O terror e o sobrenatural são duas vertentes que sempre andaram juntas nos filmes. Podemos pegar diversos exemplos que utilizam desse artifício do absurdo, do medo dos mortos e de um “além”, como a franquia Sobrenatural fez, para nos prender em uma história. Agora, Fale Comigo (Talk to Me, no original) realiza isso com maestria.
Se utilizando de jovens para contar uma história sobre drogas, luto, família, puberdade e espíritos, os irmãos Danny e Michael Philippou estreiam com uma direção precisa no que devemos ver em tela. Vindos do canal no YouTube “RackaRacka”, os dois tiveram muita influência da filmografia de James Wan. Após trabalharem no set de filmagens de The Babadook (2014), eles conseguiram os contatos necessários para trazer suas ideias para um longa-metragem.
Na trama, um grupo de adolescentes conseguem uma mão embalsamada que dizem ser de um médium. Ao segurarem a mão, acenderem uma vela e recitarem as palavras que dão título ao filme, uma conexão com o mundo dos mortos é estabelecida. É nesse ponto que conhecemos Mia, interpretada por Sophie Wilde, uma adolescente que recentemente perdeu a mãe e ainda está lidando com o luto.
Os irmão Philippou dedicam boa parte do início do filme para apresentar outros personagens centrais, como Jade (Alexandra Jensen), Riley (Joe Bird) e Sue (Miranda Otto), e para ambientar o uso da mão embalsamada pelos jovens. A utilização das redes sociais e a espetacularização de algo que eles compreendem, mas fingem que não é tão significativo, é abordado de maneira particular aqui. É como se todos estivessem usando uma espécie de droga.
No começo, o contato com o além, visualizando pessoas que já morreram e até mesmo as possessões em Fale Comigo é mostrada como se todos estivessem usando isso para se sentirem “chapadas”. O roteiro de Danny Philippou e Bill Hinzman é certeiro ao apontar o caminho para uma construção de drama com terror e suspense. A maquiagem é utilizada de forma magistral para dar uma caracterização aos mortos, resultando em uma estética que supera muitos efeitos de CGI.
Com um elenco jovem, as atuações acabam abordando com autenticidade as atitudes dos personagens, que poderiam estar em algum outro filme que volta na roda do terror para usar aquelas velhas tábuas Ouija ou mesmo o jogo do copo. Do suspense de ficar no pé da cadeira, ao susto de aparições plausíveis, os irmãos Philippou também entregam um pouco de sua origem do YouTube em um toque, bem leve, de humor.
É interessante voltar a pensar no uso dessa mão embalsada como uma alegoria ao uso de drogas – algo similar, mas não igual, ao que Corrente do Mal (2014) fez sobre doenças sexualmente transmissíveis. O tempo de uso e o contato são as duas únicas regras básicas apontadas nesse universo, então quem se utiliza de forma indevida desse artefato macabro acaba ultrapassando limites que, ao que tudo indica, não tem retorno. O universo aqui é riquíssimo para contar outras histórias e outros causos. Não à toa, os Philippou já possuem cenas filmadas de um projeto prequel, e uma continuação já está confirmada.
Gosto como os jovens realizadores de Fale Comigo conseguem abordar muitos temas dentro do terror. Danny e Michael Philippou possuem muito talento para voarem ainda mais longe usando desse gênero que vinha sofrendo nos últimas décadas, com reciclagens de franquias em meio aos frescores que Ari Aster, Robert Eggers e James Wan trouxeram.
Fale Comigo estreia nos cinemas brasileiros no dia 17 de agosto.