O Homem nas Trevas: o que os olhos não veem…

Uma cidade tomada pela crise financeira, um bairro praticamente abandonado que tem como único morador um velho herói de guerra que perdeu a visão durante um combate e a filha em um acidente e um trio de amigos que ganham a vida roubando casas. Esses são os elementos principais de O Homem nas Trevas, suspense dirigido por Fede Alvarez. Caso não tenha reconhecido o nome do diretor, ele foi responsável pelo controverso remake de A Morte do Demônio. Trabalhando novamente ao lado de Sam Raimi e Robert Tapert, Fede entrega, de longe, o filme mais claustrofóbico do ano. E isso é muito sério.

Na trama, o trio de ladrões formado por Rocky (Jane Levy, que trabalhou com Alvarez em A Morte do Demônio), Alex (Dylan Minnette) e Money (Daniel Zovatto) acham que encontraram o serviço de suas vidas quando decidem invadir a casa de um aparente homem cego e indefeso (Stephen Lang). Quando sua filha perdeu a vida em um acidente, ele recebeu uma indenização milionária, dinheiro suficiente para que os jovens mudassem de vida e de cidade. Mas quando decidem agir, eles descobrem que as aparências enganam. É nesse momento que Alvarez mostra todo o seu talento.

O uruguaio sabe como construir uma trama tensa, com ótimos jogos de câmera, casando bem as circunstâncias apresentadas com uma trilha sonora e edição de som de alta qualidade. Tudo em uma crescente, sem muitas enrolações no começo, o que garante tempo de sobra para desenvolver as situações mais aterrorizantes. Valendo-se do título original (Don’t Breathe), o longa faz com que o espectador realmente prenda a respiração em alguns momentos. Transportando bem o clima apresentado em tela para dentro da sala de cinema.

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O Homem nas Trevas foge, em determinados momentos, das muletas utilizadas pelos recentes filmes de terror pipoca. Suas melhores nuances surgem na ausência de trilha sonora, onde o silêncio passa a ser um elemento crucial. Respirar o mínimo possível, tomar cuidado onde pisa ou no que se toca. Tudo isso em um ambiente claustrofóbico. Se nas casas de filmes de terror as coisas voam de um lado para outro e as portas passam a noite batendo, aqui uma simples tábua solta é motivo de tensão e pânico. Como escapar do habitat de um predador capaz de localizá-lo pelo menor ruído emitido?

O trabalho do elenco também é digno de nota. Sthepen Lang está excelente em seu papel. Soturno, intimidador, implacável e com uma presença física e vocal de causar arrepios em qualquer um. Jane Levy é outra que se destaca. Cada vez mais a atriz vai fugindo do rótulo de mocinha e aqui entrega uma personagem forte, que luta até o último segundo para fugir daquela situação. A mão de Fede Alvarez também pode ser sentida nesses momentos, mas não apenas na forma de conduzir os atores.

O diretor utiliza alguns truques que contribuem de forma efetiva para os momentos de tensão. Lang usou um par de lentes que restringiam sua visão e que davam a ele uma aparência ainda mais assustadora no escuro. Já os outros atores ganharam lentes que emulavam pupilas dilatadas e que no escuro parecia que não estavam enxergado nada de fato. Isso acaba gerando uma das melhores sequências do longa.

Dylan Minnette;Stephen Lang

O ponto alto do roteiro escrito por Fede e Rodo Sayagues é brincar com a ideia de mocinho e vilão. Não existe um santo, o herói que vai salvar o dia. Todos estão enfiados na sujeira até o pescoço. Cabe ao público escolher um lado para torcer e acredite quando eu digo que essa torcida vai mudar bastante durante o filme. Existem reviravoltas surpreendentes na trama, algumas bem impactantes.

O grande problema de O Homem nas Trevas reside na sua reta final. O filme é certeiro em sua proposta: prende o espectador, mantém um ótimo nível de tensão durante boa parte do tempo, é chocante, tem cenas intensas de perseguição e luta. Mas escolhe uma saída, na falta de palavras melhores, mais leve do que foi apresentado durante todo o tempo. Talvez faltou um pouco de coragem para ir além, o que colocaria o longa em um outro patamar.

Mesmo assim, O Homem nas Trevas é um suspense de ótima qualidade e que vale o preço do ingresso cada vez mais alto. E lembre-se: em terra de cego, quem tem olho luta para sobreviver.