Colagem de Livros bestiário criativo enéias tavares Colagem de Livros bestiário criativo enéias tavares

10 LIVROS EM PORTUGUÊS PARA TURBINAR SUA ESCRITA

Quais são os livros publicados no Brasil sobre escrita criativa? Como melhorar seus personagens, sua narrativa e suas cenas? Há livros que tratam da diferença entre enredo e estilo? Neste Bestiário Criativo especial, Enéias Tavares comenta dez livros sobre escrita de ficção publicados em português que vão te ajudar a tirar sua história da gaveta!

O Bestiário Criativo chega em 2019 com várias novidades. Além da versão em livro, que começamos a preparar com vários conteúdos exclusivos, teremos seções especiais que serão publicadas aqui. Como um pedido recorrente dos leitores é a indicação de livros sobre Escrita Criativa em língua portuguesa, separamos 10 livros básicos e altamente recomendados, dedicados à criação literária e publicados em nossa língua.

Apesar desses livros não tratarem diretamente de literatura fantástica, eles discutem enredo, conflito, personagens, ambientação, formação e estilo, muitos dos problemas que debatemos aqui com os mais de 40 autores da coluna. Aos que chegaram agora, podem acessar o sumário do nosso curso e começar a criação de seus mundos insólitos… agora! Aos nossos leitores e/ou interessados nas indicações, vamos a elas:

1- SOBRE A ESCRITA – Stephen King (Suma, 2013)

Esse é o top da lista por uma razão simples. A meu ver, ele compreende tanto comentários profundamente estimulantes para jovens escritores como também macetes essenciais àqueles que estão batalhando com seus textos, tanto no que concerne à estrutura quanto à linguagem e estilo. Como veremos, vários são os livros que tratam de questões de conteúdo e raros aqueles que enfrentam a seara da escrita em si e de seus aspectos formais. King faz isso e muito mais, com relatos bem pessoais, metáforas mais do que válidas – como a da Caixa de Ferramentas – e cópias dos manuscritos de sua ficção com marcações de preparação e correção.

2- A JORNADA DO ESCRITOR – Christopher Vogler (Aleph, 2015)

Livro essencial para qualquer autor ou autora, A Jornada do Escritor parte das ideias de Gustav Jung e Joseph Campbell sobre estruturas míticas e as reinterpreta no âmbito dos grandes heróis cinematográficos do século XX. Numa versão belamente ilustrada da editora Aleph e com tradução de Petê Rissatti, trata-se de um grande auxílio para a compreensão da matemática ficcional, detalhando enredos, personagens, antagonistas e conflitos. A única ausência sentida é o fato de Vogler não discutir em profundidade questões sobre escrita e estilo, dedicando-se mais a exemplos cinematográficos e ao planejamento da história.

3- PARA LER COMO UM ESCRITOR – Francine Prose (Zahar, 2008)

Numa direção oposta ao livro de Vogler, a professora de escrita criativa e escritora norte-americana Francine Prose está mais interessada em questões bem específicas da linguagem literária, dedicando-se a assuntos nem um pouco óbvios como palavras, frases, parágrafos, cenas e diálogos, entre outros temas que são dissecados nos seus onze capítulos a partir de exemplos de grandes autores do ocidente, tanto do passado quanto do presente. O livro é um misto de análise literária e sugestões mais que bem-vindas sobre aprendizado e criatividade narrativa. Após Prose, nunca mais você lerá um texto literário do mesmo jeito.

4- A ARTE DA FICÇÃO – David Lodge (L&PM, 2009)

Ainda mais específico que os anteriores, o romancista e crítico inglês reúne nessa coletânea 50 diferentes textos sobre a arte romanesca, sempre partindo de um excerto literário ilustrativo. Aqui, encontramos debates sobre começos e fins, narrativas epistolares ou experimentais, polifonia narrativa, nomes de personagens, fluxo de consciência, ambientação espacial e manipulação temporal, entre outros tópicos que irão ajudar jovens autores a aprimorar sua arte. Os capítulos curtos podem ser consultados e lidos fora de ordem, de acordo com interesses específicos. Um acréscimo é a bela tradução de Guilherme da Silva Braga, grande tradutor de Lovecraft.

5- COMO FUNCIONA A FICÇÃO – James Wood (Cosac Naify, 2011)

Wood discute uma série de dispositivos que diferenciam a narrativa do século XIX, mais detalhista e interessada em construir uma determinada visão de mundo, da narrativa mais ágil e dinâmica que marcaria boa parte do século XX. Para ele, esta teria começado ainda em Flaubert. Apesar de apresentar uma tese no mínimo ousada e um tanto frágil, sobretudo pelo generalismo de algumas observações, trata-se de um livro bem instigante e que nos faz pensar em questões mais específicas da narrativa, como construção de cenas, pontos de vista, diálogos e linguagem. Os capítulos curtos e a diagramação e design lúdicos, baseado em roldadas e rodas, além da cor azul do texto, tornam a leitura fluida e convidativa. Como Prose e Lodge, trata-se de uma leitura mais intermediária, indicada a quem já leu os manuais mais básicos sobre o tema.

