Democracia em Vertigem é, literalmente, o Brasil no Oscar | Crítica

Nossa democracia no centro do cinema capitalista representando o cinema brasileiro. Petra marca o documentário nacional

Demorei algum tempo para assistir ao documentário longa-metragem Democracia em Vertigem, da diretora brasileira Petra Costa. Quem me conhece mais de perto sabe que não gosto de assistir ou ver algo pelo movimento da unanimidade. Hoje, comicamente, chamada de “modinha”. Deixei os ventos das doutrinas do “você tem que assistir” e do “não assista esse filme tendencioso” passarem pelos meus ouvidos sem grandes prejuízos. Não ao filme, mas a mim mesmo que poderia ter uma visão distorcida pelo seu quente lançamento na Netflix.

Há umas duas semanas, duas antes do anúncio dos indicados ao Oscar, eu já estava livre das amarras do imediatismo e resolvi assistir ao Democracia em Vertigem. Quero aqui não me deter aos clichês e obviedades já analisados por centenas de boas críticas e de posts rasos de twitteiros alheios. Quero compartilhar com você as experiências de assistir ao encanto de um documentário com alma.

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Petra Costa é genuína em “Democracia em Vertigem”

Petra Costa, com a experiência vivida em suas outras produções, possui uma fantástica capacidade de trazer um assunto para tão perto de si que se confunde com sua própria vida. Só que no Democracia… seus objetos e personagens são comuns a nós brasileiros. Comuns a história do brasil recente, contemporânea e ainda em ebulição.

Utilizando de recursos como imagens de seu arquivo pessoal, sua própria voz em off narrando alguns argumentos e fatos em primeira pessoa,  os bastidores de seu próprio documentário, Petra se salva, ao meu ver, das análises pequenas de um filme de denúncia golpista, Lula Livre ou de esquerda. Petra é direita, é honesta e justa consigo mesma.

Uma vez ouvi de uma produtora que um filme/série só é um sucesso se você conseguir responder com potência e razão a pergunta: “por que tesó você tem que contar essa história?” Petra, como pedra certeira, acerta o alvo como ninguém, porque apenas ela poderia contar essa história da maneira que contou.

Você pode ter pontos de vista completamente diferentes do que a diretora do filme, assim como eu mesmo tenho. Você pode, e até deve, não concordar com tudo. Afinal, nunca se falou tanto em diversidade, em multiplicidade de raças, culturas, opções, escolhas, mas quando o assunto é política temos que ser A ou B. Por onde andaria a diversidade de pensamento? Porém, apenas os livres da cegueira clubística perceberam que uma palavra nos une: Vergonha. Vergonha pelo momento que passamos!

Nossa democracia está no Oscar 2020. Único filme indicado, na categoria “menos prestigiada” pelos generalistas amantes do cinema: Melhor Documentário. Ironicamente, Democracia em Vertigem é o Brasil no Oscar. A mais prestigiada premiação do cinema americano, e por capitalística consequência mundial também, é sim um evento político. Mas a capacidade de Petra é tanta, que enganam-se os partidários de que o filme só está no Oscar por se tratar de um momento tão tenso em nossa sociedade.

Democracia em Vertigem é um dos grandes documentários já produzidos no Brasil e no Mundo, por um simples e profundo motivo: ele é extremamente genuíno. Sobre ser ficção? Até gostaria que fosse, mas um documentário é sempre uma leitura da realidade, quer você goste dela ou não.