, é um filme ruim que, além de ruim, é enfadonho e irritante nas suas tentativas.
E trago a questão principal aqui para quem souber responder: quem diabos é o devoto?