6- OS SEGREDOS DA FICÇÃO – Raimundo Carrero (Agir, 2005)

Baseado nos anos de prática como escritor e da experiência como professor de Escrita Criativa do pernambucano Raimundo Carrero, este é um livro igualmente introdutório e denso. Seus capítulos curtos discutem tanto motivações iniciais e ideias embrionárias quanto questões mais complexas como narrativa, cena e diálogo. Dividido em duas partes, uma dedicada a processo criativo e outra à construção de personagem, é um livro instrutivo, mas por vezes um tanto abstrato demais na sua discussão sobre o criador e sua arte. O fato de ser o único livro de escrita criativa brasileiro evidencia que há muito ainda a se construir nesse terreno.

7- SEGREDOS DO ROMANCE POLICIAL – P.D. James (Três Estrelas, 2012)

Não sendo bem um livro sobre escrita e mais um guia sobre o gênero policial, a reflexão da autora inglesa acaba por resultar em um completo e bem-vindo estudo sobre os principais elementos que compreendem a narrativa de mistério, seus heróis e antagonistas, além dos enigmas que volta e meia apresenta. O livro acaba também servindo como um bom guia para se descobrir autores, autoras e obras, sendo que muitos dos nomes citados, infelizmente, ainda são inéditos em nosso país. Com uma pegada mais historiográfica, a linguagem de James é leve e divertida e o livro pode ser lido numa sentada, de preferência numa fria noite de inverno.

8- O FANTÁSTICO – Filipe Furtado (Dialogarts, 2017)

Tendo por subtítulo “Procedimentos de Construção Narrativa em H. P. Lovecraft” e sendo o único livro essencialmente acadêmico da lista, a crítica do estudioso português Filipe Furtado é uma aula sobre as estratégias narrativas do autor de Providence, mapeando de uma forma esquemática sua construção de conflito, a natureza de seus heróis e a estrutura tríade de boa parte de sua ficção. Além disso, o livro apresenta textos introdutórios assinados por Flavio García, Júlio França, Claudio Zanini e Alexander Meireles da Silva, grandes estudiosos do fantástico em nosso país. Indicado tanto para fãs de Lovecraft quanto a interessados em procedimentos de construção ficcional.

9- GUIA DE ESCRITA – Steven Pinker (Contexto, 2014)

Livro dedicado a questões de linguagem, de escrita e aos efeitos produzidos por textos bem e mal escritos. Com o subtítulo “Como conceber um texto com clareza, precisão e elegância”, Pinker traz exemplos e tabelas contrastantes de diferentes versões textuais que funcionam como bons exemplos de preparação e revisão textual. Voltado especialmente a acadêmicos que estão batalhando com seus textos científicos e/ou de popularização da ciência, é indicado também para os que desejam melhorar sua escrita ficcional. Como é raro encontrar textos voltamos a tal tema, indico fortemente e agradeço ao Diego Renzi pela indicação.

10- OFICINA DE ESCRITORES – Stephen Koch (Martins Fontes, 2008)

Finalizo as indicações com meu segundo livro favorito da lista, apesar dos outros oito serem especiais e também recomendados por diferentes razões. Lado a lado, King e Koch formam uma dupla imbatível enquanto textos estimulantes e introdutórios à arte da ficção. Resultado de sua famosa oficina de escrita criativa, temos aqui uma progressão desde a ideia inicial, passado pela construção do enredo e do conflito, com especial ênfase à criação de personagens, até o desenvolvimento de um estilo e o exaustivo trabalho de revisão. Tendo grande influência sobre o curso de Escrita de Ficção que ministro na UFSM e nas doze partes que constituem o Bestiário Criativo, Koch é um professor de mão cheia, dando-nos sugestões valiosas para nossas estórias.

Obviamente, essa lista não é completa. No entanto, das coisas que eu conheço, ela reúne boa parte da bibliografia sobre escrita criativa publicada no Brasil. Do que não foi publicado, entre eles os livros de Jeff Vandermeer, Wonderbook e Booklife, além de outros, serão o objetivo da próxima coluna, esta sim dedicada a obras de escrita criativa fantástica. Um abraço a todos e boas leituras, aventuras & escritas, além de um feliz 2019!

___

Enéias Tavares, o autor desta coluna, é o criador de Brasiliana Steampunk (Editora LeYa) e coautor de Guanabara Real (Editora Avec), duas séries ambientadas em um Brasil retrofuturista. É um dos coordenadores do projeto Bestiário Criativo na UFSM, onde ensina Literatura Clássica. Nas poucas horas vagas, escreve, caminha e pesquisa a História da Literatura Fantástica no Brasil, junto de Bruno Anselmi Matangrano, para o projeto, exposição e livro Fantástico Brasileiro. De quadrinhos, publica ao lado de Fred Rubim, A Todo Vapor!, uma Webcomic semanal co-produzida pelo CosmoNerd inspirada na série homônima que encontra-se em produção.