Antes de tudo, gostaria de deixar claro que não apoio produções do gênero por serem incentivadoras do estereótipo de que animais, como leões, no caso, são monstros, espalhando desinformação sobre esses bichos e, por tabela, instigando a caça predatória. Dito isso, A Fera tenta ser responsável nesse quesito, mas já começou errada por existir. Sabe aquele negócio de “qual o seu problema comigo?” e a pessoa responder “você nasceu”? Pois é, aqui é verdade.
Porém, contudo, todavia, entretanto, como filme, A Fera não é ruim, ao contrário, é um bom entretenimento.
Na trama, Nate Daniels (Idris Elba) perdeu a esposa recentemente. Para viver o luto, ele decide retornar à África do Sul, país onde conheceu sua falecida esposa, para passar férias há muito planejadas com suas duas filhas (Iyana Halley e Leah Jeffries) em uma reserva natural administrada pelo velho amigo da família Martin Battles (Sharlto Copley), um biólogo da vida selvagem. O que ninguém esperava é que, em menos de 24 horas, essa viagem se tornaria um verdadeiro inferno.
A história é basicamente o pesadelo de qualquer pessoa que vá conhecer a vida “selvagem” de perto, no qual um leão resolve se vingar de humanos e matá-los após a sua manada ser assassinada por um grupo de caçadores clandestinos, tal qual um bom serial killer com um background triste. Ou um John Wick da vida, mas sem o carisma do Keanu Reeves. Sim, o leão age por meio de impulsos atípicos de vingança – algo que o personagem Martin, melhor amigo do protagonista, no cargo de cuidador da reserva e especialista nesses felinos de grande porte, não cansa de repetir. A família de Nate, interpretado maravilhosamente por Idris Elba, só foi pega em fogo-cruzado, tornando-se alvo fácil do bicho após o jipe quebrar numa tentativa de fugir dele.
Aliás, o personagem de Martin serve muito para tentar tirar do filme a responsabilidade da desinformação em relação aos leões, sempre repetindo que o modo como o animal está se comportando não é a maneira como esse bicho normalmente age e reforçando isso sem cessar, provavelmente já prevendo o ódio que um filme de monstro que põe um leão no seu centro pode causar.
O filme tenta focar bastante no suspense, se apoiando no jump scare e apostando na engenhosidade que um pai pode ter na hora de tentar salvas suas filhas. O problema é que, para manter a trama andando, o roteiro investe bastante em ações “burras” das personagens, como quando o pai precisa resolver uma parada longe delas e elas causam todo o alvoroço do mundo, desencadeando situações de perigo iminente que poderia ter sido evitadas muito facilmente. E não tem pânico que explique.
A trama de A Fera tem um núcleo pequeno de personagens, o que é ótimo, pois não há muitas histórias paralelas para nos distrair, só tem uma, que envolve apenas Nate e as filhas, e que é mal trabalhado, porcamente desenvolvido e enfiado de qualquer jeito no meio do filme para entendermos que há um senso de culpa no pai, que vai fazer de tudo para compensar o tempo perdido.
No geral, o filme pode ser uma boa distração, com certeza nos prende nos momentos certos, mas, se você pensar por dois segundos nele, vai se perguntar o motivo de certas cenas e assuntos íntimos levantados. Idris Elba carrega bem o seu personagem, trazendo um pai arrependido e amoroso; Iyana Halley e Leah Jeffries trabalham bem como as filhas, evocando todo aquele amor e devoção que uma família pode ter unindo-se contra um inimigo em comum. Essa interação entre personagens ficou muito bem estabelecido, conseguimos sentir o perigo iminente e o quanto desejam proteger uns aos outros.
Quanto ao Leão, o antagonista, está muito bem feito. Esperava que ele fosse maior, devido às proporções sobrenaturais dos seus atos, mas mantiveram um tamanho proporcional ao real – mesmo que as inteligência e sagacidade apresentadas não estejam exatamente no mesmo escopo do que costumamos ver. O fato de ele agir diferente, sendo violento e caçando humanos para se vingar, é um problema que o filme se esforça para minimizar por meio da figura de Martin, sempre repetindo que aquele Leão em específico é que se comporta daquela maneira, mas que não é assim com os outros leões. E ele pode atestar, pois é pré-estabelecido logo que ele sabe TUDO sobre os bichanos.
A Fera vai te entreter e envolver em igual proporção, e se você se assusta fácil, os pulos deverão valer a pena.