The Batman The Batman

Batman

O ano é 2022 e, mais uma vez, temos uma nova versão do Batman nos cinemas. O clássico personagem dos quadrinhos já teve várias versões para as telinhas: algumas mais cômicas e outras mais sérias. A última mexeu bastante no cânone do homem morcego, fazendo-o, inclusive, matar pessoas. Apesar de tantas versões, Matt Reeves e Robert Pattinson trazem um Batman e um Bruce Wayne jamais vistos antes no audiovisual. Confira a crítica sem spoilers.

No longa, temos um Batman com somente 2 anos de carreira. O filme leva em consideração que o espectador já conhece o personagem então não temos nenhuma história de origem. Trabalhando com a polícia, mais precisamente com Jim Gordon (Jeffrey Wright), o herói precisa deter o misterioso Charada (Paul Dano). Na sua investigação, ele dá de cara com alguns personagens famosos, como Selina Kyle (Zoë Kravitz) e os mafiosos Pinguim (Colin Farrell) e Carmine Falcone (John Turturro).

A principal diferença dessa nova versão do personagem é o quão realista ela procura ser. O longa é um thriller psicológico de investigação com elementos neo noir. Todos os elementos de filmes policiais estão aqui, a diferença é um maluco vestido de morcego como protagonista. Se Nolan procurou fazer um filme de super-herói mais realista com sua trilogia, o Batman de Matt Reeves dá um passo além, trazendo a versão mais séria do personagem de um ponto de vista psicológico e social. Desde suas primeiras aparições na tela com o uniforme, o Batman de Pattinson é uma aberração, visto pelos outros com nojo ou chacota. A interpretação de Pattinson traz um Bruce Wayne perturbado e claramente com sérios problemas com luto e interações sociais. Este Bruce é recluso, de poucas palavras e com traços de psicopatia. Ora, se a proposta do filme é trazer uma pessoa com roupa de morcego para um mundo mais realista, esta é a melhor forma possível de representar isso.

Não somente na interpretação este Batman está mais pé no chão. Nas cenas de ação, ele apanha muito, leva tiro e comete erros. Não existem acrobacias ou gadgets  superelaborados. O longa mostra que ele é só uma pessoa com um certo treino que possui um equipamento acima da média e coragem pra encarar o crime de peito aberto. Por causa disso, o filme foca principalmente no lado detetivesco do personagem, algo que suas versões anteriores não desenvolveram tanto. Temos aqui uma estrutura total de um filme neo noir, seja por causa de algumas narrações em off, a fotografia de uma Gotham suja e repleta de luzes que fazem o contraste na escuridão ou também pela adição de alguns personagens clichês como a femme fatale, representada pela Mulher-Gato. Por falar na personagem, sua química com o Batman é excelente. Enquanto Bruce é o espírito da vingança crua e focada, ela representa o coração da história.

Outro fator que diferencia este longa de outros de super-heróis é a paciência que ele tem em desenvolver as cenas e seu plot. O filme possui passagens supertensas e o seu mistério vai se desenvolvendo muito devagar. Aos poucos, através dos olhos do protagonista, vemos a verdade do Charada ser desvendada e nos chocamos com as reviravoltas de roteiro. O vilão é uma das melhores coisas do filme, pois, por meio dele, o texto critica a própria existência do Batman, principalmente quando pensamos o personagem através de um contexto sociopolítico. Existem discussões no filme que não são muito novas nos últimos anos na internet, mas é muito bom vê-las escancaradas e tão bem conectadas ao roteiro de um blockbuster.

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O filme toma tanto cuidado em desenvolver bem sua história e seus subplots que acaba virando uma experiência com quase 3 horas de duração. Felizmente, Matt Reeves consegue orquestrar bem quase todo o longa através de uma direção que sabe exatamente o que quer mostrar. As cenas de ação geralmente são mais intimistas, te colocando dentro da situação e geralmente tomando algumas liberdades criativas com câmeras. No combate mão a mão, Reeves utiliza muito das sombras para representar como o Batman age. Por causa dessa visão mais artística, algumas cenas, como a perseguição de carros, se tornam um pouco confusas. Além disso, essa visão mais autoral do diretor se perde um pouco em alguns momentos em que o filme se lembra que é um longa de quadrinhos. A cena final de luta por exemplo é meio repetitiva e desnecessária, principalmente quando se já passou por tanta coisa até aquele momento. Eu entendo que a visão do diretor exigia um filme mais lento, mas acho que daria para cortar uns 20 minutos da versão final.

Não posso terminar essa análise sem falar do som do filme. É claro que ter a experiência no IMAX traz um impacto a mais para esse quesito. Falando primeiro nas mixagem e design de som, é excepcional o seu uso na criação da persona do Homem-Morcego. Toda vez que o personagem aparece, suas botas fazem um som muito alto, que passa para o espectador seus impacto e peso em cena. O próprio batmóvel tem um som assustador, algo que não é natural para um automóvel. Sua primeira aparição, inclusive, lembra bastante Christine, o Carro Assassino, mostrando que ele é mais uma ferramenta para criar medo no coração de suas vítimas. Para fechar com chave de ouro, os temas criados por Michael Giacchino são a cereja no bolo da ambientação do filme. O tema do Batman, por exemplo, é praticamente uma trilha de terror, que vai aumentando e criando uma tensão até se tornar mais heroica. Estou cantarolando ela na minha cabeça desde a hora que os créditos tocaram até agora. O tema do Charada anuncia a tragédia do personagem e representa o suspense maquiavélico trazido por ele.

Batman é um filmaço de detetive que, por um acaso, tem um maluco vestido de morcego espancando as pessoas. Mas não me entendam mal, o longa é um estudo de personagem que discute muito bem a psique do personagem e seu papel social em Gotham. É um Bruce Wayne ainda aprendendo a ser Batman e entendendo qual sua real função nesta Gotham decadente. O elenco está fenomenal, com destaque para Paul Dano, que rouba a cena como Charada, e para as ambientações visual e sonora que são um deleite à parte. É importante, porém, ressaltar que nem todo filme de herói precisa ser realista, mas é bom demais quando esta proposta funciona.