Crítica | Me Chame Pelo Seu Nome

Itália dos anos 80 é cenário para história de amor e autodescoberta que conquista por sua autenticidade

Na mitologia grega, Helius, ou Hélio, era o nome dado à representação divina do sol, encarregada de levar luz e calor aos homens. E essa vivacidade é simbolizada pelo jovem Elio, protagonista do novo filme de Luca Guadagnino (de Um Sonho de Amor e Um Mergulho no Passado), que se descobrindo apaixonado, anseia ser a principal luz de seu objeto de desejo, assim como ter seus dias iluminados por este.

Baseado no romance do escritor egípcio André Aciman, Me Chame pelo Seu Nome conta a história de amor entre Elio (Tymothée Chalamet) e Oliver (Armie Hammer). Aluno do Sr. Perlman (Michael Sthulbarg), pai do protagonista, Oliver vem passar algumas semanas de estágio na casa de veraneio do professor ao norte da Itália, despertando em Elio um até então desconhecido sentimento.

Não à toa ter sido escolhida como cenário para o romance – que se passa durante o verão de 1983, remetendo a uma saudosa memória do passado –, a idílica Itália do filme pode ser percebida como uma espécie de paraíso, onde a vida transcorre em perfeita harmonia, com a sugestão de que o sentimento aflorado por ambos, visto pela sociedade como algo subversivo,  seria o “fruto proibido” a ser evitado. Um “paraíso” por sinal que ganha uma paleta de tons quentes nas mãos do diretor de fotografia Sayombhu Mukdeeprom, que reforça a sensação de um ambiente perfeitamente favorável ao despertar de grandes paixões.

Retratado como um jovem maduro para sua idade mas ainda se descobrindo em relação ao que sente, Elio, que no processo também se vê envolvido com uma bela garota local (Marzia, interpretada por Esther Garrel), aos poucos é consumido pelo novo sentimento. Reparem como inicialmente ele tenta relutar o que está sentindo ao dizer aos pais que percebeu no convidado uma certa arrogância. Com isso, fica a sugestão de que, muito mais do que uma história de amor, o filme trata sobre a autodescoberta.

Sem pressa em acelerar os acontecimentos, o diretor italiano estabelece uma rotina que, mesmo se mostrando repetitiva – Guadagnino poderia ter enxugado um pouco seu filme obtendo ainda assim o mesmo resultado –, acaba por tornar a aproximação entre Elio e Oliver algo extremamente autêntico. Essa autenticidade é acentuada graças ao excelente trabalho dos atores. Hammer (A Rede Social e O Agente da U.N.C.L.E.) convence como alguém muito seguro de si que, em determinado momento, deixa transparecer a vulnerabilidade que traz o amor. Enquanto isso, Chalamet (Interestelar) – que por sua atuação recebeu uma merecida indicação ao Oscar – consegue ser a perfeita tradução de um jovem na flor da idade que passa por um momento de profundas descobertas.

Habilidoso ao construir uma relação palpável, que surge não apenas da atração física mas também pela admiração intelectual mútua que os dois passam a nutrir um do outro, a adaptação é feliz ainda ao evitar clichês. Diferente de outros filmes, uma das grandes belezas do longa reside em não se prender em preconceitos de personagens secundários ou sentimentos de culpa que porventura poderiam surgir entre os protagonistas. O foco é no romance, que é mostrado de forma natural, pouco importando se eles são pessoas do mesmo sexo.

Com quatro indicações ao Oscar deste ano, incluindo melhor filme, Me Chame pelo Seu Nome é um trabalho delicado que, se aparentemente parece despretensioso, ainda assim funciona como uma verdadeira bandeira contra a intolerância. Especialmente pelo belíssimo monólogo de um dos personagens próximo ao fim do filme. Acredite, só essa cena paga o ingresso.